Estou convencido de que uma esmagadora parte do eleitorado de Direita deseja um resultado das próximas eleições legislativas que permita cumprir três grandes objectivos:

Tirar o PS do poder.

Manter o PS afastado do poder.

Reduzir a intervenção do Estado nas nossas vidas.

A questão é que entre os não-socialistas nem todos concordam com os melhores caminhos para que estas vontades se concretizem. Ainda assim, será consensual neste campo político a constatação de que para impedir Pedro Nuno Santos de ganhar as eleições, e afastar o PS do poder por tempo higienicamente recomendável, importa desde logo convencer os Portugueses a fazerem opções eleitorais que retirem o maior número possível de votos ao PS e que sejam criadas condições que permitam a manutenção de um governo de Direita cuja sustentabilidade política seja tanto mais facilitada quanto maior for o universo de eleitores que o suporte.

Por mim, gostaria que a Direita se afirmasse simultaneamente com medidas consistentes para redução de despesa pública e com uma postura que não cedesse ao wokismo ou ao desenho da sociedade por via legal. Mas para este desiderato não vislumbro no actual panorama partidário qualquer agremiação que mereça o meu voto.

Contudo, first things first, e baseando-me nos dados de uma recente sondagem política elaborada pela Universidade Católica (UCP) e na minha própria análise da dinâmica eleitoral, concluo que para tirar o PS do poder o ideal é que cresça o abstencionismo dentro das hostes socialistas e diminua no campo não-socialista. Segundo a UCP, mais do que a Aliança Democrática (AD), é a Iniciativa Liberal (IL) e o Chega (CH) que vão buscar votos à abstenção. Verifica-se também que, hoje, a maior transferência de votos socialistas (do PS em 2022) para Direita, tem como destino a AD e o CH, por esta ordem. Sucede que tanto o CH como IL tiram relativamente mais votos à AD do que ao PS, mas apesar de tudo o CH tira mais votos ao PS do que a IL. Aliás, a IL não tira votos ao PS, segundo o relatório da Católica. O voto na IL apresenta-se assim como “inútil”.

Por outro lado, embora não bem formuladas, das perguntas usadas pela UCP para sondar os inquiridos sobre quais os arranjos parlamentares e de governo melhores para o país pode inferir-se que o eleitorado AD tem clara preferência por um governo minoritário com apoios à sua Direita. A abertura para negociar que o eleitorado AD sugere dá, no entanto, primazia à IL, mas não rejeita alargar conversações ao Chega se necessário fôr para a maioria parlamentar. Ou seja, aparentemente o «não-é-não» é uma linha mal sintonizada com as preferências do eleitorado da Aliança Democrática.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Claro que para aumentar a probabilidade de a AD vencer as eleições em vez do PS, nada como votar na coligação. Apesar do facto de, infelizmente, as políticas do PSD e PS não serem substancialmente distintas, já seria positiva a mudança de protagonistas e de decisores políticos. Se bem que Luís Montenegro garante alguma dignidade institucional, coisa que não acontece com Pedro Nuno Santos.

Mas quem como eu viu a intervenção de Paulo Portas na apresentação da coligação e os entusiasmados aplausos dos dirigentes da AD aos dislates desprezíveis, mentirosos e repugnantes que nesse momento ecoaram na sala, sente-se moralmente impedido de colocar na urna um voto numa agremiação que tem uma criatura politicamente sórdida como sua eminência parda e que durante dois anos foi um dos mais destacados evangelistas de uma sociedade fascisto-sanitária, bio-totalitária, repressiva, segregadora, permissiva de abusos de poder de toda a ordem e privadora das mais elementares liberdades e direitos básicos das pessoas. Ainda para mais, sendo eu eleitor no círculo do Porto, torna-se visceralmente impossível votar no respectivo cabeça de lista da AD, por razões semelhantes.

A Iniciativa Liberal seria à partida a minha escolha pelo mal menor. O seu cabeça de lista revelou-se um dos nossos melhores deputados, admiro-o pela sua inteligência, e é alguém em quem já votei mais do que uma vez. Porém, esteve publicamente silencioso durante o período do maior ataque à Liberdade e Democracia que o nosso país viveu nos últimos 50 anos – os chamados “tempos da pandemia” – quando espantosamente não estava sequer condicionado por qualquer espartilho partidário (e ainda que estivesse!), já que à altura era responsável por um ThinkTank chamado +Liberdade.

Uma omissão que seria relevada não fosse o caso de a Iniciativa Liberal evidenciar cada vez mais traços da sua génese e essência fundadora, ou seja, seguindo activamente toda e qualquer agenda dita progressista, sinalizadora de suposta virtude, fazendo concessões morais em troca de ser aceite pelo bem-pensismo urbano-relativista em questões como o aborto ou a eutanásia, ou alimentando fantochadas e folclore da cultura woke, importando para o nosso país os piores e mais reles preceitos que se vão adoptando noutras sociedades podres e enfermas.

Na área económica a IL continua também sem perceber que antes da baixa de impostos é preciso reduzir a despesa pública. Não só em termos relativos, mas sobretudo em valor absoluto. A liberdade das pessoas aumenta não pela maior eficiência da utilização de verbas provenientes do roubo fiscal nem pela competência no uso do dinheiro dos impostos, mas pela inequívoca e corajosa redução estrutural e permanente do tamanho e âmbito do Estado. Objectivo este de que continuamos sem ouvir palavra relevante da IL.

Sabe-se que é da natureza dos partidos querer transpor os seus programas para letra de Lei e, por isso, só o acne dos hiperbólicos activismos políticos e fantasias adolescentes impedem constatar que a liberdade das pessoas tende a ser inversamente proporcional ao número de ideias que os partidos têm para a sociedade.

Não obstante, ao Chega não faltam ideias e propostas. Tantas que se contradizem entre si num emaranhado de promessas para todos os gostos e grupos de interesses, revelando a inconsistência doutrinária deste partido e o desvio cada vez mais acentuado de uma rota populista que, assim, provavelmente já vai tarde demais para se orientar num caminho de verdadeira direita conservadora e nacionalista (que em todo o caso não é da minha preferência). O estatismo do CH é sobretudo claro na área económica e surpreende-me até quem só recentemente disso se apercebeu. É pena que assim seja porque como comentou em Novembro Pedro Passos Coelho além de não ser antidemocrático o Chega tem trazido para o debate temas muito relevantes esquecidos pelas restantes formações políticas e tem dedicado uma atenção especial à chamada “guerra cultural” contra o wokismo, é apologista de um travão à agenda globalista das sinistras elites internacionais e partilha de um sensato e necessário eurocepticismo nas questões que envolvem o posicionamento nacional no quadro da União Europeia. Ao invés, o Chega resolveu vender banha-da-cobra durante esta campanha eleitoral, apresentando um conjunto de medidas contraproducentes e demagógicas que repelem gente como eu, pouco dada a lirismos económicos neo-marxistas.

Em eleições não se pretende escolher amigos nem convivas para jantares. A cada um assiste o direito de excluir de sua casa visitas por quem não tem especial simpatia. Mas isso é bem diferente da antidemocrática indisfarçável repugnância e apartheid que dirigentes e formadores de opinião da nossa Direita querem que se faça a uma parte dos Portugueses que votam, representem eles 20% ou 2% do eleitorado. Além de tristes reminiscências trotkistas de uma Direitinha serventuária da Esquerda, as «linhas vermelhas» replicam o mesmo e exacto desumano esquema mental em que histérica e facilmente se pretendeu segregar, castigar e quiçá eliminar os «negacionistas» e não-“vacinados” contra a covid19.

Este precedente de excluir o Chega do diálogo, compromissos e acordos com outras forças políticas, além de hipócrita e contraproducente é uma atitude assente num plano inclinado que vê críticos e desalinhados como gente deplorável, algo cuja sequência lógica e rapidamente resvala para uma sociedade fechada e uma distopia totalitária. Somos todos Charlie Hebdo. Somos todos Ucrânia. Somos todos Chega?

Basta esta circunstância para desejar que o Chega tenha uma grande votação nas eleições legislativas de 10 de Março. Já agora, suficientemente elevada para ser incontornável, ajudando a forçar o espaço da Direita a reformar-se e a encontrar lideranças adultas, recuperando a maturidade democrática e o respeito pelo voto livre de Portugueses. Até porque, como escrevi em Julho passado, o melhor que poderia acontecer ao PSD e à IL seria o Chega integrar um governo de Direita. E o pior que poderia acontecer ao Chega seria fazer parte do Executivo.

Então, no fim de contas, não havendo um Javier Milei português, qual a opção de quem considera um imperativo categórico tirar o PS do poder? Em que partido vota alguém que por razões tácticas é incapaz de subverter os seus princípios morais votando AD, mas simultaneamente não quer tirar votos à coligação para evitar o mal maior?

Não vota em nenhum.

Nota Editorial: Os pontos de vista expressos pelos autores dos artigos publicados nesta coluna poderão não ser subscritos na íntegra pela totalidade dos membros da Oficina da Liberdade e não refletem necessariamente uma posição da Oficina da Liberdade sobre os temas tratados. Apesar de terem uma maneira comum de ver o Estado, que querem pequeno, e o mundo, que querem livre, os membros da Oficina da Liberdade e os seus autores convidados nem sempre concordam, porém, na melhor forma de lá chegar.