Há notícias de encontros de filantropos com empresários ricos, para lhes dizer, em surdina, que é necessário “praticar a filantropia” com parte dos lucros. Em certas economias emergentes, com setores de rápido crescimento – como são os TI ou TIES-Serviços facilitados pelas Tecnologias de Informação –, criaram-se fortunas e, com elas, surgiram Fundações e Iniciativas Sociais que prestam valiosos serviços aos estratos sociais em necessidade.
Alguns norte-americanos, entre eles Bill Gates e Warren Buffet, deram provas de solidariedade e generosidade. É uma atitude digna, que sempre existiu ao longo da história, praticada em larga escala pela Igreja Católica ao longo de toda a sua existência e em todos os lugares onde tem presença, e que continua a ser importante nos locais em guerra e devastação, com a subnutrição, doenças, sofrimento e mortes.
Uma coisa é apoiar Instituições que praticam filantropia, e a fazem bem, coisa que qualquer um de nós pode e deve fazer; outra, diferente, exigindo forte compromisso e dedicação, é a dos que sem fortuna mas com uma ideia ou domínio de uma técnica especializada, põem mãos à obra para prestar um serviço essencial, e depois vão idealizando e construindo soluções para o mal, com alcance cada vez mais amplo.
Os que nasceram ricos talvez não sejam bons para lançar e gerir iniciativas; mas podem apoiar as que existem a funcionar bem e nos seus projetos de expansão ou diversificação.
Nas iniciativas começadas com o saber e determinação de servir, encontram-se ideias surpreendentes para ultrapassar dificuldades. Estudei algumas por me terem impressionado vivamente. Descrevo uma, com brevidade.
Aravind Eye Care System. Originado em Madurai, Índia, em 1976, pela ação do Dr. Venkataswami (Dr. V), com uma pequena clínica de 11 camas, à qual acrescentou outra de 30 camas, para quem nada podia pagar; a seguir pede um empréstimo bancário e cria o novo Hospital de raiz, onde atende os que pagam (40% do total), bem como os que nada pagam (o restante). Conta hoje com 13 Hospitais e mais de 75 Centros de Consulta Oftalmológica. No último ano deram mais de 4,4 milhões de consultas e fizeram mais de 500.000 operações às cataratas.
As lentes intra-oculares que substituem o cristalino opacizado custavam $200 dólares, importadas dos EUA, quando o custo da ação médica, por cirurgia, seria menos de $30, o que limitaria o número de pacientes necessitados de operação. É quando o Dr. V decide fabricar lentes intra-oculares em Madurai, com a moderna tecnologia, e fá-lo em grandes quantidades, por uma fração ínfima do preço das lentes importadas.
Como as pessoas cegas têm dificuldade de se deslocar ao Hospital, decidem criar os “eye-camps” nas aldeias, convocando o pessoal com problemas de visão. Após o rastreio, os que necessitam de cirurgia são levados ao Hospital Aravind próximo. Em cada ano realizam-se mais de 2.800 “eye-camps”.
Cada médico do Aravind faz em média 2.000 cirurgias às cataratas por ano, quando a média da Índia está nas 220. A pessoa operada acaba por ver bem, estando apta para realizar um trabalho, com o qual ganhar a vida. Esta instituição aceita donativos para poder ampliar o seu raio de ação dentro e fora da Índia, para outros Continentes e Países. Recebeu o 1.º Prémio da Fundação Champalimaud, de 1 milhão de euros, em 2007, seguido do prémio Gates e do prémio Conrad Hilton.
Iniciativas destas são replicáveis em qualquer parte do mundo, são muito bem pensados, para sem faltar a qualidade, se poderem dirigir a grandes grupos. O fator determinante é sempre a pessoa com iniciativa que deteta uma necessidade e se organiza para lhe dar uma resposta, quase insignificante, primeiro, mas que vai crescendo até atingir dimensões impensadas.
Apesar da grande exploração e destruição sofridas pela Índia no colonialismo britânico, a alma indiana continua solidária para com os necessitados. Há naturalmente quem pensa só em si e nos seus… Quando depois da Independência começou a criar-se riqueza e, mais em concreto, após 1991, com a abertura da economia à livre iniciativa, começaram a aparecer quantidades ingentes de Fundações e outras iniciativas. O exemplo mais interessante e volumoso de contribuir para a elevação da Sociedade está no Grupo Tata. A Tata Sons era até há pouco propriedade em 66% de trusts filantrópicos que revertiam os dividendos para o sustento das obras de interesse social: de instrução, de saúde, de artes, etc. Tendo criado o famoso IISc (Indian Institute of Sciences, em Bangallore), o Tata Memorial Hospital, dedicado ao Cancro, em Mumbai, e onde qualquer pessoa é atendida e tratada gratuitamente. E muitas outras iniciativas. Só para dizer que há uma longa tradição filantrópica na Índia.
Delhi, 15 de Outubro de 2019