Um milagre de Natal aconteceu. Desta vez o foco não é Pedro Nuno Santos (e aqui soltemos um verdadeiro “hallelujah”, não na sonante voz de Leonard Cohen, mas incorporando a Maria Leal que habita dentro de cada um de nós, meros mortais). O foco é mesmo a Autoridade Tributária.

O Ministério das Finanças fixou a percentagem máxima prevista na lei referente à receita de 2022 que ultrapassou os 1000 milhões de euros (mais precisamente 1071,3 milhões de euros), ou seja, um reforço do Fundo de Estabilização Tributário de 53,6 milhões de euros.

Esta módica quantia será distribuída em três parcelas (maio, setembro e dezembro) para os trabalhadores da Autoridade Tributária. Mas como nem neste organismo existe um verdadeiro princípio da igualdade, a divisão não será equitativa, e apurando a média aritmética, quem exerce um cargo de dirigente receberá cerca de 7 mil euros e os outros trabalhadores cerca de 3800 euros.

Mas de onde vem este dinheiro? A resposta é muito simples e consta da Portaria n.º 449/2023, de 22 de dezembro. Em cada ano deve ser determinada a percentagem do montante da cobrança coerciva, realizada no ano anterior, derivada dos processos instaurados pelos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que constitui receita própria do Fundo de Estabilização Tributário (FET).

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Ou seja, a distribuição destes montantes resulta da avaliação do desempenho ou produtividade global dos serviços da Autoridade Tributária, enquanto organização, face ao grau de execução dos planos de atividades e de cumprimento dos objetivos globais estabelecidos ou acordados com a tutela.

A Portaria foi publicada pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Santos Félix.

E porquê um cabaz de Natal tão composto? Como consta da Portaria: “os resultados da arrecadação efetiva de receita tributária, bem como o desempenho alcançado no desenvolvimento das atividades globais da AT, são reveladores do elevado grau de cumprimento dos objetivos estabelecidos para o ano de 2022. Desempenho que assume particular relevância num cenário em que, saídos da pandemia da COVID-19, os países europeus viram-se confrontados com novos desafios económicos resultantes da Guerra na Ucrânia. Os bons resultados alcançados são reflexo da dedicação dos profissionais da AT e da sua capacidade de adaptação e mudança que lhes permite responder aos desafios crescentes que se lhe colocam e que põem à prova a sua capacidade de resiliência”.

Nuno Santos Félix, limita-se a fazer aquilo que se espera de um membro de um Governo Socialista: dar palha para os burros se alimentarem.

Utilizar a justificação da “saída da pandemia da COVID-19” e de que os “países europeus viram-se confrontados com novos desafios económicos” é literalmente gozar com quem trabalha. Mas os efeitos económicos da pandemia e da guerra afeta a Autoridade Tributária ou afetam os contribuintes? Já sabemos uma eventual resposta do Sr. Secretário a uma afirmação destas: “sem cobrança de impostos não há receitas do Estado”. É verdade. Mas em bom português: quem se lixa é o Zé Povinho (uma vez mais).  O jogo da caça à multa é como nos casinos, a casa ganha sempre.

Saliente-se: há mais pobreza em Portugal. O ano de 2022 terminou com 17% da população em risco de pobreza ou exclusão social. Cerca de 1.700.000 pessoas tentam sobreviver com menos de 600 euros por mês (esta foi uma das conclusões do inquérito às Condições de Vida e rendimento em Portugal, promovido pelo Instituto Nacional de Estatística, que revela que há cada vez mais pobreza em Portugal e isso leva a mais pedidos de ajuda).

Por outras palavras, os pobres ficaram mais pobres, não só por causa dos efeitos da pandemia e da guerra, como também pelo maior pagamento de impostos.

Só sei que, num ano, um dirigente da Autoridade Tributária vai levar mais em prémios por ter cobrado coercivamente dinheiro aos contribuintes do que quase 2 milhões de pessoas “têm para se orientar” num ano civil.

Mas calma, que a notícia não acaba aqui. Desta vez, o ator principal da novela não é o filho do Presidente da República. Também é, neste momento, um milagre de Natal.

Tal como consta do site: www.portugal.gov.pt, o Secretário de Estado, Nuno Santos Félix, de agosto de 2019 a dezembro de 2022, exerceu as funções de subdiretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, sendo responsável pela área da Relação com o Contribuinte, que integra os domínios do planeamento, do controlo de gestão, da comunicação, do atendimento, do apoio ao cumprimento e da defesa dos direitos dos contribuintes. Naquele período, e também no âmbito da Autoridade Tributária e Aduaneira, integrou o Conselho de Administração (por inerência) e o Comité de Ética, Segurança e Controlo (por designação da diretora-geral).

A minha pergunta é: será que também recebeu um belo cabaz de Natal?

Mas o Partido Socialista joga tudo às claras. O Partido do Largo do Rato chumbou uma audição a Nuno Santos Félix, a propósito do seu alegado anúncio de querer aumentar o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Está explicado: é às claras que não querem que nada se saiba.

Não, não é na Netflix. É em Portugal.