O ex-presidente da Assembleia da República Jaime Gama considerou hoje que o PS não deverá ter capacidade de alcançar uma maioria absoluta, gerando uma “situação altamente complexa”, a que acresce o Tribunal Constitucional funcionar como “segunda câmara”.

Num debate com Marcelo Rebelo de Sousa sobre “o CDS no sistema de alianças partidárias em Portugal”, na “escola de quadros” dos centristas, em Peniche, Jaime Gama defendeu também que o resgate financeiro não está concluído e que há “trabalho muito profundo” para mais uma década.

O socialista identificou “uma situação prospetiva muito complexa”, com um “sistema político com elevadíssimo limiar eleitoral de formação de maiorias”.

“Para atingir um partido uma maioria é muito difícil. O PS teve essa possibilidade em circunstâncias últimas, não me parece que tenha capacidade para o repetir, e o PSD depois de Cavaco Silva já o perdeu. Temos aí uma situação altamente complexa”, afirmou Jaime Gama.

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“Tudo leva a crer que o PSD e o CDS concorrendo coligados ou fazendo depois uma coligação não consigam uma maioria absoluta e também tudo leva a crer que o PS não consiga uma maioria absoluta. Portanto, vamos estar perante uma situação nova”, reforçou.

Para o antigo presidente do parlamento e antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, “perante a necessidade de um Governo de maioria, as hipóteses abrem-se”: “Será que há uma coligação a três? Será que há uma coligação a dois? Será que o PS tem maioria suficiente para poder liderar um governo e fazer coligação com um partido que aceite coligar-se com ele numa posição secundária?”.

Entre várias “dificuldades de sistema eleitoral e de cultura” política, Gama apontou ainda para como uma “dificuldade a acrescer à governação” a existência de um “sistema constitucional que tem uma segunda leitura legislativa, uma segunda câmara, que é o Tribunal Constitucional”.

“Está desenhado constitucionalmente como sendo o somatório do Conselho Constitucional francês, do Supremo Tribunal americano e do Tribunal Constitucional alemão”, afirmou, argumentando que funciona como uma “segunda câmara de facto, somando todos conteúdos de todos os Tribunais Constitucionais do mundo”.

Segundo Jaime Gama, em contexto eleitoral o Governo irá tentar negar as dificuldades, que a oposição também tentará iludir para “gerar esperança numa alternativa”, mas “ambos estão equivocados porque a realidade vai ser a da perpetuação da dificuldade”.

O socialista afirmou que a questão das alianças “está na ordem do dia”, argumentado que “é fácil ter governos minoritários quando há abundância” e que “o chamado resgate ou intervenção não estão concluídos” porque os “problemas estruturais” das finanças e da economia não estão resolvidos.

“Estão contidos, num período de extrema ambiguidade quanto aos indicadores e não é de excluir que no futuro possam voltar”, anteviu.

Para Gama, é “tudo muito frágil, muito dependente de fatores externos aleatórios e a exigir trabalho de anos muito profundo, que vai ter uma duração seguramente de mais de uma década”.

O ex-presidente da Assembleia da República, que negociou o primeiro governo de coligação entre PS e CDS, em 1978, identificou que os centristas correm sempre riscos nas suas alianças, embora com o PS deverá ser este a sofrer a maior erosão no final.