Está em curso a 2ª volta para eleição do bastonário da Ordem dos Médicos. Se se repetir o cenário da primeira volta, será eleito por mais de metade de menos de 40% dos médicos, o que é revelador do desinteresse e desmotivação. Os médicos são sujeitos a maus tratos físicos e morais, vítimas de um cinismo vindo de todos os lados com exaltações de heroísmos em tempos de crise mas esquecimento e desprezo logo após. Os médicos deixaram-se espezinhar e é hoje muito difícil recuperarem a dignidade. Os médicos perderam para outros o papel e a missão de lideres. Os médicos deixaram-se enredar por regras pouco promotoras do mérito.
O reconhecimento que têm, vem dos pares e dos doentes enquanto doentes. Para o sistema (que se auto-intitula de “serviço”), os médicos não são mais que proletários de um modelo de produção. A principal razão da fuga de muitos médicos do sistema público para o privado nem sequer são as condições remuneratórias (nalguns casos fazem pouca diferença), mas o respeito ou a falta dele com que são tratados.
É importante que um bastonário se preocupe com a pobreza dos médicos, mas a sua principal bandeira tem que ser a defesa da deontologia e da ética, sem o que os doentes são os principais lesados. Eu nunca votaria num bastonário que não fosse mais que um sindicalista.
Os médicos também têm sido a voz incómoda que propõe para os doentes o melhor, defendendo inquebrantavelmente valores eternos como o valor da vida em todas as circunstâncias.
Talvez o principal ponto de clivagem civilizacional que vivemos e que arrasta médicos numa derrocada de valores, seja a defesa da vida. Herdamos esse testemunho dos bastonários prévios, incluindo neles o Dr Miguel Guimarães. Espero que o próximo bastonário não tenha dúvidas de que lado deve estar enquanto médico. Eu não tenho dúvidas de que nunca votaria num bastonário que relativizaria o valor civilizacional da vida humana.