Portugal é um país envelhecido, como consequência da baixa natalidade e da elevada emigração jovem. A maioria dos reformados e pensionistas encontra-se completamente dependente do atual sistema de Segurança Social, detendo como único rendimento a pensão de velhice que aufere. Mas, para além desta pensão não lhe permitir envelhecer com a dignidade merecida, também não faz jus ao trabalho que realizou em prol do país ao longo da sua vida ativa.

Chegamos então ao diagnóstico primário do atual modelo de segurança social. É um modelo insustentável e incomportável, que não beneficia ninguém. Os trabalhadores suportam custos demasiado elevados e que dificilmente terão retorno. Os empregadores não têm incentivos à contratação ou ao aumento de salários dos trabalhadores pelos custos que suportam com cada um. Os pensionistas e reformados recebem pensões baixas e que não são dignas. E, aos jovens não lhes é permitido contribuir com menos e investir e poupar para a sua pensão de velhice onde julguem ser mais rentável. Resumindo, o atual modelo não serve quem trabalha, nem serve quem outrora já trabalhou.

É urgente, necessário e desejável proceder a uma reforma profunda do atual modelo de segurança social, que não passa apenas pela componente das contribuições e financiamento de pensões de velhice, vulgo reforma, mas que será sobre o que se versará neste artigo.

Para inverter esta tendência de contribuição para caixa vazia, em que grande parte das contribuições ficam sem retorno, e assegurar o futuro, é necessário que esta reforma tenha em vista um alinhamento entre os rendimentos no envelhecimento e as contribuições e capitalizações durante a vida ativa.

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O modelo contributivo atual da Segurança Social é dividido em diversas taxas contributivas, que variam em função do tipo de atividade e do vínculo laboral, calculado sobre o valor do rendimento mensal bruto do trabalhador, pelo que um primeiro passo lógico seria o estabelecimento de uma taxa contributiva única, transversal a todos os trabalhadores, independentemente do vínculo laboral ou do tipo de atividade desenvolvida.

Atualmente, um trabalhador por conta de outrem em geral está sujeito a uma taxa contributiva geral de 34,75%, mas um membro da igreja, associações e confissões religiosas (com proteção na doença, parentalidade, doenças profissionais, invalidez, velhice e morte) já está sujeito a uma taxa contributiva geral de 28,30%. Por sua vez, um trabalhador por conta própria, considerado “trabalhador em geral”, está sujeito a uma taxa contributiva de 21,4%, mas sendo um “empresário em nome individual” esta taxa contributiva altera, novamente, para 25,2%.

Logicamente, não estamos em condições de assegurar uma transição absoluta e imediata para um sistema de capitalização de contribuições, em que a Segurança Social não detenha o monopólio da proteção social e seria apenas um de entre outros sistemas de proteção, ou sequer para um modelo de capitalizações, em que cada trabalhador escolhe um determinado veículo de poupança para a reforma, capitalizando as suas contribuições e beneficiando da estratégia de risco ajustadas à rentabilidade do produto escolhido, dado o elevado número de portugueses que auferem pensões e se encontram completamente dependentes do atual sistema de Segurança Social.

A reforma possível, no imediato e enquanto modelo transitório, seria passar do modelo atual para um modelo de contribuições misto, com uma vertente de contribuição obrigatória e outra de contribuição facultativa para o mesmo sistema, mas de investimento ou capitalização obrigatória. Um modelo de contribuições misto permitiria preservar o presente, garantindo que os atuais pensionistas e reformados não fiquem desprovidos dos seus rendimentos, enquanto se assegura o futuro, desonerando os jovens do pagamento de contribuições tão elevadas e permitindo que capitalizem ou invistam na sua pensão futura, contribuindo para um envelhecimento digno.

O cálculo destas duas vertentes de contribuição seria calculado sobre o valor do rendimento mensal bruto do trabalhador, aplicando a taxa contributiva para a segurança social aplicável. O resultado dessa, seria dividido em duas vertentes: uma de contribuição obrigatória, fixada, por exemplo, em 65% (considerando o peso relativo da despesa da Segurança Social alocado às pensões de velhice), e os restantes 35% ficariam na vertente da contribuição facultativa, em que cabe ao trabalhador decidir como rentabilizar esse montante, contribuindo também para o sistema de Segurança Social, canalizando para a constituição de um PPR, ou algum sistema equivalente ao ISA do Reino Unido ou ao Roth IRA Americano.

Em termos práticos: um trabalhador geral que aufira um rendimento mensal bruto de 1500 euros, origina uma contribuição total de 521,25€ mensais (à taxa de 11%, descontando diretamente 165€; à taxa de 23,75%, a cargo da entidade empregadora 356,25€). Com este modelo misto, passaria a descontar apenas 338,81€. É uma redução da contribuição obrigatória de 182,44€ mensais.

Uma outra nota relevante reside na diferença entre a contribuição para a Segurança Social evidenciada no recibo de vencimento do trabalhador por conta de outrem e a contribuição efetivamente entregue em seu nome, que engloba também a suportada pela entidade empregadora. Uma alteração necessária, defendida aliás pela Iniciativa Liberal no último Programa Eleitoral às Eleições Legislativas de 2024, e que permita ao trabalhador um conhecimento mais transparente das suas contribuições efetivas pelo seu recibo de vencimento.

Mas poderíamos ir ainda mais longe, estabelecendo dentro da vertente de contribuição obrigatória um montante máximo de contribuição. Isto é, dentro da vertente da contribuição obrigatória, o trabalhador só contribui, mensalmente, até um determinado montante. O excedente englobará a vertente de contribuição facultativa, permitindo, mais uma vez, ao trabalhador optar. É, em certa medida, o que já acontece com os trabalhadores por conta própria, que ao calcularem o montante de contribuição para a segurança social trimestralmente conseguem adaptar a contribuição, optando por contribuir menos ou mais.

A principal diferença prende-se com os impactos na pensão, que no modelo atual seriam negativos, prejudicando os que contribuem menos no cálculo da pensão de velhice, por auferirem rendimentos mais baixos. Por sua vez, os que contribuem mais, por auferirem rendimentos mais elevados, também não ficam beneficiados, dado o atual modelo não permite um cálculo da pensão de velhice que acompanhe efetivamente as contribuições ao longo da vida ativa.

A reforma da segurança social, tão necessária e tão urgente, não se fica por aqui, tem de ser transversal, profunda e compatibilizada com uma reforma fiscal séria e arrojada. Este é apenas um primeiro passo para preservar o presente, mas principalmente para assegurar o futuro.