Vivemos um novo ciclo político na União Europeia. Em Junho elegemos 720 Deputados ao Parlamento Europeu e, pela primeira vez em quatro décadas, sem votos britânicos. Nos últimos anos tivemos uma pandemia que colocou à prova a nossa solidariedade, uma invasão russa da Ucrânia que testou a nossa coragem, uma crise inflacionista que desafiou a nossa resiliência. A tudo isto junta-se um cenário internacional marcado pela incerteza, entre a escalada de tensão no Médio Oriente, as eleições presidenciais nos Estados Unidos da América e a ascensão dos populismos apoiados pela máquina de influência e propaganda de Moscovo. Ainda assim, fomos a votos e, se é verdade que assistimos ao reforço de forças radicais, não é menos verdade que entre democratas-cristãos, sociais-democratas, liberais e socialistas moderados há uma maioria clara europeísta e comprometida com o futuro da integração.

Foi essa maioria que reelegeu Ursula Von der Leyen e lhe confiou a missão de liderar a Comissão Europeia nos próximos cinco anos. O Parlamento prepara-se agora para ouvir os candidatos a comissários e eleger o Colégio. O exercício de formar uma Comissão é sempre complexo, mas temos uma equipa que inspira confiança. Note-se a criação de um portfolio para a Habitação, uma das áreas em que os cidadãos querem, claramente, mais Europa; veja-se o que significa lançar uma pasta da Defesa no seio de um executivo comunitário; sublinhe-se o sinal que se dá quando se destaca a Solidariedade Intergeracional. Finalmente, atente-se na relevância estratégica do portfolio atribuído à Comissária Indigitada portuguesa, Maria Luís Albuquerque. Numa Comissão virada para o relançamento da competitividade do continente, é à candidata portuguesa que é atribuída a pasta da União das Poupanças e do Investimento. É uma pasta com grandes responsabilidades entre a conclusão urgente da União Bancária e a dinamização da União dos Mercados de Capitais.

Ao mesmo tempo em que os comissários estão a preparar-se para as suas audições, também António Costa se instala em Bruxelas, para um mandato desafiante como Presidente do Conselho Europeu. Não vai ser um caminho fácil, o do antigo Primeiro-Ministro, num Conselho que tem um húngaro Viktor Órban cada vez mais desafiador dos valores europeus; uma Primeira-Ministra italiana conservadora em clara afirmação de poder (também a nível europeu) um Presidente do Governo espanhol em crises sucessivas; um Presidente francês contestado e com eleições à porta, com os extremos políticos à espreita; um Chanceler alemão que pode estar a prazo; entre as circunstâncias particulares de cada um dos 27. António Costa tem a experiência, o talento e o prestígio necessários para enfrentar este contexto difícil e terá ocasião de provar que a sua escolha não foi apenas o acordo político possível, mas a confiança num mandato que tem de ter resultados concretos. O Conselho Europeu não pode ser um actor lateral da História da Europa.

Ora, consequência é mesmo a palavra-chave. Não basta ter bons Relatórios. Só no último ano tivemos o Relatório Noyer sobre os mercados de capitais, o Relatório Letta sobre o Mercado Interno, o resultado do Diálogo Estruturado sobre o Futuro da Agricultura e o Relatório Draghi sobre o futuro da competitividade europeia. Todos eles apelidados de estratégicos e todos eles convergentes no diagnóstico: a Europa não está no estágio de integração em que podia estar e isso hipoteca o seu potencial. Para além das reflexões e dos debates, há que fazer opções políticas; há que ser consequente e decidir, legislar, reformar. Uma vez mais, essa discussão parece estar concentrada na “bolha” de Bruxelas e pouco ou nada interessa ao cidadão comum. Não pode ser assim. Boa parte do nosso futuro colectivo pode passar por decisões que resultam destes relatórios. Por isso, não podemos estar alheados desse debate. A Nossa Europa vai promover, nos próximos meses, essa discussão em Portugal, mas não a fará fechada em salas de onde não sai nada. Queremos e iremos contribuir com uma análise séria às propostas que têm vindo a ser avançadas para o futuro da Europa e não deixaremos de tomar posição. Uma postura que não queremos político-partidária, mas pretendemos cívica, de serviço.

Nos próximos anos a Europa terá de decidir como aprofundará a integração em matéria de Defesa; terá de negociar o Quadro Financeiro Plurianual para lá de 2030; terá de olhar para o alargamento a Leste com responsabilidade geracional; terá de liderar a onda da Inteligência Artificial, da Automação e Robotização, da Digitalização das economias e das sociedades; terá de escolher que papel terá na transição climática e na promoção das tecnologias limpas; terá, finalmente, de assumir que papel quer ter num Mundo em que os seus valores de Liberdade, Igualdade, Democracia, Estado de Direito e Respeito pela Dignidade Humana são ameaçados por potências concorrentes e seus satélites. Estes temas não são abstractos nem longínquos. Exigem decisões hoje, porque o futuro está à porta.

Portugal está, uma vez mais, no pelotão da frente da integração. Isso orgulha-nos, mas também nos responsabiliza. Está na hora de assumir essa responsabilidade.

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