Maria (nome fictício) tem 40 anos, dois filhos e é gerente de uma pequena empresa. Acreditava que ser multitasker era a solução para os seus problemas. Tentava ser tudo: mãe presente, profissional dedicada e mulher multifacetada. “Tenho que estar sempre a resolver mil coisas ao mesmo tempo e se não o fizer, não chego a lado nenhum”, dizia-me. No entanto, algo começou a falhar: “A minha atenção e memória estão um desastre, cometo erros a toda a hora, sinto-me exausta… Esforço-me tanto, mas parece que nunca é suficiente”.
A necessidade de ser sempre mais e fazer cada vez melhor acabou por deixar a Maria à beira de um esgotamento. Apesar de todos os esforços, sentia-se cada vez mais extenuada e distante da pessoa que queria ser. Na tentativa de chegar a tudo e a todos, estava a perder-se a si mesma: “Irrito-me com tudo e acabo por descarregar nos meus filhos e no meu marido… depois vem a culpa, que me corrói por dentro. Não gosto desta pessoa que me estou a tornar…”, dizia-me em lágrimas.
Afinal, ser multitasker estava a fazer mais parte dos problemas do que da solução.
A história da Maria não é um caso raro. É uma realidade que tenho ouvido incontáveis vezes ao longo de mais de 15 anos de prática clínica. E, se formos honestos, é uma história que, de uma forma ou outra, todos já vivemos. Quem nunca se viu preso nesta necessidade de chegar a tudo e a todos, ao mesmo tempo?
O problema do multitasking é simples: dividir a atenção por múltiplas tarefas ao mesmo tempo não aumenta a produtividade e apenas gera uma falsa sensação de eficácia. A Associação Americana de Psicologia refere que o custo do multitasking é de cerca de 40% na perda de produtividade.
Na minha prática clínica tenho observado que as pessoas multitaskers, como a Maria, demonstram frequentemente níveis elevados de stress, irritabilidade, impulsividade, ansiedade, depressão e dificuldades de concentração. Por isso este não me parece ser o caminho para a eficiência ou produtividade, mas antes para o esgotamento mental e emocional.
Para combater o multitasking e os seus efeitos negativos, há estratégias simples, mas eficazes, que qualquer pessoa pode usar. Estas foram também trabalhadas com a Maria e mostraram-se transformadoras para a recuperação do bem-estar:
- Definir prioridades e valores pessoais. Começar por refletir sobre o que realmente importa para nós é um passo essencial. Saber quais são os nossos valores e prioridades ajuda a fazer escolhas conscientes e a dedicar tempo e energia ao que realmente vale a pena;
- Praticar a atenção plena (mindfulness). As práticas da atenção plena têm diversos benefícios, entre os quais a diminuição do stress e o aumento da concentração. Podemos incluir pausas curtas ao longo do dia para respirar profundamente ou utilizar apps de meditação guiada para iniciar a prática;
- Estabelecer limites digitais. A desconexão digital é crucial num mundo constantemente “ligado”. Podemos criar momentos “off” ao longo do dia, como desligar notificações durante tarefas importantes ou definir horários sem ecrãs, como antes de dormir ou durante refeições em família;
- Melhorar a gestão de tempo. Bloquear horários para tarefas específicas ou priorizar até três tarefas importantes por dia, pode ser útil. Dizer “não” ao que não é urgente também é fundamental;
- Cultivar a autocompaixão. Podemos aceitar que somos humanos e imperfeitos, que não podemos fazer tudo. Em vez de nos criticarmos por não conseguirmos fazer mais, podemos valorizar os nossos esforços e celebrar as pequenas conquistas diárias.
A era moderna incentiva o multitasking, mas podemos escolher um caminho diferente: priorizar o equilíbrio em vez da sobrecarga, a calma em vez da pressa, o bem-estar em vez da perfeição e a saúde psicológica em vez da busca obsessiva pelo sucesso. Estas escolhas exigem coragem, mas também são o maior gesto de autocuidado que podemos ter connosco próprios.
Hoje a Maria sente-se mais leve e alinhada com a forma como está a viver a vida. Os desafios continuam a existir, mas agora consegue concentrar-se no que realmente importa em cada momento, mantendo um ritmo que respeita o seu bem-estar.
Quando se trata de produtividade e eficiência, menos é realmente mais. Escolher fazer menos não é desistir nem ficar para trás, mas honrar o que é essencial. E, quando priorizamos o que realmente importa, encontramos tempo, energia e espaço para o que nos faz sentir verdadeiramente bem. Trata-se de escolher fazer menos para viver mais e melhor.
Cláudia Madeira Pereira, doutorada em Psicologia Clínica, é psicóloga clínica e da saúde e exerce em prática privada.
Mental é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com a Saúde Mental. Resulta de uma parceria com a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) e com o Hospital da Luz e tem a colaboração do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Psicólogos Portugueses. É um conteúdo editorial completamente independente.
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