A ideia de que as outras pessoas não são grande coisa tem atractivos e adeptos. O maior desses atractivos é que só dá alegrias. Com efeito, a cada vez que encontram uma pessoa má os adeptos da ideia vêem confirmada a sua hipótese geral; e quem acredita que os outros são maus só encontra más pessoas. Pelo contrário, a ideia de que estamos rodeados de boas pessoas suscita decepções. Teremos decerto de vez em quando as alegrias da confirmação; mas quando não as temos sentimo-nos como quem é apanhado por um aguaceiro de que não estava à espera. Quem acha que as pessoas são todas más não conhece essas decepções; cada pessoa, boa ou má, importa-lhe de menos para poder alterar as opiniões já que tinha sobre toda a gente.

Uma análise custo-benefício das nossas atitudes morais não pode deixar de concluir que é mais vantajoso decidir que estamos rodeados de más pessoas. Mais vantajoso, no entanto, para quê? A resposta é: para os nossos sentimentos. Se a unidade de medida forem as nossas alegrias, será mais proveitoso e, porque não dizê-lo, prudente concluir que estamos rodeados de brutos desagradáveis. É a atitude primitiva conhecida como pessimismo antropológico.

Levanta-se todavia a questão de saber se medir sentimentos é o melhor modo de testar as nossas hipóteses sobre os outros; e de saber se a gratificação dos nossos sentimentos é o critério certo para organizar os nossos fins. Não será; mas não adianta dizer simplesmente que não é. Ninguém substitui uma ideia sombria sobre os outros apenas porque foi repetidamente exposto a imagens de freiras a andar de vespa.

Um argumento preferível pode ser expresso na linguagem custo-benefício, que os pessimistas reconhecem com mais facilidade. Consiste em chamar a atenção para o trabalho que dá agir na suposição de que estamos rodeados por animais maus. Os pessimistas, de facto, compram a pouca esperança que têm nos outros com doses monumentais de esforço. Esse esforço é imprescindível para poder imaginar os outros constantemente de pé atrás, e com quatro pedras na mão. Têm sempre de se aplicar com afinco para determinar o que as outras pessoas realmente quiseram dizer, e o que estão realmente a fazer; e usar de arte para as poder apanhar em flagrante, e para as punir melhor.

A maior parte das outras pessoas não são porém apenas como nós, avessos a canseiras: são, como quase todos nós, optimistas. Tendem a fazer o que pretendem fazer, e a dizer o que querem dizer; especializam-se em frases que acham que são verdadeiras, abrem as janelas quando têm calor, cumprem as promessas que fazem, e lavam os dentes quando têm razões para isso. Naturalmente não agirão assim todas as vezes: mas encorajados nós a acreditar que eles, como nós, têm essas tendências, e com as energias preservadas por este optimismo, ficamos no geral bem equipados para os percalços que possam sobrevir.

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