O episódio infeliz e altamente reprovável do abate massivo de animais na Torre Bela da Azambuja – que se tornou viral, como o triste episódio do incêndio no Canil de Santo Tirso – teve uma cobertura mediática exponencialmente maior do que todos os outros temas recentes da atualidade, como sejam os casos do SEF ou de Tancos, ou de outro qualquer em que a temática não sejam animais. Não devemos relativizar a forma como morreram estes animais, nem diminuir a expressão de pública indignação que as mesmas causaram, mas é inquestionável que, na realidade dos nossos dias, o populismo e radicalismo do PAN encontram uma avenida mediática para a propagação do seu discurso demagógico e tão evidentemente ignorante. “Confundir, para condicionar” parece ser o lema do PAN, usando a mesma cassete uma e outra vez, fazendo tábua rasa – por mera crença ideológica – do que já lhe foi explicado por colegas deputados, por associações e por dezenas de especialistas. Esta forma de atuar – extremista e propositadamente enganadora – está no código genético do PAN, que mais não pretende do que sujeitar toda a sociedade aos seus princípios, desrespeitando as liberdades de todos os que não se verguem aos seus ideais.

Esta situação da Torre Bela é lamentável? Claro que é! Verificou-se uma situação de extermínio do seu património cinegético e dos habitats? Sim, é inegável! Supostamente, esta razia prosseguiu fins económicos e ditos “ambientalistas”, tendo em vista a construção de um mega-parque fotovoltaico? Tudo aponta nesse sentido! Postas estas questões, impõe-se a pergunta: o que é que o sucedido tem a ver com o ataque do PAN ao setor da caça? Alguém no seu perfeito juízo acha que o que se passou tem alguma coisa a ver com a caça, tal como ela está regulada em Portugal? O que se passou na Torre Bela não tem enquadramento da Lei de Bases Gerais da Caça, ou em toda a sua regulamentação, e vai frontalmente contra as regras de gestão otimizada e do uso racional dos recursos, conducentes a uma produção sustentada, no respeito pelos princípios da conservação da natureza e dos equilíbrios ecológicos.

Ora, o PAN tem conhecimento de tudo isto, sabe perfeitamente que o caso que agora se tornou viral é um potencial crime, sancionado pela lei existente e, como tal, sujeito a averiguações, a julgamento e a condenações, caso se confirmem as ilegalidades. Mas para o PAN, como o seu discurso e ação têm mostrado vezes sem conta, não interessa a lei que existe. O PAN, é por demais evidente, alimenta-se dos casos graves, das exceções à regra, dos maus exemplos, para trazer ao de cima os seus ideais autoritários. O que tem sucedido ao longo dos últimos dias revela uma vez mais o PAN a tentar impor as suas crenças e proibir as atividades com as quais não concorda, independentemente das escolhas e da liberdade dos mais de 96% dos eleitores nacionais que não lhe deram o seu voto.

Com toda esta carga de hipocrisia a que assistimos nos últimos dias, tivemos a “cereja no topo do bolo” com um artigo da deputada Inês Sousa Real no jornal Público, um texto que é ignóbil, carregado de preconceitos e que revela uma soberba ignorância. Recorde-se que foi esta mesma deputada que, nos seus tempos de Provedora dos animais da Câmara Municipal de Lisboa, proibiu a campanha publicitária da corrida do burro com o Ferrari, pois previa-se chuva para esse dia e – pasme-se! – o burro poderia passar frio! A mesma deputada que nesse artigo prefere não comentar a razão deste extermínio ter sido muito certamente causado – atente-se na ironia! – sob a égide do negócio da sustentabilidade e da economia verde, onde os poderes económicos que começam agora a ser investigados se viram bastante mais confortáveis sem a presença dos animais após o seu massacre, para que os mesmos não sejam agora um empecilho durante a fase do estudo de impacto ambiental.

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Nesse artigo de opinião, a deputada continua a usar o disco riscado dos maus exemplos para classificar toda a atividade e atinge o seu apogeu ao querer retirar todo o setor da caça dos projetos de conservação da natureza e do fomento da biodiversidade em Portugal, e a pretender que o setor não receba fundos para a proteção de espécies ameaçadas, como o lobo  ou o lince ibérico, pois estes “só servem para alimentar uma atividade lúdica sangrenta e branquear a verdade por detrás do extermínio de animais e do seu habitat”. Ora, é informação pública, e recente, de que o ICNF, num curto espaço de tempo, anunciou a confirmação da tendência de crescimento da população de abutres pretos no Parque Natural do Tejo Internacional, um aumento de 33% de casais de reprodutores de águia imperial ibérica no Alentejo, principalmente no Parque Natural do Vale do Guadiana e na ZPE de Castro Verde, e o fantástico censo de 2019 do lince ibérico que coloca o Vale do Guadiana com a maior taxa de produtividade em termos de ninhadas da Península Ibérica. Mais uma vez em prática, o lema “confundir, para condicionar”, pois a deputada Inês Sousa Real – apesar de todo o seu negacionismo – sabe bem quais são os dois pontos em comum neste sucesso da conservação da natureza em Portugal:

O primeiro, é que todos eles acontecem diariamente em zonas de caça, com o trabalho de gestores cinegéticos e caçadores em conjunto com o ICNF, proprietários rurais, agricultores e ONGA’s, mantendo e promovendo os habitats que tornam em realidade estes sucessos da conservação da natureza e da promoção da biodiversidade em Portugal.

O segundo ponto, é que o PAN nada fez para o sucesso destes exemplos ou de qualquer outro no terreno e, mesmo assim, continua a usar a imagem do lince ibérico nos postais de Boas Festas do partido, sabendo bem que é graças ao setor da caça que a reintrodução do lince ibérico é um sucesso mundial. A realidade incomoda o PAN, por isso tem optado por escolher apenas os factos que interessam à sua verdade. Vale tudo, na sua ideologia, para atacar a caça, tomando propositadamente a parte pelo todo – intoxicando a opinião pública com a ideia de que o episódio da Torre Bela é um espelho do setor da caça – ignorando factos comprovados dos efeitos benéficos da caça para a conservação da natureza, dos habitats e da biodiversidade e ainda, tentando pressionar, através de artigos de opinião, a maioria de deputados que têm tido o discernimento de chumbar todas as suas propostas, que no mundo real seriam geradoras de elevados danos para a conservação da natureza, para o mundo rural e para a economia. Economia essa, que para os deputados do PAN, parece que pouco importa: afinal, parece que a razão da mortandade de 540 animais foi causada para a instalação de energias renováveis…

Que fique claro, que o PAN não é o dono da agenda da conservação da natureza e da biodiversidade em Portugal. Não vai ser o oportunismo da sua agenda e a sua visão desfasada da realidade do mundo rural – aquele onde a conservação da natureza se pratica no terreno – que vai condicionar a racionalidade dos decisores, que não se deixam confundir por truques de retórica animalista. Não, senhora deputada, o setor da caça não apreciou esta matança e repudiou-a e condenou-a. Não, senhora deputada, o setor da caça não deve ser desapoiado, pelo contrário, deve ser apoiado com base no conhecimento científico, em nome da sustentabilidade e da preservação da natureza e dos ecossistemas.

Que esta farsa de “confundir, para condicionar” que o PAN encenou, não contagie decisões que devem ser lúcidas, ponderadas e serenas. O setor, como um todo, estará presente para dialogar com o governo, com os ministérios envolvidos, com o ICNF e com os grupos parlamentares que o queiram fazer de uma forma séria, informada e honesta. Só o PAN pode decidir se entra, ou não, neste diálogo, que deverá centrar-se em formas de impedir que o que se passou se volte a repetir e em formas de melhorar continuamente o contributo essencial da prática da caça para a preservação da biodiversidade e da promoção da sustentabilidade, e como fonte direta e indireta de apoio à economia rural. Mas, que fique do conhecimento público que foi este mesmo partido que fez questão de não estar presente nas várias audiências em que o setor da caça esteve no Parlamento para discutir com os deputados as questões pertinentes do setor ao longo dos últimos anos, o que em nada credibiliza a atual postura do PAN.

Tudo o mais será ceder a agendas que não interessam à larguíssima maioria dos portugueses, transformando-se numa discussão surda sobre ideologias que visam impor um modelo de sociedade animalista, que os portugueses não desejam, nem votaram para ter.