A pobreza menstrual é, ainda em 2021, um flagelo presente em todo o Mundo. Num estudo de 2020 sobre a perceção de 445 mulheres portuguesas sobre menstruação e higiene menstrual, apresentado na Universidade do Minho, quase 17% afirmaram ter dificuldades na compra de produtos como pensos higiénicos, tampões ou o copo menstrual. Este estudo não foi sequer realizado numa amostra de mulheres de clara carência económica, antes pelo contrário (a maioria era licenciada e residente na zona de Lisboa), o que sugere que o problema é deveras maior.

Em 2019, um relatório apresentado por Marisa Matias e Ernest Urtasun, que foi aprovado pelo Parlamento Europeu, afirmava, com base em dados apresentados no Plan International UK, que uma em cada dez raparigas não conseguia adquirir estes produtos de higiene feminina e que esse problema afetava a participação escolar das mesmas. Mais recentemente, a primeira-ministra da Nova Zelândia Jacinda Ardern afirmou que uma em cada doze alunas não vai há escola por problemas relacionados com a falta de acesso a produtos de higiene feminina. Esta é, aliás, uma conclusão comum em todas estas análises: a pobreza menstrual é não só uma problemática que afeta a higiene, saúde e bem-estar das mulheres como, indiretamente, afeta a sua vida quotidiana.

Se olharmos para outras áreas do globo denotamos que o problema é ainda mais gritante: na África Subsaariana mais de metade das adolescentes e na Índia 70% das mulheres não têm como adquirir produtos de higiene feminina.

Ora, casos como a Escócia e a Nova Zelândia decidiram enfrentar o problema “olhos nos olhos”, tomando medidas “simples” que só a falta de vontade não permite tomar: a Escócia foi o primeiro país a disponibilizar de forma gratuita produtos de higiene íntima em escolas e universidades e na Nova Zelândia, a partir do passado mês de Junho, a disponibilização gratuita destes produtos é também uma realidade.

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Outra das grandes discussões em volta deste tema é o chamado “imposto tampão”, imposto que a União Europeia fixou num mínimo de 5% e que é superior a 20% em dez dos estados-membros da UE, chegando ao máximo de 27% na Hungria. Portugal taxa estes produtos a 6%, sendo que abaixo de si só estão três países: França (5,5%), Chipre (5%) e Irlanda (0%), que já isentava estes produtos antes da UE estabelecer um mínimo. Note-se o exemplo do Reino Unido, que após a saída da UE reduziu o seu imposto de 5% para 0%.

Com todos estes dados as conclusões são muito óbvias: a higiene íntima da mulher não é vista como um bem essencial na maioria dos países, mas como algo secundário, opcional e que, por isso, não requer medidas de proteção por parte dos governos.

É, inequivocamente, tempo de mudar. É tempo de criar políticas ao nível da União Europeia que combatam a pobreza menstrual, transformando desde logo o imposto mínimo de 5% no seu máximo e aconselhando os países a facultar gratuitamente produtos de higiene feminina nas escolas, universidades, farmácias e centros de saúde a famílias carenciadas.

Por cá, é possível desde logo combater a pobreza menstrual ao nível concelhio, promovendo a gratuitidade destes produtos nas escolas e centros de saúde dos municípios por parte das autarquias locais, sem ser necessário esperar por políticas nacionais.

Há muito a ser feito para combater a pobreza menstrual, mas, como em tudo na política, é preciso vontade para o fazer. Que haja essa vontade por parte dos nossos agentes políticos pois, afinal de contas, a pobreza menstrual é – não só, mas também – uma questão de dignidade humana.