Pedro Passos Coelho usou no congresso do PSD a comparação, já frequente, a dois estados americanos para concretizar possíveis ideias para Portugal: a Califórnia ou a Florida da Europa. Sendo Portugal a West Coast europeia, com um clima de praia e sol, Portugal deveria ambicionar ser um litoral de inovação tecnológica para os jovens europeus ou um paraíso de clima ameno para os reformados dos países frios e sombrios do norte e centro da Europa. Entende-se o recurso à geografia norte-americana para encontrar o papel de Portugal na União Europeia. Porém, a história de Portugal confere-lhe uma dimensão muito além da simples localização no sudoeste europeu. O futuro de Portugal tem de radicar num passado de expansão de 5 séculos, numa geografia além-mar, onde 240 milhões de pessoas falam português. E é aqui que introduzo o estado de Massachusetts como metáfora de uma outra ideia para Portugal.

Massachusetts é o berço dos Estados Unidos da América, o estado de menos de 7 milhões de pessoas, mas com mais de 100 instituições de ensino superior, com universidades como Harvard e o MIT, que atraem jovens de todos os outros estados e que lhe permite colocar nas matrículas dos carros “The Spirit of America”. Portugal é o berço do mundo lusófono e tem uma rede de instituições de ensino superior de inegável qualidade. Pode e deve ambicionar ser um destino privilegiado para os jovens do Brasil e dos países africanos lusófonos fazerem a sua formação universitária.

Temos vantagens competitivas claras. Desde logo a língua. Quem conhece a realidade dos estudantes que finalizam os estudos secundários nesses países sabe que, na grande maioria, não dominam línguas estrangeiras que lhes permitam de imediato prosseguir os seus estudos nos países que as falam. Depois, porque enquanto em Portugal há um excesso de oferta relativamente à procura, nesses países a procura é muitíssimo superior à oferta, sobretudo no que concerne a uma oferta de qualidade. Temos ainda uma relação de qualidade-preço praticamente imbatível em termos internacionais. Cinco mil euros de propina anual é um preço muito inferior ao praticado nas universidades inglesas, por exemplo.

O mercado do ensino universitário é hoje um mercado florescente no mundo global. Os países anglófonos há muito que o têm como uma importante fonte de receitas. Na Austrália é a principal indústria de exportação de serviços, gerando em 2014 receitas de 12 mil milhões de euros. Ora Portugal procedeu a um investimento extraordinário nas últimas décadas na construção de um sistema de ensino superior e importa agora rentabilizá-lo. Temos hoje instituições com metade dos alunos que tinham há uma década atrás. Há capacidade instalada, alunos nacionais não os há, e cada vez haverá menos pela desgraçada demografia. Importa captar alunos internacionais e nisso nenhum outro país europeu, à excepção do Reino Unido, Irlanda e Espanha, tem um mercado do ensino superior como nós, em número de falantes pelo mundo fora.

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É muito melhor exportar educação superior do que petróleo, e isso por todas as razões: porque obriga a uma maior exigência na oferta, e com isso fortalece a sociedade e a economia nacionais, porque não se esgota, e porque estabelece relações fortes e duradoiras com os países de origem dos novos estudantes internacionais. Os afectos são relações fortes e os afectos têm uma componente cultural, de que a língua é o principal elemento.

Não se trata, porém, apenas de mero comércio. Qualquer ideia ou reflexão sobre o lugar de Portugal no mundo e qual o seu futuro passa por uma política da língua e da cooperação na formação académica e científica. A ideia de Portugal como Massachusetts obriga a um investimento próprio na captação de alunos de elevado potencial do mundo lusófono. Está na hora de redireccionar os milhões que têm sido gastos nas parcerias com o MIT e Austin para um serviço de bolsas portuguesas para estudantes brasileiros e africanos, criando um Instituto Português de Intercâmbio Académico, à semelhança do conhecido DAAD alemão.

Importa realçar que só há dois anos foi aprovado o Estatuto do Estudante Internacional (Dec-Lei 36/2014 de 10 de Março), peça indispensável a todo o processo de captação de alunos estrangeiros para os cursos de licenciatura e de mestrados integrados. Houve um esforço por parte do governo anterior para através da internacionalização colmatar o subfinanciamento endémico do ensino superior português (um aluno do básico tem mais financiamento do Estado que um do superior). O governo apadrinhou o protocolo de cooperação entre o AICEP com o CRUP e o CSISP, em Janeiro de 2014, para a internacionalização do ensino superior português, criou o portal studyinginportugal.com, e tomou, em Conselho de Ministros, a resolução 45/2015 em que criou o CIESP, Conselho para a Internacionalização do Ensino Superior Português.

Portugal é já hoje uma Florida da Europa, com o sector do turismo ocupando um lugar de destaque na economia nacional. Beneficia das condições naturais, dos investimentos em hotéis e em transportes aéreos e marítimos, companhias aéreas low cost e cruzeiros, e beneficia também muito da segurança que falta a outros destinos turísticos na bacia do Mediterrâneo. Mas a ideia de Portugal como Massachusetts é mais consentânea com a história de Portugal, mais robusta em tempos de crise, ou de um eventual atentado terrorista, com mais resultados nas ligações económicas com mercados emergentes, e, sobretudo, com a ideia de um Portugal global, ponto de encontro de continentes e civilizações.