O sistema de reformas da Segurança Social (SS) funciona de forma que quando um indivíduo ingressa no mercado de trabalho e começa a descontar para a SS, o seu dinheiro é utilizado para pagar as pensões dos atuais reformados. Por sua vez, quando esse indivíduo atinge a idade da reforma, a sua pensão será financiada pelas contribuições dos trabalhadores em atividade, perpetuando assim um ciclo contínuo entre gerações. Isto significa que este sistema depende da entrada de novos participantes/contribuintes.
Um esquema Ponzi, por sua vez, é um tipo de fraude financeira em que os retornos prometidos a quem lá coloca dinheiro são pagos com o dinheiro dos novos investidores. Este sistema colapsa quando não há novos investimentos suficientes para pagar os retornos prometidos – Ora, não é exatamente assim que a SS opera?
A verdade é que o sistema de reformas da SS não é sustentável a longo prazo. Nos próximos anos vamos ter grande parte da população a reformar-se e, sendo a nossa pirâmide etária de base invertida (mais idosos do que jovens), as contribuições dos trabalhadores não serão suficientes para pagar as reformas. E é precisamente aqui que surgirá um grave problema para as pessoas que contribuíram uma vida inteira.
Para agravar o problema a esperança média de vida tem vindo a aumentar, ou seja, o Estado não só terá de pagar mais reformas como pagará durante mais tempo – um cenário que coloca o sistema sob enorme pressão.
Não há alternativas viáveis e o Estado, inevitavelmente, terá de alterar as regras do jogo para manter ativo este sistema de reformas insustentável. Para isso, terá de aumentar os impostos, elevar as contribuições para a SS, adiar a idade da reforma, reduzir as pensões e/ou, como tem ocorrido, abrir desreguladamente as portas à imigração, na esperança de que os imigrantes contribuam rapidamente para o sistema, sem considerar e planear adequadamente a sua integração – o que pode também piorar a situação porque estes podem vir a tornar-se, não numa forma de contribuição, mas num encargo para o Estado (para todos nós).
O Estado acredita que poderá compensar a SS em caso de défice, mas esta solução é ingénua e só serve para tapar buracos. Esse dinheiro, retirado do Orçamento de Estado para cobrir a Segurança Social, poderia ser utilizado para estimular a economia ou para cobrir as despesas correntes.
Um dos grandes problemas do Estado Português é a falta de visão a longo prazo, o que resulta numa gestão reativa e pouco eficiente. Em vez de se planearem e executarem soluções sólidas e estruturadas, assistimos constantemente a políticas públicas que mais parecem paliativos temporários, desenhadas para apagar fogos. Esta falta de visão estratégica e organização leva a que as decisões sejam tomadas com base em urgências imediatas, adiando o inevitável e comprometendo o futuro das gerações seguintes, como acontece com o problema das reformas da SS. Quando chegar a vez da minha geração, a bolha já terá rebentado.
Acredito que a melhor solução para pôr fim a este modelo insustentável é a implementação de um modelo de capitalização híbrido obrigatório. Neste modelo, as contribuições continuariam a ser feitas para a Segurança Social, mas esta investiria o dinheiro no mercado, com o apoio de entidades privadas especializadas em fundos de pensões. O Estado manteria o controlo e a transparência da gestão dos investimentos através de um departamento especializado na SS.
Uma vez que os contribuintes atingissem a idade da reforma, receberiam um rendimento mensal baseado nos retornos dos investimentos. O Complemento Solidário para Idosos seria mantido, assegurando uma rede de segurança para aqueles que não conseguissem um rendimento suficiente. No entanto, acredito que este subsídio seria menos necessário, pois o novo modelo poderia aumentar significativamente as pensões através dos juros compostos de múltiplos contribuintes e da tendência crescente do mercado a longo prazo.
Quando os juros compostos são aplicados a um fundo coletivo, para o qual milhões de pessoas contribuem, o crescimento do fundo ao longo do tempo é exponencial, dado que as contribuições de todos os indivíduos se somam e os juros são calculados sobre um montante muito maior do que seriam se cada um investisse isoladamente.
Importa destacar que este modelo de capitalização híbrido não deve configurar o fim das contribuições das entidades empregadoras para a Segurança Social (TSU), como ocorre em alguns sistemas de capitalização.
No que diz respeito à natureza dos investimentos a serem realizados pela SS, estes teriam de ser diversificados e sujeitos a uma regulação rigorosa, de modo a garantir a estabilidade e a transparência do sistema de pensões.
As vantagens deste modelo são diversas. Não só aliviaria os encargos do Estado com a SS, isto porque deixaria de cobrir os déficits sistemáticos que se avizinham da SS, mas também, como dito, através do efeito dos juros compostos, poderia constituir uma solução viável para aumentar o valor das pensões de reforma. E, deste modo, deixaríamos de estar sujeitos à grande falha deste Esquema Ponzi atual: a demografia.
É certo que existem mais caminhos possíveis, mas uma coisa é certa: o modelo atual de reformas da SS é insustentável e não existe coragem dos nossos políticos em enfrentar e abordar um tema como este que apenas tem um único fim: o colapso do sistema da SS.
Alguns leitores podem questionar se este sistema é idêntico ao problemático sistema chileno. A minha resposta é não. Enquanto no Chile os contribuintes tinham de recorrer diretamente aos fundos privados de forma individualizada (sistema privado), aqui o próprio Estado criaria um fundo, ou um fundo de fundos, e investiria as nossas poupanças (sistema público). Além disso, no sistema chileno, os empregadores não são obrigados a contribuir para as reformas dos seus trabalhadores, o que faz com que as contribuições não sejam suficientes para gerar pensões satisfatórias, mesmo que os retornos dos investimentos ajudem a aumentar os montantes acumulados.
Analisando ainda o sistema bem-sucedido da Noruega, é essencial compreender algumas características chave antes de fazer quaisquer comparações. O modelo de pensões norueguês baseia-se na combinação de dois pilares: um de repartição e outro de capitalização, sendo este último amplamente financiado pelos recursos naturais do país, nomeadamente o petróleo. O sistema foi concebido de forma que, em caso de insustentabilidade no pilar de repartição, o pilar de capitalização, sustentado por montantes astronómicos provenientes do petróleo, possa compensar as lacunas e criar a ilusão de que não há problemas de sustentabilidade no pilar de repartição. Para dar uma ideia da dimensão dos valores envolvidos, a Noruega possui pelo menos 1,6 triliões de euros neste fundo. Assim, o que torna este modelo um sucesso não é a sustentabilidade do pilar de repartição, que já se provou impossível de alcançar, mas sim a robustez do pilar de capitalização.
Para terminar, deixo a conclusão de um estudo da União Europeia (ageing report 2024), que afirma que, em 2050, as reformas em Portugal vão corresponder a apenas 38.5% do último salário dos trabalhadores, uma redução significativa em comparação com os 69,4% registados em 2022.