A nossa realidade mostra-nos, cada vez com maior crueldade, que vivemos num país do avesso. Num território onde o direito à habitação digna é desafiado pela especulação imobiliária e pela ausência de resposta das instituições que deveriam zelar por este direito – como o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) – muitas são as zonas da Área Metropolitana de Lisboa onde o fenómeno da gentrificação empurra famílias para a periferia, afastando-as, com isso, de oportunidades de trabalho e de serviços essenciais, acentuando ainda mais as desigualdades no acesso à habitação e aos serviços públicos.
Em muitos destes casos, cabe às forças de segurança pública tentar manter a ordem onde amiúde faltam condições de vida básicas — falamos de um lar e até alimentação. E, como se não bastasse este desafio, as forças de segurança enfrentam uma carência crónica de recursos. Os nossos profissionais de segurança trabalham em condições indignas de um país que se diz desenvolvido. Faltam instalações adequadas, viaturas, equipamentos informáticos e até… economato. Quando estas necessidades básicas não são atendidas, quem acaba por tentar responder são os autarcas, que se desmultiplicam em ações, mesmo quando essa responsabilidade não lhes compete diretamente pela lei, mas se impõe pela necessidade de defender a sua população e a dignidade do Estado de Direito.
No concelho da Moita estamos há mais de quatro meses à espera de que o Ministério da Administração Interna aprove a revisão do projeto do Posto Territorial da GNR local, uma necessidade urgente. A recente mudança de governo não pode, nem deve, servir de desculpa para mais atrasos neste processo. E que dizer do IHRU, que há mais de um ano recusa ceder sete das muitas casas desocupadas que possui no concelho da Moita, casas estas que poderiam fazer a diferença na vida de tantas famílias? Além disso, aguardamos uma resposta para a candidatura da autarquia para a construção de 44 habitações, cuja ausência tem impacto direto nas condições de vida de várias pessoas.
A Margem Sul e a Península de Setúbal representam, para o país, um território de oportunidades e de crescimento. Mas, para rompermos com este ciclo de estagnação, é preciso coragem e ação. Esta é a hora de abandonar a burocracia de secretaria e de tomar medidas concretas, que resolvam os problemas estruturais desta Área Metropolitana e que garantam a todos os seus habitantes condições de vida justas, dignas e inclusivas.
Queremos uma área metropolitana funcional, com um sistema de transportes públicos integrado e eficiente, projeto como TTT, Metro Sul do Tejo e o terminal fluvial da Moita. Queremos travessias há muito anunciadas, prometidas a cada novo governo, mas que permanecem inoperantes. Queremos que seja desta vez. As pessoas já não podem esperar mais.
Não queremos mais vítimas, entre polícias e população, causadas pela falta de coragem dos decisores políticos para enfrentar estes desafios de forma séria e determinada. Pretendemos resolver os problemas estruturais da península de Setúbal, os mesmos que, segundo dados da Direção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência, impedem que as qualificações dos pais se traduzam numa melhoria significativa nas oportunidades de vida dos filhos. É um fardo demasiado pesado para as nossas famílias, comprometendo o acesso à educação e o elevador social.
Ambicionamos, de forma clara e inequívoca, uma Área Metropolitana que funcione como deveria: uma região de todos, para todos.