Por três vezes Catarina Martins sublinhou a mensagem que escolheu para fechar a convenção do Bloco de Esquerda, num discurso bem escrito e bem dito. “Estamos só a começar”, foi o refrão de bom efeito que disse uma, duas e outra vez quando as bandeiras já eram empunhadas entre aplausos, num daqueles momentos apoteóticos com que se gosta de terminar as reuniões partidárias. Uma espécie de team bulding, como se diz no jargão tecnocrático das empresas.
Sim, o Bloco está só a começar. Mas o quê? Percebeu-se que os bloquistas querem ser os “donos” do tema do referendo europeu em Portugal. Para já, ninguém os acompanha nessa ideia avançada em tom de ameaça. Nem os comunistas, com os pés mais assentes na terra, e muito menos os socialistas, europeístas desde a primeira hora.
Portanto, bastaram três dias para que o “brexit” ganhasse discípulos em Portugal. E não deixa de ser irónico que nesta “bandeira” o Bloco tenha como companheiros os partidos anti-imigração e muitas vezes xenófobos das extremas-direitas europeias. Todos, por uma razão ou por outra, querem libertar-se das regras europeias. No caso português, para fazer o quê num hipotético dia seguinte? Ninguém sabe, a começar pelos próprios.
É provável que esse possa ser um tema a discutir pelas “esquerdas unidas” que o Bloco quer agregar por essa Europa fora para discutir uma “alternativa”. Catarina Martins sugeriu mesmo que essa primeira convenção europeia pode acontecer em Lisboa, Madrid ou Barcelona. Ainda fiquei à espera de ouvir também Atenas como local apropriado. Mas em vão. Definitivamente, o Syriza já não faz parte do grupo de amigos do BE, o que é estranho, porque é a primeira experiência governativa na Europa liderada por um partido da família política dos bloquistas.
Foi naturalmente uma convenção de festa que serviu também para comemorar a experiência governativa em curso, da qual o Bloco se orgulha.
Para lá da questão referendária, que dificilmente fará caminho, o Bloco ensaiou ainda uma espécie de caderno de encargos para o Orçamento do Estado do próximo ano a apresentar ao Governo. De metas concretas enunciou apenas uma: as pensões têm que ter um aumento real. Para haver um aumento real basta que as pensões subam mais do que a inflação. Como o crescimento médio dos preços anda abaixo de 0,5% — em Maio foi de 0,3% – -quaisquer 1,5 euros de aumento mensal numa pensão de 300 euros cumpre por cima a medida proposta pelo Bloco.
Se esta é a exigência principal do partido, António Costa e Mário Centeno podem dormir descansados. O mesmo não podemos dizer dos que têm as reformas mais baixas.