Escrevo este texto no primeiro dia de aulas à distância para o pré-escolar. Sem entrar aqui no debate sobre até que ponto a extensão da escola remota faz sentido para crianças dos 3 aos 5 anos de idade, partilho uma de milhares de experiências desta estreia, sita em pleno centro de Lisboa, numa família com crianças de 2 e 5 anos de idade, em que pai e mãe trabalham fora de casa.

Na sexta-feira (dia 5), ao fim da tarde, a mãe/encarregada de educação recebe um email da IPSS da filha a informá-la de que era «com muito empenho e entusiasmo» que o pessoal docente vinha preparando o recomeço das aulas «da próxima segunda-feira, dia 8». É quando o primeiro sinal de pânico se instala. Só falta um fim-de-semana, e de confinamento obrigatório, até essa data.

A mensagem prosseguia, alternando aquele tom pretensamente arrebatado com remoques paternalistas, do género: «Como é do V. conhecimento, pelas comunicações dos Conselhos de Ministros [que todos os pais/mães seguem afanosamente, como é por demais sabido], este novo ensino à distância tem de ter características diferentes do ano passado».

Não sabia, pensa a mãe, admoestando-se. Mas depois, lembra-se: como é que podia saber, se o bebé mal fala, e a filha mais velha nunca teve aulas via remota até… dentro em breve. É quando, aos batimentos cardíacos mais acelerados, se junta uma ligeira dor de cabeça, tentando lembrar-se de resquícios do ano letivo passado, que terminou apenas há seis meses, que mais parecem seis anos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Para pais/mães mais incautos, o email prosseguia que «os termos empregues até à exaustão [pelo Governo] são: aulas, horários, disciplinas definidas e docentes absolutamente a tempo inteiro». Certo, diz a mãe para si mesma, já a apoiar-se na bancada da cozinha, dada a brutalidade da informação. Podia jurar que nada disto existia dantes no pré-escolar, quanto mais em pandemia…!

E conclui: «Não se trata de, via remota, dar temas que os pais tenham de acompanhar, mas de verdadeiras aulas, que deixem os pais livres para fazer os seus trabalhos». Ah… dessa forma, tudo bem! Ironiza agora esta progenitora, já sem pinga de ingenuidade. Porque então, tudo se limita a fazer a quadratura do círculo, de trabalhar fora e autonomizar uma criança de 5 anos em tele-escola.

Como dizia um banqueiro da nossa praça, a propósito de o povo português não aguentar mais austeridade (2011), «Ai aguenta, aguenta!». Também estas e outras famílias acabam por se adaptar à nova realidade com as respetivas dores, não de crescimento, mas de mudança. Resta saber que consequências terá isto num país em que a Educação está longe de ser a prioridade que devia.