Neste último dia 10 de Setembro às 9 p.m. Eastern, teve lugar o primeiro debate presidencial entre Kamala Harris e Donald Trump. Tivesse alguém entrado em coma 10 anos atrás, e acordado desse mesmo coma no dia do debate, não acreditaria que o que via através do televisor tivesse de facto sido uma contenda para a mais alta soberania do mundo livre.

Esse alguém, se de idade, lembrar-se-á de quando na eleição de 1984 Ronald Reagan fora questionado pela sua idade avançada e disparara com classe: “I will not make age, an issue of this campaign. I am not going to exploit, for political purposes, my opponent ‘s youth and inexperience”. O próprio opositor Mondale descaíra-se em gargalhadas… Sorte a desse alguém, que não viu as justificações nesta temática de Trump e Biden acabarem num debate sobre quem era melhor em golfe… E atenção, que eu adoro golfe! Mas como dizem os americanos “C´mon folks!”.

Esse alguém, não se deve ter esquecido do comício republicano de 1988, em que George H. W. Bush para demonstrar a sua lealdade à popular Reaganomics levantava o comício em êxtase ao proferir: “The congress will push me to raise taxes, and I will say no. And they push, and I say no. And they will push again, and I will say, “Read my lips: No new taxes””. Tornara-se mesmo, o slogan de campanha que o levaria à fugaz vitória.

Esse alguém, também se deve rememorar de aquando da eleição de 1992, Bill Clinton impeliu para Bush em crítica à sua concessão de tarefas para os seus inferiores: “The person responsible for domestic economic policy in this country in my administration will be Bill Clinton” e Bush ter devolvido “That ‘s what worries me!”.

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Ou quando um ano depois, o carismático Bill Clinton na sua primeira gala presidencial presenteou ao país a união da banda Fleetwood Mac que se tinha separado. O momento com a melodia “Don´t Stop” ficara gravado na mente dos americanos como a melhor passagem do testemunho de 12 anos, já que no concerto vê-se democratas e republicanos em sintonia. Ah, “the 80´s and the 90´s”!

Esse alguém, recordar-se-á anos antes, da fisgada que Ronald Reagan lançara a Jimmy Carter em 1980 depois do último sucumbir mais uma vez o seu discurso às teorias socialistas com o “Here you go again!”. Mal sabe este alguém, que a práxis de one liners iniciada por Reagan tem agora como frases símiles: “Putin, would eat you for lunch” (Harris) ou “Her father is a marxist” ( Trump).

A integridade deu lugar ao vale tudo, o humor ao vazio intelectual e o currículo a cadastro… É frustrante, mesmo para quem não viveu esses tempos, ver e rever tais sublinhados e de seguida voltar à matriz de debates circenses. Imagino para quem os viveu!

Tamanha distinção, não caiu do céu. Nos últimos 10 anos, solidificaram-se duas Américas de costas voltadas. A protecionista, sem sentido de responsabilidade e fechada ao mundo, localizada no miolo dos EUA, que por sua vez é ensanduichada por uma América das Costas Este e Oeste woke, que se julga de superioridade moral e esquecida do seu papel no mundo.

Nem sempre foi assim. A ordem e transição política nos EUA sempre funcionou precisamente porque o partido Republicano e o Democrata tiveram sempre grandes divergências quanto ao tamanho do governo e interferência na economia, mas grande harmonia nas questões centrais como

liberdade individual, abertura ao mundo e estado de direito. Como replicou Nixon a Kennedy em 1960: “Our disagreements are not about the goals to America, but only about the means”.

Não obstante, pretendo deixar claro que isto não é nenhum saudosismo ao passado. Pois embora devamos aprender com este, é no futuro que nos devemos centrar. Tão pouco, uma intenção de fazer tábua rasa do mundo ocidental. É precisamente por crer no Ocidente como lanterna do progresso que sou mais exigente connosco próprios. Não confundamos a árvore com a floresta. Temos muito a melhorar? Claro que sim. Podem outras paragens vir dar-nos lições de moral de forma oportunista? Não, obrigado. Já dizia Ronald Reagan: “Better dead than red”.

Se não para outras paragens, para onde devemos olhar? Costuma dizer o ditado, que a solução está debaixo do nosso nariz, e parece-me ser este o caso. Não ao acaso, a constituição americana inicia-se com “We the people…” fruto do ímpeto revolucionário de não permitir que o Estado e o establishment lhes imponham pre escolhas, extremos e “males menores” para os destinos do país. É o sistema americano de matriz first past the post dificultador? Sim, mas é também o sistema americano aquele que encarna melhor o american dream para qualquer cidadão. É de facto possível, intrometer-se no sistema político americano mesmo não tendo o patrocínio inicial do próprio. Assim o fez o ator Reagan com a célebre frase “I paid for this microphone”, Bill Clinton de origens humildes ou mesmo Ross Perot.

Assim sendo, para futuro, já que não nesta eleição, cabe aos americanos serem proativos por verdadeiras soluções. Não queiram os próprios eleger alguém à Casa Branca, só para tirar outro alguém que odeiam, ou permanecerão 4 anos a contar os dias para tirar esse novo alguém.

E como lembra a música de Lee Greenwood “may God bless the USA”.