A habitação tornou-se, sem sombra de dúvida, em Portugal, um dos temas mais incontornáveis  e prementes que o anterior executivo não conseguiu, de forma alguma, resolver, passando a ser  um problema intergeracional, com uma agravante nos jovens, abrangendo várias classes e tornando-se transversal a quase todo o território, deixando de ser um problema exclusivo dos  grandes centros urbanos e da região litoral. Nesta temática labiríntica, que apresenta contornos  muito diversos, várias e complexas frentes a conter, não existe “uma bala de prata” que consiga,  de uma vez só, mitigar a desatenção prática que lhe tem sido dada.

Os dois principais responsáveis políticos nesta área, António Costa e Pedro Nuno, que tutelou  mesmo a pasta da habitação, tentaram, incansavelmente, contar a narrativa de que o PS era o  único capaz de tomar medidas eficazes para mitigar a escassez de habitação, contudo,  concluímos que estas não surtiram praticamente efeito algum na vida dos portugueses e não resolveram os problemas que estes sentem, agravando-os até.

Por via do PRR, foram atribuídos 3,2 mil milhões de euros (inicialmente 2,7), para o setor da  habitação, com a ambiciosa meta de serem construídos 32 mil novos fogos até 2026. Neste  momento, a sua execução ronda uns preocupantes 11%, encontrando-nos, portanto, numa  situação de enorme contrarrelógio para não perdermos esses fundos. Adicionalmente, foi  aprovado o “Programa de Acesso ao 1.º direito”, que é financiado em 1211 milhões de euros,  por via do PRR, onde apenas foram atribuídos cerca de 2100 fogos dos 26 mil previstos até 2026,  um número tonitruante para qualquer português.

Para tentar mitigar a carência habitacional e contrariar o aumento em espiral dos preços das  casas, o governo lançou apressadamente e em grande júbilo o programa “Mais Habitação”, onde  apenas detetamos mais habitação, literalmente, no título. O programa possui algumas linhas  positivas e traços de convergência entre as duas principais forças políticas de governo (PS e PSD),  como a intenção de reforço de fogos do parque habitacional público, a implementação de um  simplex e respetiva desburocratização dos processos de licenciamento, que segundo vários  promotores imobiliários, investidores públicos e privados, constitui um dos maiores entraves e  deficiências neste setor.

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O “Mais Habitação” continha, contudo, matérias inicialmente bastante controversas e que  geraram posições titubeantes de alguns membros do executivo, como o arrendamento coercivo: uma espécie de expropriação que, apesar de já ter um enquadramento constitucional, previa vir  a ser reforçada ou incentivada.

Outra proposta do programa, era o “Arrendar para Subarrendar”, que tinha como finalidade  incentivar os senhorios a cederem o arrendamento das suas habitações ao Estado, para que  fosse ele a arrendá-las, um mecanismo algo bizarro num mercado de arrendamento pouco  estável e imprevisível, onde há muito pouca confiança por parte dos senhorios para com o  Estado. Portugal é dos países da OCDE onde existe maior percentagem de proprietários, cerca  de 77,3%, segundo fontes do Eurostat e, em sentido inverso, somos dos países que menos disponibiliza os seus imóveis para o mercado de arrendamento.

Pedro Nuno Santos e o governo socialista, ao alargarem de forma atabalhoada o programa de  Arrendamento Jovem, “Porta 65”, fecharam a porta na cara dos jovens, tendo gerado inúmeras denúncias que se avolumam ainda no portal da queixa, por estes não receberem, atempadamente o dinheiro que lhes foi prometido.

Estas medidas não surtiram qualquer efeito palpável até agora, criando apenas a ilusão de que  os problemas do aumento dos preços advinham quase todos do aumento do investimento  direto estrangeiro no mercado imobiliário, do setor do alojamento local e dos vistos gold, que  trouxeram para os cofres do estado, desde a sua criação, cerca de 7.2 mil milhões de euros,  correspondendo apenas a 3,2% do investimento total feito no mercado imobiliário, um  montante que permitiria pagar cerca de dois Aeroportos de Alcochete.

O ónus foi todo transposto para o lado do setor privado e num dos principais setores de maior  criação de riqueza do país, o turismo. Este “Mais Habitação” sumariza, neste setor, toda a  perversa narrativa dos socialistas e de alguma esquerda parlamentar, obrigando-os a recorrer a  esta manobra de diversão, para encontrar um alvo fácil, encobrindo a verdadeira incapacidade  do governo, que pouco ou nada fez nesta área, senão destabilizá-la e defraudar, uma vez mais,  grandes promessas que foram apresentadas.

Num panorama, onde a procura aumentou expressivamente, com enfoque nestes últimos cinco anos, a oferta, por sua vez, manteve-se estagnada ou aumentou de forma marginal, depreendendo-se, por isso, que a solução não se encontra na proibição, na limitação ou elevado  condicionamento do lado da procura, mas sim, essencialmente do lado do reforço da oferta. A jusante, isto é, na procura, devem levar-se a cabo alguns exercícios de reflexão, suportados por uma análise estatística imparcial e rigorosa, como seja o estudo da carga turística, que já foi apresentado por diversos municípios, nomeadamente pelo de Lisboa. A ponderação de algumas  medidas que visem, muito pontualmente e de forma bastante direcionada, ajudar a regular a  atividade turística, são bem-vindas para minimizar o problema, como por exemplo, a implementação de um rácio máximo, por freguesia, entre alojamentos locais e fogos destinados  para habitação ou até mesmo, o aumento da taxa turística para que os municípios retirem uma  maior compensação dessa atividade.

A pedra angular da estratégia que deveria ser seguida na Habitação, está sim, a montante, na  componente da oferta, onde se deve priorizar a simplificação dos processos de licenciamento,  com o objetivo de acelerar etapas na construção de novas habitações, sem nos esquecermos de  que, para tal, deve também ter-se como condição sinequanon, a flexibilização do tipo de uso  dos solos, visto que muitas vezes nos deparamos com incontáveis terrenos baldios, vários não  urbanizáveis, que se encontram frequentemente no âmago de centros urbanos, originando  descontinuidades no território, obstaculizando muito os processos de licenciamento e  tornando-os mais morosos.

Devem também ser concedidos benefícios fiscais para promotores imobiliários, investidores e  construtoras que pretendam, verdadeiramente, desenvolver projetos direcionados para a classe  média, podendo haver cedências de terrenos das autarquias locais a esses promotores, com o  compromisso de que haja uma redução significativa no preço médio final do m2 das habitações  construídas. Por via desses mecanismos, deixaríamos de ter um mercado imobiliário com uma  oferta exclusivamente direcionada para um segmento de luxo ou para a classe média alta, como  acontece no presente momento, estimulando a equidade da oferta nos promotores privados. É  tornando o investimento mais apetecível para os segmentos da classe média que se pode  começar a incrementar a tão desejada oferta, que fará, inevitavelmente, baixar os preços das  habitações, tornando-as acessíveis à maioria da população.

Um dos princípios mais desconcertantes que mais deve impressionar os portugueses são os  inúmeros imóveis devolutos do Estado, deixados ao abandono durante anos a fio, como  infraestruturas militares obsoletas, imóveis públicos não utilizados, de grandes dimensões, que

deveriam ser reconvertidos para projetos habitacionais que visassem as classes média e baixa. Nesse tópico apercebemo-nos, uma vez mais, de que o Ministério das infraestruturas e da  Habitação se demitiram das suas responsabilidades, aumentando a revolta e frustração dos  jovens e de outros, que tanta dificuldade sentem em autonomizar-se e a encontrar uma casa  digna para viverem.

Para mitigarmos esta carência habitacional, é imperioso adotar soluções múltiplas sem amarras  ideológicas que possam revelar-se tendenciosas, promovendo a participação de todos nesta  estratégia – setor público, setor social e promotores privados – , elencando o papel muito relevante que as autarquias desempenham na execução de medidas mais concretas, pela maior  proximidade às suas populações, diagnosticando de forma mais personalizada os problemas  locais, apresentando soluções mais cirúrgicas para a sua resolução. E é possível. A Câmara de  Lisboa já se encontra a pôr em marcha algumas soluções que contribuem para minorar o  problema. O desenvolvimento de programas neste setor, como o programa de Renda Acessível, que prossegue a sua execução a bom ritmo, o programa do Apoio à renda, os programas em  modelo de concessão de habitação e o relançamento dos modelos de cooperativas.

Para obtermos um efeito verdadeiramente catalisador na construção de Habitação Social, é  essencial construirmos massivamente e rápido, recorrendo a modelos mais disruptivos  nesse setor, como o de construção modular que, foi já aplicado no Município da  Amadora para uma residência dos Serviços Sociais da PSP, edificada em tempo recorde.  Esse modelo assenta num Sistema Construtivo em Blocos Autoportantes de Betão  Armado (SIMBA), uma espécie de um “lego gigante para adultos”, que é composto por  módulos 80% já terminados, que são transportados para o local da obra e encaixados in  situ. Este sistema construtivo economiza cerca de 30% dos custos, em termos de mão de  obra e permite uma redução 50% nos seus prazos de conclusão, o que é efetivamente  extraordinário.

Independentemente dos resultados que sejam apurados no dia 10 de março, qualquer  que seja o candidato vencedor, terá imperativamente de se debruçar para o problema  de Habitação, sem se deixar condicionar por potenciais agendas eleitoralistas,  fomentando sempre, uma boa Política Pública, dialogante com todos os setores e com o  máximo de vetores possíveis. Esperemos que, no final do próximo ciclo governativo,  quando olharmos pelo retrovisor, não estejamos na mesma situação e tenhamos um dos  desígnios do 25 de Abril cumpridos, habitação digna para todos, uma vez que o mesmo, não foi atingido na comemoração dos 50 anos do dia da liberdade. Esperemos que, haja  luz ao fundo do túnel, para que, nós jovens, já não tenhamos que emigrar por não  conseguir encontrar uma habitação digna para viver, que os mais idosos não se  encontrem ainda, numa situação de enorme precariedade habitacional, com imóveis tão  pouco adaptados às suas necessidades e que o interior já tenha conseguido inverter a  situação de pobreza energética, ainda tão presente.