Nos dias que correm são levantadas diversas questões e várias propostas são feitas para responder aos problemas da habitação. No entanto existe um ponto que raramente é falado: porque é que a Mediação Imobiliária em Portugal continua sem regulação adequada?
A atividade de mediação imobiliária em Portugal permanece num limbo regulatório, e a falta de ação dos sucessivos governos nesta área é uma preocupação crescente. Apesar da importância crítica do setor para a economia, que representa cerca de 20% do PIB nacional, e a importância para os consumidores, os desafios para uma regulação efetiva persistem ao longo dos anos.
Façamos uma reflexão sobre a situação atual em Portugal. Nos primeiros cinco meses de 2024, 158 empresas de mediação imobiliária encerraram atividade em Portugal, resultando em uma retração de 1,6% no setor, segundo o Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC). No entanto, nos últimos dez anos, assistimos a crescimento significativo de 236% no número de licenças de mediação imobiliária, passando de 2908 em 2013 para 9777 em 2023.
A recente diminuição de empresas no setor é o reflexo de uma concorrência crescente, alimentada por uma legislação desatualizada e complacente, que permite a aquisição de licenças de forma muito permissiva, chegando ao ponto de haver empresas que são formadas por entidades pelo irrisório valor de €500, que inclui €100 para licenciamento, €50 para registo, e uma taxa anual de €265. Estas empresas, muitas vezes, são formadas durante um período de procura alta, fechando porta quando existem flutuações de oferta no mercado.
A solução não é simples. O mercado imobiliário em Portugal é complexo e envolve grandes redes imobiliárias e, até, pequenos consultores independentes, pelo que a regulação tem que ser adaptada para cobrir todos e não deixar ninguém de fora. Regular o setor imobiliário exige uma abordagem que englobe todas essas nuances, o que torna a tarefa desafiadora. A introdução de regulamentações deve considerar a diversidade de atores e interesses, o que frequentemente resulta num impasse na formulação de políticas.
Também é preciso ter em conta que grandes players do mercado imobiliário exercem uma influência significativa sobre as políticas públicas. Essas entidades, frequentemente, resistem a mudanças que possam limitar suas operações ou aumentar os custos. A pressão desses grupos contribui para a falta de avanços na regulação do setor, criando um ambiente onde práticas questionáveis podem proliferar. A ideia parte de utilizar o conhecimento de todos e criar uma abordagem comum ao setor.
Por outro lado, a burocracia e os processos legislativos lentos são obstáculos conhecidos para a implementação de novas regulamentações em Portugal. Mesmo quando existe vontade política para avançar com mudanças, o processo pode ser demorado e complicado, levando a uma paralisia regulatória. Isso resulta numa inércia que impede a resposta rápida às necessidades emergentes do mercado.
Muitos defendem que a autorregulação é uma alternativa viável à intervenção governamental. Associações profissionais como a Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP) podem estabelecer padrões e monitorizar o comportamento do mercado. No entanto, a eficácia dessa abordagem depende da adesão voluntária das empresas do setor e da capacidade das associações de fiscalizar e impor regras, algo que em Portugal não tem sido prática comum para o imobiliário.
A implementação de regulamentações envolve custos significativos, tanto para o governo quanto para as empresas. As pequenas e médias empresas de mediação imobiliária podem enfrentar dificuldades financeiras para cumprir com novas exigências, o que pode prejudicar a sua competitividade.
O setor imobiliário é um pilar da economia portuguesa. Existe o receio de que regulamentação mais rígida possa travar o crescimento, impor barreiras adicionais às transações imobiliárias e limitar a liberdade operacional das empresas. Essa perspetiva leva, muitas vezes, a uma postura governamental cautelosa, que privilegia a manutenção do status quo.
A eficácia das regulamentações é um ponto de debate. Sem uma implementação robusta e mecanismos de fiscalização eficientes, novas regras podem tornar-se meras formalidades. A falta de confiança na capacidade de fiscalização pode levar a questionamentos sobre a necessidade real de novas regulamentações.
A inércia governamental é alimentada por uma combinação de fatores: a complexidade do setor, a influência de grupos de interesse, os custos de implementação e as preocupações económicas. Essa falta de ação mantém o mercado num estado de indefinição, onde a ausência de regulação permite a perpetuação de práticas pouco transparentes e prejudiciais. Enquanto isso, consumidores e profissionais do setor continuam a enfrentar um ambiente onde a confiança é constantemente desafiada. A ausência de regulação eficaz pode levar a uma falta de transparência, prejudicando a confiança no mercado imobiliário.
É fundamental que haja um diálogo contínuo entre todas as partes interessadas para encontrar soluções que equilibrem a proteção do consumidor e a viabilidade do setor.
Somente assim será possível construir um mercado imobiliário mais transparente e confiável.