Talvez seja este gerúndio a forma verbal que melhor descreve o que está a acontecer na aldeia de Ferraria de S. João, concelho de Penela, distrito de Coimbra. Faz agora um ano que por lá passou o grande incêndio de Pedrogão. Logo na semana seguinte, um grupo de moradores da aldeia meteu mãos à obra para fazer acontecer o futuro, de um modo surpreendente. Eles próprios tinham sido surpreendidos pela maneira como um pequeno bosque de sobreiros se tornou o único aliado dos dois carros de bombeiros que tinham vindo fazer frente às chamas. Entendida a lição dada por estas árvores centenárias, os habitantes iniciaram o projecto de envolver toda a aldeia com um cordão de árvores resistentes ao fogo. Falamos de 12 hectares onde existem 255 parcelas de terreno com 77 proprietários diferentes, dos quais só foi possível localizar 40. Este é apenas mais um retrato desse “outro Portugal” de que tem falado o Presidente da República.

O que mais impressiona neste projecto, que pode ser acompanhado no facebook é a força anímica de três famílias que há alguns anos se mudaram para esta “Aldeia do Xisto”. Esta é, então, a história de como o Pedro e a Sofia, o António e a Maria, o Ricardo e a Catarina conseguiram motivar o Manuel, a Arrelete, a Sandra, a Isabel, o José, a Benilde, a Fátima, a Isilda e os restantes habitantes deste povoado de 40 almas. Esta é a história de um contágio positivo de confiança que envolveu dezenas de pequenos proprietários em mais de 20 pacientes reuniões. Bom seria que não fosse caso único no país! Só assim é possível que, um ano depois da tragédia, haja mais de 400 árvores plantadas, tendo sido removidos os eucaliptos e os pinheiros que bordejavam a aldeia. Estas pessoas sabem que eucaliptos e pinheiros são essenciais para a sustentabilidade da floresta, mas cada árvore no seu lugar. O sonho de um novo futuro foi crescendo com o apoio do Município de Penela, de Associações várias e de uma legião de mais de 500 voluntários vindos de muitas partes que, ao longo deste ano, foram participando num processo de transformação social e intervenção ambiental verdadeiramente exemplares.

Tão diferente é este Portugal real do “reality show” que nos invade através dos media! Esta maneira comunitária e personalizada de lidar com a vida é tão diferente dos maneirismos ideológicos, dos editais sem rosto, dos mega interesses económicos que esquecem as pessoas, das leis que a cidade dita para quem vive no campo. Tão diferente é esta justiça que restaura a realidade daquela que, servindo-se das leis, acusa os pequenos para ilibar a responsabilidade dos grandes. Como é injusto e destrutivo o desprezo com que o “Portugal que interessa” olha para o interior! O nosso grande problema é andar há mais de cem anos a repetir com o Ega: “Lisboa é Portugal (…). O país está todo entre a Arcada e S. Bento!”.

Eis as razões pelas quais vale a pena conhecer o futuro humanizador que está a nascer na Ferraria de S. João. Renasce a vida de árvores e pessoas, que até há um ano se sentiam abandonadas. Fez então todo o sentido celebrar uma Missa de aniversário na qual – sem esquecer os mortos! – se animaram os vivos na confiança de que é possível “fazer novas todas as coisas”. Basta que lancemos a semente à terra com confiança! Aconteceu no Domingo, o dia em que a Vida venceu a morte, ressuscitando!

Padre jesuíta

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