Das sucessivas ondas de choque da pandemia que viraram o mundo do avesso, os confinamentos obrigatórios fizeram de 2020 (pelo menos) o ano de todos os desafios e de todos os perigos. No calendário das nossas vidas ficará para sempre marcada a reclusão imposta por um vírus global e desconhecido que, num ápice, mudou radicalmente os nossos dias.
Nos primeiros entusiasmos do teletrabalho sentenciavam-se os escritórios. A imprevisibilidade da pandemia lançou sobre o futuro uma incógnita, que logo começou a triturar rotinas do presente. Os espaços de trabalho, como sempre os conhecemos, de repente pareciam tornar-se peças do passado.
A urgente adaptação às tecnologias trouxe a comodidade das reuniões remotas que passaram para a mesa de jantar. A partir de casa, trabalhadores dos sectores privado e público tentaram manter as organizações em movimento. Em muitos casos, o posto mudou, mas o trabalho manteve-se; noutros, dramaticamente, perdeu-se o posto e o trabalho.
Em tempos de susto e de contas frágeis, a questão surgiu rápida como o contágio: funcionando o teletrabalho, para quê gastar milhares de euros em arrendamentos e investimentos em espaços de escritórios?
Mas o saber do tempo, a avaliação das mudanças impostas e as possibilidades que o futuro voltou a abrir levam-me a acreditar, hoje, que os escritórios não vão morrer. Porque não podem. E se assim for, será um desastre.
Os escritórios podem coexistir com o teletrabalho num modelo híbrido que exige espaços de trabalho fora do território doméstico. É mais saudável em todas as vertentes – bem-estar físico e psicológico, equilíbrio familiar, satisfação pessoal e profissional – com evidentes impactos em termos de criatividade e de produtividade.
Estamos agora a repensar a qualidade dos espaços e dos regimes de trabalho para compor padrões de vidas mais saudáveis e sustentáveis. Ficou claro que precisamos de sair, de contactar, de debater, de romper com o conforto enganador do “escritório-lar”.
Como o arquiteto desenha o futuro sobre o tempo, o território e as circunstâncias, nesta reflexão criativa que a história nos impõe, tentamos encontrar soluções que integrem as necessidades das pessoas, das organizações e do mercado no pós-pandemia.
A construção conceptual já está no terreno, mas o caminho far-se-á de experiências para criação de espaços que ajudam a vencer o medo e a quebrar a insegurança, obstáculos que a pandemia ergueu e que dificultam o regresso ao escritório.
Do frenesim no espaço de escritório dos loucos anos 80 à la Wall Street à explosão dos criativos open spaces na viragem no novo milénio, a verdade é que desde que há escritórios – massificados a partir do final do século XIX – sempre houve um excesso de trabalhadores por metro quadrado.
A equação para vencer o medo do regresso é simples, mas onerosa. Nos escritórios pós-pandemia, teremos mais metros quadrados por trabalhador. A rotação nas idas ao escritório vai ajudar a aumentar este rácio, mas terá de ser complementada com outro tipo de abordagem.
Em Portugal, sem tradição de construção em altura, vamos deitar os arranha-céus, vamos construir horizontalmente e os escritórios vão estender-se pelo terreno exterior: serão “skyspaces”. Estes “arranha-céus deitados” terão ambientes abertos, com espaços de trabalho simples, luminosos, que se alongam para o exterior. O espaço enclausurado morreu!
Os novos hábitos de trabalho criados pela pandemia levam-me a perguntar porque deveremos trabalhar apenas dentro do escritório sentados à secretária? Imagino agora um gestor a fechar contas deitado no jardim da empresa e reuniões de trabalho num terraço ou na varanda.
Os novos espaços reconfigurados lançam-se do open space para os “open-green-spaces”. E este exterior, mais natural, aumenta os metros quadrados por trabalhador e introduz o elemento de confiança na hora do regresso ao escritório. A diluição entre o interior e o exterior veio para ficar.
Com as suas características naturais, Portugal pode liderar um boom de procura de multinacionais por espaços de escritórios, à semelhança do que tem acontecido nos últimos cinco anos por parte das tecnológicas. Cidades como Lisboa e o Porto – e regiões como o Algarve – têm tudo para se afirmarem perante cidades como Frankfurt, Paris, Nova Iorque ou Londres: é muito mais saudável, seguro e sustentável ter um escritório com muitos dias de sol, perto do rio ou da praia, do que no centro de Londres ou Nova Iorque.
Queremos criar um ambiente de bem-estar e de conforto, trazendo a natureza para dentro do local de trabalho, criando um contexto de segurança ao trabalhador na hora do regresso. Vamos deitar os arranha-céus.