As empresas familiares são conhecidas enquanto tal pelos conflitos e dramas das famílias, criando assim a ideia errada de que gerir uma empresa familiar é mediar os vários membros da família de modo a criar e manter a paz. Todavia, as empresas familiares são muito mais do que os pontuais conflitos entre alguns membros da família. Representam cerca de 75% do tecido empresarial português, realidade que se estende ao resto da Europa, onde verificamos proporções desde 65% no Reino Unido a 85% na Espanha, Áustria e Finlândia, mas também do outro lado do oceano, onde 37% da Fortune 500 são empresas familiares.

Outro dos mitos associados à empresas familiares é que são apenas pequenas e médias empresas. Porém, organizações como Walmart, Volkswagen, Berkshire, Exor e Ford são familiares e, mesmo em Portugal, as grandes companhias como Jerónimo Martins, Sonae e Mota-Engil também são familiares.

O que torna este tipo de organização muito especial e diferente das restantes são características como o vínculo emocional criado entre a família e a comunidade local que se estende ao longo de décadas e gerações. É muito mais provável não se saber quem foi o fundador de uma empresa não-familiar do que tal coisa acontecer numa organização onde a família e a própria comunidade de trabalhadores mantém a presença e a história da fundação e do fundador vivas, transmitindo-as a todos os novos colaboradores. Qual o benefício que daí resulta? Assumir que a identidade de uma empresa familiar é uma ferramenta poderosa e distinta, impossível de reproduzir, confere à organização um recurso raro e inimitável, contribuindo assim para uma vantagem competitiva face aos seus concorrentes.

Outro dos mitos associados às empresas familiares é que são tradicionais e como tal pouco inovadoras. Ora, uma organização cujo principal objetivo passa por deixar um negócio saudável para a próxima geração, não pode ser rígida nem obsoleta. De facto, um estudo realizado pela Forbes em 2017 mostrava que mais de 50% das empresas mais inovadoras da Europa são controladas por famílias. O que torna o processo de inovação destas empresas tão interessante é a sua capacidade para inovar através da tradição. Isto é, por um lado a tradição e conhecimento adquirido transmite maior confiança e legitimidade tanto aos colaboradores como aos consumidores, o que em contexto de incerteza assume particular importância na medida em que, perante uma crise, olhamos para aquilo que nos é familiar em busca de orientação. Por outro lado, a identidade de uma empresa familiar é o resultado de uma acumulação de conhecimento, artefactos simbólicos e culturais, práticas e aprendizagem com erros que são transmitidos de geração em geração, contribuindo assim para a criação de vantagem competitiva para aquelas que conseguirem desenvolver capacidades alavancadas na sua tradição. Combinar a tradição com soluções tecnológicas atuais, permite a adaptação às necessidades e expectativas do mercado, criando assim oportunidades únicas para inovação, nunca perdendo a autenticidade do negócio.

Compreender que na gestão de uma empresa familiar existem objetivos estratégicos que falam mais alto do que o objetivo económico é essencial para o alinhamento de interesses entre quem é dono do negócio e quem o gere. Para além do lucro, e principalmente do lucro de curto-prazo, uma empresa familiar procura outro tipo de objetivos estratégicos, nomeadamente o controlo transgeracional, a reputação do nome da família, o vínculo emocional com a comunidade e até mesmo o afeto e as emoções inerentes a uma família que se estende à comunidade de trabalhadores. Todos estes aspetos adicionam camadas de complexidade à gestão do negócio, tornando assim a gestão de empresas familiares rica em nuances e especificidades que têm que ser compreendidas individualmente.

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