Se há uma expressão que reflete o espírito português é o “vai-se andando”. Aquela resposta vaga e enigmática que usamos para dizer “estou a sobreviver”, mas sem grande entusiasmo.

Mas a verdade é que pensar um bocado sobre esta expressão pode levar-nos a refletir: será que a vida anda sozinha ou somos nós que a levamos para a frente?

Olá, eu sou Pedro e nos últimos anos tenho feito um esforço grande para garantir que conduzo a minha vida em vez de ser levado por ela.

E é sobre isso que vamos conversar hoje.

Comecemos pelo básico. “Vai-se andando” é uma expressão tão portuguesa quanto o bacalhau à brás. Resume um estado de conformismo ligeiramente otimista. Não está tudo bem, mas também não está tudo mal. É um bocadinho como dizer: “Estou a sobreviver, mas não façamos disso uma festa”.

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Esta expressão, carregada de história e cultura, revela muito sobre o nosso modo de ser. Desde os Descobrimentos até aos dias de hoje, o “tuga” tem uma capacidade invejável de se adaptar e seguir em frente, mesmo que devagarinho.

Mas será que este conformismo não nos está a prender? Vejamos o exemplo de uma cultura que, mesmo podendo ser um exemplo a não seguir em muitas temáticas, é famosa pela pró-atividade e entusiasmo: “Living the dream!” — é uma resposta bastante comum se perguntarmos a um americano como vai andando. Embora muitas vezes dito com sarcasmo, revela um espírito de busca incessante por algo melhor. Será que nos falta essa energia?

Quando se pensa em figuras como o nosso Infante D. Henrique, é difícil imaginá-lo a dizer “vai-se andando” enquanto planeava as suas expedições. Ele empurrou a vida, e a nação, para novos horizontes. Então, porque é que nós, ainda que não ousemos a possível arrogância de almejar tais conquistas, temos tendência para ficar conformados com o mínimo?

Aposto que não foi a “ir andando” que a padeira de Aljubarrota ”varreu” sete castelhanos à pazada.

Não me interpretem mal, não acho que venhamos todos a ser herois de epopeias. Mas fará algum mal acreditar que sim? Viver cada dia com o objetivo sincero e real de querer mais e melhor?

Exemplos não nos faltam, e não precisamos de recuar 7 séculos:

“Na minha cabeça, eu sou o melhor. Se não pensarmos assim não temos ambição. (…) Posso não ser, mas na minha cabeça eu sou o melhor.” — Cristiano Ronaldo, um bom exemplo de alguém que desde cedo se agarrou à ideia de não ser levado pela vida (e parece que corre bem!).

Se nos deixarmos levar pelo “vai-se andando”, podemos acabar por perder oportunidades ou, pior, por nos tornar uns meros sujeitos passivos das circunstâncias. Ainda que possa soar clichê, não consigo discordar de quem disse “Life is too short to be a passenger”.

Mas calma… Ainda que acredite , com muita força, em tudo o que digo em cima, também acredito que nunca podemos deixar de parte o equilíbrio.  Não podemos ser obcecados com o controlo total de tudo. As coisas nem sempre correm como queremos, e aceitar isso faz parte da sabedoria popular que tanto caracteriza o nosso povo — ou não tivéssemos expressões como “Há males que vêm por bem” ou ”Deus escreve direito por linhas tortas”. Aceitar o que não podemos mudar é tão importante quanto lutar por aquilo que podemos.

O equilíbrio está em saber quando empurrar e quando deixar andar. Este equilíbrio nada tem que ver com resignação e conformismo, mas sim sabedoria. Significa reconhecer quando as circunstâncias estão fora do nosso controlo e quando é hora de mudar de estratégia. É a capacidade de adaptação a cada situação e o encontrar oportunidades ou soluções quando nem tudo corre como imaginamos.

Se isto nos fizer sentido, da próxima vez que não estiver tudo ótimo e alguém nos perguntar “Como estás?”, talvez possamos responder com um bocadinho mais de entusiasmo e menos resignação.  Em vez de “vai-se andando”, que tal “estou a fazer por isso!” ou “a melhorar!”? Mesmo que possa soar estranho a quem nos faz a pergunta, lembramo-nos de que queremos fazer de uma má circunstância um estado temporário, e de que vamos fazer o que estiver ao nosso alcance para melhorar.

A escolha é sempre nossa. Ou “vai-se andando” ou vivemos a vida com atitude, um passo de cada vez e sempre para melhor.

O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial, para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. Ao longo dos próximos meses, irão partilhar com os leitores a visão para o futuro nacional e global, com base na sua experiência pessoal e profissional. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.