A poucos dias do início da Jornada Mundial da Juventude em Lisboa, o evento já ganhou, na opinião pública, a imagem real da sua dimensão e é uma presença diária nos meios de comunicação social em todo o mundo. No entanto, e apesar dessas notícias correrem o risco de se tornarem efémeras, há outras que vão ficar para sempre e que, provavelmente, nem serão notícia.

Comecemos por fazer o exercício de retirar dos noticiários os assuntos relacionados com a JMJ Lisboa 2023. O que vemos? A guerra num impasse angustiante, os custos com a habitação a aumentar, a esperança dos jovens a esfumar-se nos sonhos para as suas vidas, enquanto fazemos zapping entre “casos e casinhos”. Se somarmos a isto o facto de termos passado por uma pandemia que trouxe confinamentos, temos muitos motivos para não ver o contributo que este evento de 6 dias poderá trazer. Mas creio que não será assim. Esta JMJ tem tudo para ser um verdadeiro concentrado de esperança que todos precisamos, e na altura ideal! O Papa Francisco sabe-o bem e, por isso, olha para esta JMJ com um entusiasmo de que não tenho memória noutras edições.

Em Portugal, o caminho de preparação desta JMJ trouxe um novo impulso às organizações juvenis nas paróquias e dioceses. A partir de formas mais tradicionais ou de outras mais experimentais, os jovens tiraram o “fato da primeira comunhão”, uniram-se para levar esta notícia a mais gente e foram os protagonistas. Ousaram fazer diferente, fortalecendo (ou criando) os contactos com as comunidades civis locais e, mesmo nas paróquias onde cresce a desertificação populacional, juntaram-se a outras para quebrar fronteiras e superar as dificuldades. A peregrinação dos símbolos da JMJ (Cruz peregrina e o ícone de Nossa Senhora) foram o pretexto e conseguiram estar em cada canto do nosso país, transportados a pé, de carro, de barco ou até de avião.

Estas estruturas juvenis locais apontam a uma nova organização pastoral de muitas dioceses e paróquias e, se forem motivadas pelos seus responsáveis, serão a nova realidade da Igreja em Portugal. Não aproveitar esse impulso, será um retrocesso muito significativo na forma de ser Igreja.

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À beira deste encontro com a história é também justo reconhecer a importância dos que o proporcionaram e o fizeram em resposta ao estilo incutido pelo Papa Francisco. Mesmo contra algumas incompreensões, o Cardeal-Patriarca de Lisboa teve o papel principal — embora sempre muito discreto — para que tudo isto fosse possível. Em primeiro lugar, porque é dele o pontapé de partida para se avançar e, em segundo lugar, porque confiou a condução operacional desta empreitada a D. Américo Aguiar, cuja ligação ao Papa Francisco é, hoje, inquestionável. Sinal de que esta escolha foi acertada é a recente estupefação, sobretudo noutras geografias, pela criação cardinalícia do Bispo responsável pela JMJ Lisboa 2023. Os motivos foram vários: ou por não identificarem estudos suficientes para o lugar, ou por o acharem demasiado novo para o cargo ou ainda por o entenderem mais como um “fazedor” em vez de um homem predominantemente espiritual. Pelo meio, ainda houve tempo para leituras truncadas de umas declarações sobre a participação na JMJ de jovens de outras confissões religiosas. Pergunto então: Qual o problema de a Igreja ter um cardeal que está no terreno e põe em prática o que o Papa lhe pede? (E está longe de ser o primeiro cardeal com estas características). Se usarmos a linguagem futebolística, D. Américo Aguiar é o “jogador” que qualquer Papa queria ter na sua “equipa” de colaboradores próximos. Todas estas críticas demonstram que a JMJ veio acelerar, em Portugal, o estado de “Igreja em saída” e, precisamente, no sentido contrário ao “sempre se fez assim”. Terá a Igreja, em Portugal, a coragem de fazer surgir mais “fazedores” que, a exemplo do que o Papa Francisco pede, tenham o desejo de preferir “hospitais de campanha” a – acrescento eu – uma igreja sentada, fechada, à espera de quem nunca foi ou com saudades do que nunca viveu?

Mas falar da JMJ é também falar de vidas mudadas. Ao longo de muitas jornadas, pude testemunhar o despertar de várias vocações sacerdotais e para a vida consagrada, vi muitos casais despertarem para o matrimónio e testemunhei muitos corações decididos a mudar de vida. Nos tempos incertos que vivemos, nada disto é de somenos. Este é o maior investimento que, como sociedade, podemos fazer. Os jovens não esperam encontrar respostas para os seus problemas numa espécie de metaverso que se cria à medida que frequentam as igrejas ou rezam em suas casas. Os jovens querem respostas concretas. É isso que vêm procurar a Lisboa e será isso que levarão se todos cumprirem o seu papel. Depois de uma pandemia e tudo o que isso gerou, Portugal é chamado novamente a mostrar uma resposta conjunta e, para isso, conta com todos: inscritos, não inscritos, com fé ou sem fé… todos serão tocados por esta “onda” e serão convocados para serem um instrumento dessa mudança. Estou certo de que cada português que se vai dispor a ajudar, nem que seja a dar orientação aos peregrinos ou a oferecer um copo com água, acrescentará valor à vida de muitos sem se aperceber que, em primeiro lugar, está a acrescentar à sua própria vida.

Estamos, finalmente, por horas para receber o Papa Francisco e mais de 1 milhão de jovens em Lisboa. São muitos os motivos que já fazem sentir “pressa no ar” e há um mundo inteiro à espera de sinais de Cristo vivo! O que levaremos desta JMJ para toda a vida será tudo o que ousarmos receber. O trabalho que foi possível ser feito, está feito. Agora, seja o que Deus quiser!