No Dia da Consciencialização do Stress, que hoje se assinala, é importante pararmos para pensar. Como reagimos ao stress? Ficará surpreendido se lhe disser que a maioria das pessoas (muitas vezes de forma inconsciente) aperta os dentes em situações de stress, contribuindo para o aparecimento de dores na face e região cervical. Ter consciência deste comportamento é o primeiro passo para prevenir o agravamento das dores. E também para uma melhor qualidade de vida!
Começo com a partilha da queixa mais frequente nas minhas consultas – “Doutor, sinto muita tensão na face e nos maxilares!”.
Indubitavelmente, a sociedade moderna do século XXI exige um estilo de vida rápido, muitas vezes quase frenético, o que, de certa forma, contribui para o aumento da prevalência do stress crónico – stress constante no dia-a-dia. Na génese deste problema está o excesso de informação a que estamos ininterruptamente expostos através dos nossos smartphones (e outros aparelhos tecnológicos), as crescentes exigências e preocupações laborais e a incerteza diária, associada a períodos de instabilidade económica e social, que se agravou também com a pandemia e com a guerra na Ucrânia.
Enquanto o stress agudo – de curta duração e intenso – nos faz reagir e evoluir, o stress crónico e prolongado aumenta a nossa suscetibilidade à ansiedade e depressão. Assim, o stress é considerado por muitos especialistas a doença do século XXI, sendo que desde 2022 a OMS inclui o burnout ou stress profissional, na classificação internacional de doenças.
A resposta ao stress depende da personalidade de cada indivíduo, no entanto, a reação corporal involuntária mais comum é o apertamento dentário, aumentando a tensão nos maxilares. Na realidade trata-se de uma tensão nos músculos da mastigação e do pescoço, que por sua vez é um dos fatores de risco para uma disfunção da articulação temporomandibular (DTM). A explicação é simples: associado à tensão muscular existe uma sobrecarga da articulação temporomandibular (a mais utilizada no corpo humano) que vai dar origem a uma pressão exagerada e contínua e aqui podem começar os primeiros problemas! Esta sobrecarga muscular e articular, muitas vezes relacionada com o stress, pode estar associada aos seguintes sintomas: dor na face e ouvido, estalidos, bloqueios na abertura da boca, sensação de desencaixe dos maxilares, limitação na abertura da boca, tensão muscular e dores de cabeça.
Atualmente, a DTM afeta cerca de 34% da população portuguesa, com maior prevalência no sexo feminino. Um estudo que o grupo de investigação do Instituto Português da Face desenvolveu em 595 doentes com DTM demonstrou que cerca de 20% tinham ansiedade e cerca de 13% depressão. Em 2019, 68% dos doentes apresentavam níveis de stress superiores a 7 (numa escala 0/10), números verdadeiramente significativos e alarmantes.
No caso dos meus doentes, costumo pedir-lhes que reflitam nos dois principais fatores desencadeantes de stress, e as respostas mais frequentes direcionam-se sempre no sentido do trabalho e da gestão familiar. Este é o primeiro passo, para ganharem consciência dos triggers para o stress, porque estudos relevantes nesta matéria demonstram que ter esta consciência é um fator protetor do mesmo.
Com esse propósito, têm surgido resultados interessantes na utilização de estratégias como mindfulness, auto-compaixão e meditação com o intuito de as pessoas desacelerarem o seu ritmo quotidiano e centrarem a sua atenção plena nas tarefas diárias. Por exemplo, se tomarmos o exemplo de alguns países vemos que esta prática tem ganho cada vez mais adeptos. Vejamos o caso do Canadá onde, desde o início deste ano, os médicos podem prescrever visitas a parques naturais para que os doentes passem mais tempo na Natureza.
Esta medida é fortemente apoiada pelo conhecimento científico que demonstra que passar duas horas semanais na natureza aumenta significativamente a saúde física e mental. Como médico que se dedica a uma patologia que está muito associada ao stress e a ansiedade, sou um grande defensor desta iniciativa e da sua adoção e replicação para a realidade portuguesa.
Não obstante, há pequenas ações diárias que todos podemos adotar e que vão contribuir para a diminuição dos níveis do stress e, consequentemente, para a saúde da nossa articulação temporomandibular, nomeadamente: evitar o uso de aparelhos tecnológicos uma a duas horas antes de dormir; procurar não apertar os dentes durante o dia; praticar exercício físico diariamente; evitar ambientes e pessoas tóxicas; ter uma postura adequada no trabalho ao computador, com pausas de duas em duas hora; e estimular o pensamento positivo.
Termino com a frase mais repetida nas minhas consultas: “Doutor, sinto muita tensão na face e nos maxilares!”
Provavelmente, por trás desta tensão há stress, ansiedade e, por vezes, um quadro de depressão. Como cirurgião, tento sempre integrar a componente psicológica e mecânica. Reconheço que os bons resultados cirúrgicos só são possíveis quando consigo equilibrar o doente psicologicamente, tratando-o como um todo – corpo, mente e espírito – visão holística da medicina moderna.