A Comissão Europeia deu luz verde ao descongelamento de 10,2 mil milhões de euros de fundos europeus para a Hungria, apesar das persistentes dúvidas sobre a independência do seu sistema judiciário e o evidente desrespeito pelo Estado de Direito. Na última audição da Comissão de Controlo Orçamental do Parlamento Europeu com os Comissários Dombrovskis e Gentiloni em que eu participei, esta decisão parecia pouco provável.

A decisão de desbloquear os fundos para a Hungria questiona a coerência e integridade da política da UE. Embora justificada com supostas reformas judiciais (bastante insuficientes), este reembolso surge num momento em que a Hungria exerce uma chantagem política forte no Conselho Europeu. Parece evidente que o desbloqueio dos fundos foi a moeda de troca para suavizar a posição de Budapeste sobre a renegociação do orçamento de longo prazo da UE e a abertura da negociação de adesão de Kiev. Ora o resultado desta cedência foi a “abstenção” de Viktor Orbán no voto que autorizou a abertura das negociações com a Ucrânia, mas manteve o veto a qualquer decisão sobre o novo orçamento, sem o qual se torna impossível continuar com o apoio ao esforço de defesa ucraniano. Orbán jogou as suas cartas e saiu vencedor.

O Parlamento Europeu, no seu papel de vigilante dos valores europeus, enfrenta um desafio. Por um lado, a necessidade de apoiar os Estados-Membros e promover a coesão dentro da União e corresponder aos seus compromissos internacionais. Por outro, a obrigação de defender os princípios fundadores da UE, incluindo o Estado de Direito. É importante lembrar que a União Europeia foi construída sobre alicerces de democracia, transparência e respeito pelos direitos humanos e que isso constitui o mais importante dos Critérios de Copenhaga a que obrigamos todos os candidatos à adesão. Quando um dos nossos Estados-Membros desafia esses princípios, é dever de todas as instituições europeias, incluindo o Parlamento Europeu, agir como guardião ativo desses valores.

Importa recordar que a UE não é apenas o Mercado Interno e o Euro, é uma União de valores com tradições constitucionais e uma Carta dos Direitos Fundamentais.

Este desbloqueio dos fundos tem, assim, de ser bem justificado e deve envolver um escrutínio sério e uma fiscalização mais rigorosa sobre como os valores europeus são respeitados e promovidos em todos os Estados-Membros incluindo na Hungria. O Parlamento Europeu e a sua Comissão Orçamental não se vão demitir dessa tarefa. Esperamos para ver como se vão posicionar a Comissão e o Conselho que parecem mais vulneráveis à relatividade dos valores. Sou dos que acreditam que a integridade da União Europeia e o respeito pelo Estado de Direito têm de permanecer como a nossa bússola orientadora.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR