Pode-se dizer que o ser humano é, por natureza, racional e egoísta, o que não são necessariamente más características. É o que nos faz procurar sempre o melhor para a espécie, permitindo a evolução tecnológica, a organização da sociedade, e, em última instância, melhorar a qualidade e prolongar a duração das nossas vidas.

O problema é que, inseridas num contexto onde não há downside nem upside, elas podem-se tornar simplesmente anestésicas. Sem penalização óbvia de um trabalho menos esforçado, o chamado downside, e sem recompensa do esforço, o chamado upside, o que maximiza o bem-estar de uma pessoa será, naturalmente, o de minimizar o esforço aplicado na tarefa realizada. É lógico.

É por isso que as empresas adotam sistemas de avaliação. E é também por isso que as empresas – que são basicamente grupos de pessoas que atuam em busca de um objetivo comum – inseridas em mercado concorrencial prestarão sempre um melhor serviço ao consumidor final. Nesse contexto, a avaliação a que as empresas estão sujeitas não é mais do que a quantificação da procura que os seus produtos ou serviços têm, procura essa que só poderá variar, e ser realisticamente avaliada, caso o consumidor tenha acesso a alternativas, a chamada concorrência, que satisfaçam as suas necessidade. Em busca de uma boa avaliação, as empresas assegurarão ao consumidor melhores preços e melhor qualidade de serviços e produtos.

Uma vez definido o contexto que assegura o funcionamento eficiente de qualquer empresa, e a defesa do consumidor, o mercado concorrencial, é importante que nos questionemos sobre o papel que o Estado deve ter no mesmo: (i) o de supervisor e regulador, definindo as regras e assegurando que estas são respeitadas por todos os intervenientes, ou (ii) de agente ativo, sendo acionista de empresas, tornando-se ele mesmo um interveniente. Na minha opinião, ambos, pelo menos em setores que entendamos como estruturais para a vida das pessoas, como a educação ou a saúde (e eventualmente a habitação). Enquanto supervisor e regulador, o Estado deve assegurar que as condições para a concorrência se mantêm, no papel de Autoridade da Concorrência, evitando um excesso de concentração de poder em poucas empresas, ou assegurando que os contratos firmados, entre empresas, ou entre empresa e cliente, são respeitados, no papel da Justiça, por exemplo. Já o papel de agente ativo, embora mais questionável, parece-me essencial, pelo menos, como referi, nos setores ditos estruturais. O mercado nem sempre é totalmente eficiente, os conluios nem sempre são facilmente controláveis pelo regulador, o que pode justificar que o papel do Estado possa também ser conciliado com o de agente ativo, para que se assegure uma real distribuição de poder entre empresas, isto é, uma real concorrência de mercado.

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Se concluímos então que o que melhor defende o interesse dos consumidores é o mercado concorrencial, em que as empresas competem entre si, e que o Estado deve ser um agente ativo, com a sua própria empresa, pelo menos nos setores dito estruturais da sociedade, parece-me óbvio que o Estado, no desempenho desse papel, deva competir em pé de igualdade com os restantes. Caso contrário, a concorrência do mercado estará naturalmente posta em causa.

Como é que podemos assegurar então que o Estado está em concorrência com os restantes agentes? Atribuindo, ao consumidor, uma real liberdade de escolha entre a empresa que pretende que lhe preste o serviço ou venda o produto que procura, seja pública ou privada. E é obrigação do Estado, enquanto defensor dos nossos interesses, assegurar-nos essa liberdade. Parece-me inclusive relativamente óbvio que é esta falta de liberdade de escolha que tem levado à deterioração dos serviços públicos em Portugal. Se as escolas ou os hospitais públicos fossem expostos a uma real escolha, isto é, a uma real avaliação pelo consumidor, haveria um natural incentivo a que se tornassem mais eficientes. Se a administração destas entidades fosse avaliada e responsabilizada pelos resultados que apresenta, como é qualquer equipa de gestão pelo seu acionista privado, haveria um natural incentivo a que se tornassem mais eficientes.

E o melhor exemplo disso nem está assim tão longe da nossa vista. Basta olharmos para a Caixa Geral de Depósitos, que é detida pelo Estado, como sabemos. Assegurada a liberdade de escolha do consumidor quanto ao serviço bancário do qual pretende usufruir, e nomeada uma equipa de gestão que é avaliada e remunerada como no setor privado, com downside e upside face aos resultados que apresenta, está garantida a sua eficiência. Apesar do contexto favorável recente para o setor bancário, não há dúvida que os resultados apresentados têm sido excecionais. Porquê? Porque está inserida em contexto de mercado concorrencial. Em em última instância beneficiamos todos, enquanto consumidores e acionistas.

Deixo então para reflexão a seguinte pergunta: e se alargássemos à saúde e à educação pública o modelo concorrencial? Sairíamos todos beneficiados? Acredito que sim.