Após o sucesso energético do parque eólico offshore de Viana do Castelo, que produziu em 2022 78 GWh (o equivalente ao consumo de cerca de 25 000 habitações) evitando a emissão de 33 000 toneladas de CO2, são agora dados os primeiros passos para a implementação de vários parques eólicos ao largo da costa continental portuguesa.

A proposta preliminar está lançada e apresenta oito áreas no total, todas elas localizadas pelo menos a 10km de distância da costa, à exceção de duas: Sines e Matosinhos. No caso da segunda esta divide-se em duas as áreas – “Leixões”, uma área de 463 km2 ao largo da costa com fundações flutuantes; e “Matosinhos” que ficará bem mais perto, a cerca de 3.4 km (1.86 nm) com uma área de implementação prevista de 181 km2 e que contará com estruturas “vocacionadas para turbinas eólicas com fundações fixas e para aproveitamento da energia das ondas”.

É inequívoco que num contexto de resposta às alterações climáticas apostar na produção de energia a partir de fontes renováveis é uma vantagem e uma necessidade, aliás, tem sido esta aposta que tem levado Portugal a diminuir a sua dependência energética. Ora de acordo com o documento, a totalidade da potência passível de ser instalada em Espaço Marítimo Nacional é de aproximadamente 10 GW, o que significa que a implementação destes parques apresenta potencial para produzir cerca do dobro da produção de energia eólica atualmente instalada no nosso país – uma verdadeira revolução no campo das energias renováveis.

Mas a que custo?

Qualquer projeto estruturante carrega com ele vantagens, mas inevitavelmente desvantagens, e, apesar dos claros impactos positivos em relação à produção energética, os parques eólicos offshore não estão isentos de provocar desequilíbrios ambientais, sociais e económicos.

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A título de exemplo, em Viana do Castelo, por força da regulamentação da área, interditando-a à navegação, surgiu uma onda de fortes contestações na comunidade piscatória que levou a que a EDP e a REN avançassem com uma indemnização de 1.2 milhões de euros aos pescadores prejudicados; também o ruído produzido pelas turbinas, somado ao campo electro magnético emitido, interfere com os animais, nomeadamente os cetáceos que, como se sabe, são extremamente sensíveis a estes efeitos, uma vez que utilizam a ecolocalização para caçar, para comunicar e para a sua própria orientação; as turbinas eólicas são também responsáveis anualmente pela morte de milhares de aves – de acordo com um estudo de 2016 de investigadores da Universidade de Purdue, nos EUA, “em todo o mundo, as instalações eólicas mataram 140 a 328 mil aves e 500 a 1,6 milhões de morcegos.” números que não podem ser ignorados e que vão em contraciclo com os objetivos propostos pela Europa em matéria de preservação da biodiversidade.

Regressemos a Matosinhos…

Com uma previsão de quase 1 GW de capacidade de produção instalada, aliada à proximidade a terra, poderia este projeto ser a alavanca necessária para capacitar o Porto de Leixões com uma ligação de Shore-to-Ship, à semelhança do que acontece noutros portos? Hoje, qualquer navio de carga ou de cruzeiro aportado em Leixões tem que manter os seus motores ligados, poluindo de forma ininterrupta, e fá-lo relativamente perto da população. A possibilidade de o navio receber energia proveniente de terra durante a sua permanência em porto seria um passo de gigante para a sustentabilidade do Porto de Leixões, para melhoria da qualidade do ar em Matosinhos e, consequentemente, uma contribuição relevante para a melhoria da saúde pública, mas principalmente de todos os matosinhenses que vivem a paredes meias com o segundo maior porto do país.

Por outro lado, é fundamental perceber de que forma estas estruturas de fundações fixas, instaladas a uma distância tão próxima da costa, poderão interagir com o meio e que tipo de desequilíbrios poderão causar. Para isso é necessário avançar com estudos que possam aferir (dentro do possível) os impactos de um projeto desta magnitude, e é nesse sentido que está a ser preparado por um grupo de pessoas e associações de diferentes áreas um documento que será entregue nos próximos dias, em sede de consulta pública, onde é pedido que seja feita uma avaliação das repercussões no setor da pesca, nos ecossistemas (marinhos e terrestres), e na interferência com a hidrodinâmica.

Sejamos claros, muito dificilmente haverá sol na eira e chuva no nabal. Aquilo que se pede, e porque cada geração é responsável pelo futuro da próxima, é que antes das decisões se estude, se discuta e que haja coragem para alterar aquilo que for necessário para que o país possa avançar de forma verdadeiramente sustentável.