Com quatro traços queimam-se horas numa tarde com o famoso jogo do galo. O objetivo deste jogo consiste em criar primeiro uma linha vertical, horizontal ou diagonal. Quem nunca experimentou isto? A sua origem remonta 3500 a.C. de acordo com pinturas nas pirâmides egípcias (Epstein, 2012) e francamente, não compreendo como é que perdura tanto.

Na gíria futebolística diz-se que tudo é questão de estratégia e atitude e assim entende-se o plano de ações que levam a cumprir o objetivo pelo qual fomos a jogo, ou seja, ganhar e na falta de melhor, empatar.

Vejamos o seguinte algoritmo (Domingos P, 2017):

«Se o adversário tiver dois em linha, jogar no quadrado restante.
Senão, se existir uma jogada que crie duas linhas de dois, executá-la.
Senão, se o quadrado central estiver livre, ocupá-lo.
Senão, se o adversário ocupou um canto, ocupar o canto oposto.
Senão, se houver um canto livre, ocupá-lo.
Senão, ocupar qualquer quadrado livre.»

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Desta forma, definimos a estratégia e atitude do atleta de alto rendimento do jogo do galo! Definimos um algoritmo que garante a vitória ou o empate. Podemos agora refinar o objetivo do jogo do galo: fazer uma linha antes do adversário ou caso não consiga, impedir que ele a faça.

Vivemos na Era dos algoritmos, ainda assim, definir “algoritmo” é um desafio. Existem incontáveis definições por metro quadrado de bibliografia… Não é intenção apresentá-las. Através do algoritmo descrito, podemos clarificar as ideias sobre este conceito, enquadrando-o como um conjunto de regras que fornece uma sequência de operações para resolver um determinado problema (Knuth, 1997). Este processo orienta-se à tomada da melhor decisão possível, entre várias, com foco no objetivo de partida (Jourdan et al, 2009; Rahman e Radish, 2021). A essência do que hoje chamamos “Inteligência Artificial” são os algoritmos.

O termo inteligência artificial foi apresentado por John McCarthy na década de 50. Hoje, o mesmo tema é experimentado em tantos e diversos setores da sociedade, em destaque na saúde. Em 2016, o setor da saúde liderou os investimentos da aplicação da inteligência artificial (Amisha et al, 2019).

Hoje a procura de precisão e de medidas cada vez mais pequenas, a diferenciação de diagnósticos, especificidade de procedimentos, a abundância de dados e tantos outros definem as ambições emergentes na área da saúde. Esta conquista constrói um sistema personalizado e especializado em que se toma consciência da incapacidade de uma resposta puramente humana, tomando parte o investimento na tecnologia, reconhecendo o alcance e valor acrescentado desta coligação.

A Inteligência Artificial não consiste na desumanização, muito pelo contrário, consiste na conquista de territórios inacessíveis às mãos humanas. Quanta informação em bruto está nos registos que temos de décadas e que hoje são apenas registos… textos, frases, palavras, letras…? Quão preciso e ágil se torna o trabalho de um médico que dispõe de um diagnóstico avaliado e sugerido por uma máquina treinada? Quantos padrões são desconhecidos à inteligência humana e possíveis de interpretar com o auxílio da máquina, apresentando-se como fontes de decisão?

Existem inúmeros exemplos da aplicação da Inteligência Artificial em ferramentas de suporte no exercício e prática clínica, mas também administrativa, de expressão da revolução e transformação digital das instituições de saúde, da gestão das próprias instituições e serviços, mas também a nível do foco na produção.

Permitam-me a imagem, mas não é pela sofisticação da panela ou o aprimorado desempenho da fonte de aquecimento que uma omelete se deixa de fazer com ovos, mas otimiza o processo! A era da eficácia já passou… hoje procuramos eficiência. É este o racional de aplicação e a intenção que deve mover todos os que trabalham, desenvolvem e promovem esta área. Dos indicadores com maior expressão na análise do grau de maturidade e desenvolvimento de um sistema é a especificidade da resposta e a eficiência do processo. Olhar somente para o resultado torna-nos obcecados e incapazes de otimizar o que for, o desafio está no método. No universo das grandes perguntas de investigação o desafio não se prende em “onde queremos chegar?”, mas sim em “como vamos lá chegar?”.

É indubitável o impacto destes algoritmos no tratamento de informações, reconhecimento de padrões, no cruzamento de dados e na base de estruturas de decisão. A definição da informação diferencia um sistema que procura a precisão, alcançar escalas cada vez mais e mais pequenas, e acima de tudo que procure a produtividade efetiva.

A Inteligência Artificial é uma área emergente que toma cada vez mais parte e expressão no setor da saúde. Esta área promissora já veio dar audazes respostas em diversos contextos, contudo também traz diversos desafios. A máquina jamais substituirá o Homem, mas vem ajudá-lo! A Inteligência Artificial será o sucesso do futuro, sem qualquer dúvida, se devidamente alicerçada ao justo e correto uso das ferramentas e que nunca descuide da ética e da moral como substrato necessário de toda a investigação e aplicação no contexto das reais necessidades dos sistemas.

O sucesso da aplicação e do desenvolvimento de novos algoritmos, instrumentos complexos e inteligentes de resposta e apoio à decisão e de sistemas adaptados estão dependentes da proximidade técnico-científica à real necessidade dos serviços de saúde, isto é, do diálogo entre quem usa e quem desenvolve. É necessário que não seja mais uma ferramenta no serviço, mas que seja a ferramenta que lhes proporcione prestar um melhor serviço.

A Inteligência Artificial transformou a noção de espaço e de tempo e através destes algoritmos podemos encontrar respostas que sozinhos nunca conseguiríamos alcançar e conhecer informações e explorar processos em quantidade e qualidade. É a porta para um mundo mais tecnológico e digital ao serviço dos doentes e do sistema de saúde. Cuidemos desta inteligência, para que nunca se torne burra!

Bibliografia

Epstein, R. A. (2012). The theory of gambling and statistical logicAcademic Press.

Domingos, P. (2017). A revolução do algoritmo mestre. Editorial Presença. 9ª Edição.

Knuth, D. E. (1997). The art of computer programming (Vol. 3). Pearson Education.

Jourdan, L., Basseur, M., & Talbi, E. G. (2009). “Hybridizing exact methods and metaheuristics: A taxonomy”. European Journal of Operational Research, 199(3), 620-629.

Rahman, C. M., & Rashid, T. A. (2021). “A new evolutionary algorithm: Learner performance based behavior algorithm”. Egyptian Informatics Journal, 22(2), 213-223.

Amisha, P. M., Pathania, M., & Rathaur, V. K. (2019). “Overview of artificial intelligence in medicine”. Journal of family medicine and primary care, 8(7), 2328.