Sempre que nos deparamos com um ato eleitoral somos confrontados com uma realidade que preocupa tanto os interessados na matéria, como os descontentes com o cenário político contemporâneo – as elevadas taxas de abstenção. Mas quais serão as causas para o crescimento desta ocorrência?

Desde 1975, quando os portugueses foram chamados para decidir o rumo que o país deveria levar após a queda do Estado Novo, o interesse dos cidadãos na política tem visto uma queda abrupta, passando duma participação de 91,5% à atual taxa de 51,4% (legislativas 2022). Não é de admirar que o interesse dos portugueses na política tenha diminuído quando o termo de comparação é o ato eleitoral que solidificou a nossa democracia, mas a realidade é que nos últimos anos, os cidadãos têm dado cada vez menos importância a este tema e mais a distrações como o futebol (algo que não me incomoda particularmente, dado o meu afeto pelo desporto).

Dentro destes abstencionistas, sabemos que a faixa etária com mais presença é a composta por jovens dos 18 aos 30 anos. Mas por que razão a maioria de nós não quer saber de quem nos governa? Será sintoma de uma preguiça geracional que se abate sobre nós e nos impede de procurar mais sobre o assunto ou é mesmo falta de maturidade da nova “geração Z”?

Sendo eu um jovem de 19 anos, considero que são vários os problemas que nos afastam, não sendo nenhum deles passível de culpabilização dos jovens.

Primeiramente, nos dias de hoje, todos nós crescemos a ouvir que “os políticos são corruptos”, que “não servem os cidadãos” e ainda que “só querem tachos”. Ora, longe de corroborar esta ideia exagerada e desviada da realidade, é um facto que cada vez é mais banal a erupção de escândalos nos mais altos cargos da política nacional, algo que cobre todo o espetro, sem discriminação, da esquerda mais “humanitária” à direita mais “defensora da liberdade”. Isto leva-nos a uma desacreditação crescente nos órgãos de governação.

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Além disso, poucos são os partidos que apelam aos mais novos, nomeadamente no que toca à forma de alcançar este público. Como sabemos, os media tradicionais são cada vez menos requisitados pelos que já nasceram na era da YouTube e do Facebook. Daí, seria de esperar uma maior presença dos principais partidos nas redes sociais. A realidade é que são poucos os que o fazem. Posto isto, existe uma perigosamente ténue divisão entre o que é conteúdo de entretenimento e o que é informação. Isto leva a que os jovens estejam cada vez mais radicalizados, já que os seus influencers favoritos seguem involuntariamente um estilo de vida padronizado que aponta para determinados campos políticos, convidando para as suas páginas e canais aqueles que bem entenderem (e, naturalmente, aqueles com quem se identificam). Este é um fator particularmente assustador na época em que vivemos, onde grande parte das pessoas assume uma postura de idolatria relativamente a certos indivíduos que se limitam a mostrar as melhores partes das suas vidas e que auferem rendimentos bastante acima da média do cidadão português comum. Se olharmos para as sondagens, verificamos que existe uma grande disparidade nas intenções de voto entre os jovens e os menos jovens. Devem então os partidos apostar neste tipo de presença? Tendo em conta que já há quem o faça, ditam as regras da política que quem não quer ficar para trás, não se pode dar ao luxo de não aproveitar quaisquer que sejam as oportunidades, mesmo que não sejam as melhores para transmitir uma mensagem fundamentada e coerente.

Ademais, não nos podemos esquecer que, segundo o Eurostat, em 2021 o português saiu de casa do agregado familiar (em média) apenas aos 33,6 anos. Este adiar devido à degradação do poder de compra (aliado à exorbitante subida de preços no mercado imobiliário) leva, naturalmente, a que os jovens não vejam de forma tão direta o impacto que os órgãos governativos causam nas suas vidas, uma vez que acabam por estar sempre apoiados pela família. O contrário é observado em países como a Finlândia, onde os jovens saem de casa em média aos 21,3 anos e a taxa de abstenção mais recente (referente às eleições legislativas de 2023) foi inferior a 20%.

Há muitos outros motivos que nos afastam do envolvimento no assunto, como é o caso da falta de representatividade da faixa etária, da falta de literacia financeira ou da “clubização” da política. Pode-se ainda culpar a comunicação social pela cobertura desproporcional que faz entre partidos, pela relevância excessiva que dá a temas pouco importantes (roubando assim espaço e tempo de antena aos que realmente impactam a sociedade de forma estrutural) ou até pelos escassos momentos em que opõe candidatos eleitorais em debates quase inúteis de 30 minutos onde estes se limitam a usar chavões por não terem tempo (ou vontade) de discutir ideias de forma séria.

Desta forma, a realidade é que podem ser vistas como intrínsecas as razões para esta falta de interesse dos jovens, dada a sua continuidade e crescimento. Desde há muito que se tenta contrariar a abstenção através de campanhas que acabam por viralizar, contudo, ao que parece, não têm surtido o efeito desejado. Assim, podemos ficar a remoer sobre como vamos contrariar esta tendência, mas talvez seja melhor deixar este problema para outros, já que os partidos de hoje não se parecem importar com o assunto.