Passados mais de dois anos sobre o “quiet quitting”, os patrões portugueses parecem ter encontrado uma nova cruzada no valor percebido do trabalho. A ideia agora é incluir nos recibos de vencimento os encargos da TSU, numa tentativa de tornar mais visível o “custo real” do trabalhador para as empresas.

É inegável que os salários em Portugal são esmagados pela carga fiscal, e que o orçamento das famílias evapora em despesas essenciais, taxadas ainda em sede de IVA. Por sua vez, os empresários sentem-se oprimidos entre o clamor dos trabalhadores por melhores salários, a necessidade de atrair e reter mão de obra, e um Estado que os sufoca com encargos fiscais. Contudo, listar todos os encargos no recibo, como que a dizer: “tu até nem ganhas mal, pá, o Estado é que te rouba”, não só não resolve o problema para o trabalhador, como alimenta uma postura beligerante e desfocada do real problema.

Como sugere o diagrama de Ishikawa, “uma grande parte da resolução de um problema está no conhecimento do seu diagnóstico”. E o diagnóstico aqui é claro: aumentar o salário “artificialmente” não irá encher o frigorífico de ninguém, pelo que, aplauda-se o esforço do tecido empresarial português pela inovação, mas não precisam de criar salários virtuais e pagar em likes e emojis; é com dinheiro real que se faz a atratividade laboral e que o CHO (Chief Household Officer) alimenta o seu propósito e dá de comer aos pintainhos lá em casa.

Ao contrário do que muitos empresários portugueses apregoam, os trabalhadores portugueses não precisam de um curso de literacia financeira para entenderem o recibo de ordenado; eles já são mestres em ler demagogia e, mais importante, já se habituaram a sobreviver num ambiente de dificuldades (turbulento). Inclusive, muitos deles são “doutorados” em gestão da vida prática, acumulando funções e segundos empregos para fazer face à sua realidade VUCA (Valha-me Deus, Ufa, Cabrestos, Aperta ai), e desconfiam, com razão, de qualquer discurso que prometa muito e entregue pouco.

Incluir a TSU recibo de vencimento é uma solução cosmética e dissimulada que continua a evitar debater a produtividade e a verdadeira competitividade das empresas portuguesas, empurrando culpas para longe da porta, e, enquanto o problema não for encarado com seriedade, o cenário será sempre o mesmo: baixos salários, baixa motivação e, claro, o eterno murmúrio de corredor – “eles fingem que me pagam e eu finjo que trabalho”.

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