No momento em que escrevo (3 de fevereiro de 2021), há em Portugal 179.180 casos ativos da Covid-19, dos quais 6.869 estão em regime de internamento hospitalar, com 865 nas UCI.
Isto significa que a grande maioria dos portugueses que contraíram Covid-19 (cerca de 95%) estão em casa, de quarentena se estiverem assintomáticos, ou com recomendações de higiene e tratamento sintomático se tiverem apenas sintomas gripais ligeiros.
A frente da “guerra ao Corona” tem-se desenrolado na contenção do número de novos casos através do confinamento, higiene e máscaras e no tratamento hospitalar dos casos graves.
Por motivos que neste momento ainda não são claros, Portugal tem somado derrotas nesta frente, ultrapassando em número de casos e fatalidades os países que apenas fizeram recomendações voluntárias à população, como a Suécia e alguns estados dos EUA. Também, a “covidização” do SNS tem provocado mortes não-Covid desnecessárias, levando-nos a pensar se “a cura não terá sido pior do que a doença”.
Nesta fase, eu gostaria de chamar a atenção para o “relativo abandono” dos 95% de casos confirmados de Covid-19, que ficam, por assim dizer, “entregues à sua sorte”, ou melhorando espontaneamente, ou vendo o seu estado agravar-se até se verem obrigados a recorrer aos “covidários”, quiçá numa fase muito mais complicada da doença.
Ora, as mais recentes recomendações que nos chegam dos EUA, forçam-nos a repensar a abordagem clínica deste grupo de doentes, tentando evitar que necessitem de internamento; uma vez que “O TRATAMENTO EM AMBULATÓRIO REDUZ AS HOSPITALIZAÇÕES E AS MORTES” (desculpem-me as maiúsculas).
Essas recomendações, que podem consultar neste artigo do “American Journal of Medicine online, resumem-se ao seguinte:
- Reduzir a reinoculação;
- Terapêutica antiviral;
- Imunomodelação;
- Anticoagulação;
- Monitorização.
A reinoculação ocorre quando a pessoa infetada inspira o ar que acabou de expirar carregado de matéria viral sob a forma de aerossóis, um processo que pode agravar a Covid-19 ou qualquer outra infeção respiratória.
Os autores recomendam o arejamento das divisões da casa e períodos em espaços abertos, isolados de outras pessoas, sem máscara para evitar a reinoculação.
As restantes medidas devem ser prescritas e monitorizadas pelo médico assistente, mas a boa notícia é que não há que ficar à espera de um possível agravamento. O tratamento precoce é uma realidade, é eficaz e é recomendado por pessoas com autoridade para o fazerem.
Em Portugal, devido aos constrangimentos de um SNS anquilosado e manietado politicamente, é muito importante dedicarmos mais atenção e recursos às dezenas de milhar de casos ativos de Covid-19, apesar da sintomatologia ligeira, para não estoirar com os serviços hospitalares. Não chega o acompanhamento (muitas vezes excelente) da Saúde 24, é necessária uma intervenção proativa, com todos os recursos medicamentosos disponíveis.
A Covid-19 acabou com a igualdade de acesso à saúde, que a Constituição garante e criou “filhos, enteados e bastardos”.
Os “filhos” são os doentes de Covid-19 que necessitam de hospitalização e para quem o SNS se voltou a 100%.
Os “enteados” são os doentes de Covid-19 com sintomas ligeiros, mais ou menos abandonados ao seu destino, sem possibilidade de beneficiarem de um eficaz tratamento precoce que diminua o afluxo aos hospitais e às UCI.
Os “bastardos” são todos os doentes não-Covid-19, para quem as portas do SNS se fecharam e que têm pago com a vida a reconhecida desorganização instalada.
É fundamental acabar com esta situação miserável, elevando o nível de cuidados dos enteados e reabrindo as portas aos bastardos, com a colaboração dos sectores social e privado.
Não o fazer é uma ignomínia que ficará para sempre a manchar, como nunca, este nosso período da história portuguesa.
Haja saúde!