Declaração de interesses: O Prof Augusto Santos Silva, que conheço há longos anos e com quem partilhei uma grande proximidade geográfica de residência familiar, sendo Ministro convidou-me para Secretário-Geral do MNE, apesar de não desconhecer as notórias diferenças de posicionamento ideológico que nos separam e que, como não podia deixar de ser, deixei bem claras no discurso público que fiz na minha tomada de posse. A meu ver aquela desvalorização das diferenças ideológicas só o enobrece. Durante anos tive com o então Ministro uma relação profissional de total abertura e franqueza, nunca me coibindo de aconselhar, criticar ou elogiar nos devidos termos o que me parecia ser especialmente importante ou dever merecer particular oposição ou concordância. Nunca tal criou qualquer dificuldade nem impediu o são desenvolvimento de uma relação pessoal de progressiva amizade.

Feita esta introdução, confesso, até pela inteligência que lhe reconheço, que vi com pasmo uma declaração do Prof Augusto Santos Silva, feita na sua página de Facebook, que só posso explicar pela leviandade deste tempo de férias em que nos encontramos. A menos que reflita uma visão do Partido Socialista que muito me preocuparia e na qual me quero recusar a acreditar.

Diz o Prof. Augusto Santos Silva que “a CAP decidiu apelar, nas eleições legislativas de 2022, ao voto contra o PS”.

Ora, a CAP não apelou, per se, ao voto contra o PS em 2022, a CAP manifestou publicamente total oposição às políticas do PAN – partido radicalmente anti agricultura, que coloca no mesmo plano ético a luta contra a escravatura, contra o racismo ou a defesa da igualdade entre homens e mulheres com a defesa da sua visão dos animais – e apelou a que ninguém nelas votasse nem em quem estivesse disponível para coligações com o PAN.  O PS decidiu então aceitar o apoio do PAN e a CAP logicamente apelou a que, especificamente por isso, não se votasse no PS. Relembro, aliás, que a CAP, já sob minha presidência, criticou publicamente pelas mesmas razões o PSD, pela sua ligação com o PAN na Madeira. A CAP não muda nas suas posições de fundo em função de lógicas partidárias, são os partidos que as vão mudando.

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Diz também o Prof. Augusto Santos Silva que, dando a entender subliminarmente ter existido uma recompensa por ter apelado ao voto contra o PS, “depois, Oliveira e Sousa, candidatou-se a deputado, nas listas da AD”. Ora, Eduardo Oliveira e Sousa é Agricultor de toda a vida, de mérito reconhecido tanto em Portugal como no Brasil, profundo conhecedor da agricultura portuguesa e em especial da do Ribatejo e do Alentejo, antigo diretor do Ministério da Agricultura, com provas dadas também em associações de agricultores. Terminadas as suas funções como Presidente da CAP aceitou integrar, sublinho como independente, as listas da AD, convencido, como a larguíssima maioria dos portugueses, que era importante o contributo de todos para a necessária viragem do ciclo político, inesperadamente interrompido.

Vale a pena relembrar que Eduardo Oliveira e Sousa, pela sua coragem e frontalidade, mas sobretudo pelo prestígio adquirido junto dos agricultores e produtores florestais, foi durante a campanha eleitoral vituperado repetidamente por comentadores políticos mais ou menos próximos do anterior governo e por uma conhecida correligionária do Prof. Augusto Santos Silva por palavras que nunca proferiu e ideias que não defendeu, apesar de serem públicas as suas intervenções;

O Prof. Augusto Santos Silva conclui a sua publicação referindo que Eduardo Oliveira e Sousa “acaba de ser nomeado presidente do Conselho de Administração da Companhia das Lezírias”, o que é factualmente correto, mas, mais importante e sobretudo mais preocupante, acrescenta que esta nomeação é “a história da nossa iniciativa privada: reclamar contra o Estado, exigir-lhe proteções e subsídios, e acabar logo que possível na tranquilidade e sossego… da gestão pública”.

Os factos têm que contar para alguma coisa, por isso há que repô-los sem hesitação e com frontalidade, sob pena de as narrativas criadas com objetivos políticos se cristalizarem como verdade. Passo a explicitar: o Governo atual entendeu agora, terminado o mandato da anterior administração da Companhia das Lezírias, convidar Eduardo Oliveira e Sousa a deixar o mandato de deputado para assumir a presidência desta Companhia. Não consigo pensar em alguém mais comprovadamente qualificado para a função ou que menos precisasse da mesma. E este é justamente o ponto que me preocupa: qual é a visão do Prof Augusto Santos Silva para as empresas públicas? Admitindo que não defenda a sua extinção, não devem elas ser dirigidas pelos mais competentes, procurando-se justamente na sociedade civil pessoas com as melhores provas dadas e que aceitem disponibilizar o seu tempo? Ou deveriam antes ficar reservadas a rapazes e raparigas militantes dos partidos, de preferência pessoas que nunca tivessem tido qualquer contacto com a iniciativa privada?

O percurso de Eduardo Oliveira e Sousa fala por si. Os factos falam por si. Contorcer os factos não muda a realidade. E a realidade contraria a narrativa do Prof. Augusto Santos Silva.