(…) sozinha me vi delirante e perdida, e uma estrela serena me espantava”
Sophia de Mello Breyner Andresen, in Livro sexto

Ao longo da nossa história, em todas as áreas da sociedade, o mundo foi-se alterando e evoluindo, marcado pelos passos de protagonistas que mudaram o rumo das coisas. São muitos os exemplos de quem aprofundou a cultura, de pessoas que nos mostraram o que era a beleza, de indivíduos que construíram alicerces sólidos e inquebráveis. Da coragem nasceu o progresso, da inquietação e superação nasceram as boas obras e na busca da verdade brotaram raízes firmes e resistentes. Quando tudo parecia desvanecer-se e o mundo oscilava, nem a nortada mais assustadora era capaz de levar o que havia sido feito.

São exemplos passados, são exemplos para o futuro, são exemplos que se fazem presentes, independentemente da cronologia. Na pintura Giotto, na música Beethoven ou Chico Buarque, na política Churchill e no futebol Guardiola.

Provavelmente, estamos a atravessar um período diferente na história. Arrisco dizer que a evolução parece acontecer de forma mais abrupta. A tecnologia avança à velocidade da luz, cada vez mais existem diferentes mecanismos de pesquisa ou de resolução de problemas, onde a utilidade de cada invenção perde espaço de manobra a cada segundo que passa. Se o IPhone 5 já está fora de moda, onde estão as pilhas de enciclopédias ou o ancestral teletexto? Ninguém sabe deles… São necessárias novas perspetivas!

Pertenço à geração dos influencers, das já citadas inovações tecnológicas e dos cursos online; pertenço à geração do Instagram, do Pingo Doce sem as caixas tradicionais e das televisões inteligentes; pertenço à geração dos que viram a crise passar pelas famílias, dos que sabem que tirar uma licenciatura e mestrado é apenas banal; pertenço à geração das multi-profissões, dos que querem trabalhar naquilo que os apaixona; pertenço à geração dos inovadores persistentes, dos que querem marcar a diferença e dos que criam postos de trabalho onde eles não existem. Mas, de igual forma, faço parte da geração onde o fosso entre o passado e o presente é cada vez maior, onde o desapego pela história, muitas das vezes, se sobrepõe à ambição natural e legítima. Faço parte da geração dos que desejam necessariamente fazer diferente e melhor, com a pretensão de ignorar o que nos põe a todos de pé a olhar fixamente para o futuro. Descartamos a “velha geração”, tentamos “romper com o passado” numa busca insaciável de “felicidade” sem eixos nem horizonte. Somos jovens e temos a ousadia de querer ir mais longe, de querer mudar o mundo! Somos jovens e estamos a vedar o passado ao futuro, estamos a ignorar o que o mundo construiu.

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Mas o que seria de Giotto sem Taddeo Gaddi? E de Beethoven sem Mozart? Quem seria Chico Buarque sem o seu “mestre soberano” Tom Jobim? E o futebol de Guardiola, será que existia sem Cruyff?

Estava recentemente a passear nos corredores da Sport TV quando um dos seniores da casa pediu para falar comigo. Na sua postura séria, imponente e caridosa, recomendou-me ouvir de novo uma coisa que eu tinha dito em direto. A perceção do meu erro não foi imediata, mas a chamada de atenção foi um bálsamo de humildade e crescimento.

Quando decidi ser treinador, apresentava-me da seguinte maneira às pessoas que gostava de conhecer: “Olá, o meu nome é Francisco Guimarães, tenho 14 anos e tenho o sonho de ser treinador de futebol”. Eram pessoas melhores do que eu, mais inteligentes, com mais experiência e, acima de tudo, pessoas que orientavam o meu olhar para coisas grandes, coisas maiores do que a minha própria pessoa. Era desta forma que me queria fazer homem. No meu desejo estava a realização da minha vocação e só um caminho bem traçado, ao lado daqueles que me queriam bem, tornava esse desejo palpável.

Sempre que me distraio e quero fazer tudo sem olhar para os que me antecederam, sempre que me conformo com a minha vida e fecho os olhos para o que me rodeia, agradeço a quem se atravessa no meu caminho e me chama à razão.

É verdade que um discípulo pode ultrapassar o mestre. É também verdade que um discípulo não vive sem ele. Porque o mestre guia, orienta, mesmo por vezes fazendo tremer o chão que sustenta o discípulo. E anda por perto, com ele, sem andar por ele. E quando o discípulo cai, muitas vezes com estrondo, está lá um braço firme que o ajuda a levantar-se e a dar um passo maior.

Agradecer aos meus mestres é pouco por tanto que têm feito por mim. Mas deixo aqui um obrigado do tamanho da história, a história que me tem ajudado a descobrir em quem me quero tornar.