No passado dia 5 de março, a CNN noticiou que 70% dos estudantes da Universidade de Coimbra pretendem emigrar. Das quase 1400 respostas que a Associação Académica de Coimbra (AAC) obteve no seu questionário, cerca de 40% dos inquiridos confirmam a intenção de emigrar nos próximos 5 anos e 30% no próximo decénio. Os números são alarmantes e exigem uma reflexão profunda e atual: se estudámos, porquê emigrar?

Desde que ingressamos no ensino que nos é ensinado que a melhor forma de ativar a alavanca social, vulgo meritocracia, é através do ensino, nomeadamente o superior. Da quando somos crianças, que nas questões normais e sem intenção de ofensa se pergunta, “Mas então, o que queres ser?”. Prontamente, quase que por instinto, sai “Médico”, ou “Advogado”. Nas últimas décadas, com o advento do futebol e, ainda mais atualmente com o advento das novas tecnologias, que as palavras “Influencer/Youtuber” ou “Jogador de Futebol” têm se feito presentes. Raras são as vezes em que ouvimos “Agricultor”, “Professor”, “Geólogo”, entre tantas outras.

Com o crescimento e o desenvolvimento das capacidades intelectuais (racionais e empíricas), com maior ou menor velocidade vão-se definindo os gostos e aspirações dos novos jovens. Neste ponto, entra um fator poucas vezes mencionado, mas fulcral: a influência da sociedade. Os pais, avós, tios, amigos, enfim o rol de conexões diárias tende a influenciar o jovem a procurar o ensino superior. Contudo, esta procura ao ensino superior não é apenas de ingressar no ensino superior: é tornar-se um médico, um juiz, advogado, engenheiro e, quiçá, professor. Quando é manifestada uma nova intenção, prontamente vem a resposta “e o que fazes com isso?”, “o que queres fazer da vida?”.

Ora Portugal, com uma população de cerca de 10 milhões de habitantes e uma economia variada e multissetorial (ainda que com os problemas da terciarização, etc.), não tem capacidade para formar tantos advogados, engenheiros, juízes, ou até médicos (podendo explicar-se o problema da falta destes noutras crónicas). O tecido social português não necessita de quantidades astronómicas de novos advogados/juristas, ou médicos (só no ano de 2023, 300 novos médicos fizeram o Juramento de Hipócrates, só em Coimbra). Ainda que exista uma necessidade no interior, os incentivos não são suficientes para levar à espacialização e distribuição desta nova força laboral.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O problema resulta da própria organização do ensino superior português e, subsequentemente, do ensino obrigatório. Infelizmente, em Portugal as Universidades não possuem um fator de impacto e de adaptação regional. O fim último das universidades é prover ao tecido empresarial (e social) a mão de obra qualificada necessária, para contribuir para o desenvolvimento económico do país. Não faz sentido existirem, só no ano de 2022/23, 2399 novos alunos a cursar Direito nas universidades portuguesas (segundo os dados da Direção Geral das Estatísticas). Em contrapartida, cursos técnicos, com impacto regional possuem vagas menores e, muitas vezes, menor alocação de fundos.

Se o problema é a falta de distribuição dos alunos nos diferentes cursos (que, por si só, aumentaria a qualidade dos estudantes – sendo, contudo, necessário implementar medidas de justiça entre público e privado), porque os estudantes emigram? Ora, quanto maior for a oferta para uma demanda pouco variável, menor será o valor destes novos profissionais. Quantos mais licenciados e mestrados possuirmos em áreas específicas que não possuem visão de crescimento elevado, menor será o valor que estes novos profissionais obterão (levando a que muitos licenciados estejam em supermercados). A solução, portanto, consiste em reduzir a oferta, por forma a regulá-la ao mercado e às necessidades.

Para tal, é imperativo uma nova reforma do ensino superior, atribuindo caraterísticas regionais às universidades, com base nas necessidades locais e regionais. Por exemplo, se na bacia do Ave e na faixa Guimarães-Braga os têxteis são importantes, faz sentido que a UM e a UP possuam cursos de engenharia têxtil. Em contraponto, não faz sentido que estas possuam cursos que pouca oferta de emprego possuam nestas regiões.

Com a racionalização e adaptação das universidades, é possível reduzir os excedentes e a desvalorização dos jovens. O ensino e as necessidades do mercado não são estanques e, portanto, devem estar interligadas.