Catedrático da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, começou, como ele mesmo diz, “nestas andanças de misturar economia com saúde em 1991”. Estava então nos EUA a preparar o doutoramento. Em 2014 diz que já é possível falar em público de economia da saúde sem provocar “uma reacção quase de apedrejamento público”.
E de racionamento pode falar-se? “Para um economista, do ponto de vista técnico, racionamento sempre houve – responde Pita Barros – Racionamento significa apenas que eu não posso satisfazer tudo a todos ao mesmo tempo. E nesse sentido sempre houve escolhas que foram feitas. Quando se pôs mais dinheiro nos hospitais não se pôs mais dinheiro noutro lado. Quando nós excluímos medicamentos de comparticipação estamos a fazer racionamento. Já temos situações de racionamento explícito. A questão é o que guia essas situações.” Vai dando exemplo do que considera racionamento: “Nota-se muito que os médicos já hoje usam muito essa lógica de racionamento explícito. Questões de próteses, por exemplo. Pessoas com uma determinada idade, idade avançada. Eles sabem que não valerá provavelmente pôr uma prótese que vai durar vinte anos.”
Outras vezes não resiste a mostrar como a pressão para se gastar pode gerar situações insólitas:
“Todo o autarca gostaria de ter um hospital no seu concelho. Isso não faz sentido. Já tivemos essa experiência naquele famoso triângulo do que é agora o Hospital do Médio Tejo entre Abrantes, Tomar e Torres Novas. Temos ali três hospitais que no fundo são um hospital com corredores de trinta quilómetros.”
Mas se estas situações são hoje mais ou menos consensuais o mesmo não se pode dizer do acesso aos medicamentos inovadores. Por exemplo, quando se define que apenas 150 pessoas terão acesso ao novo medicamento contra a hepatite C e se um dos nossos familiares for o número 151 ameaçamos ou não o Estado português com um processo como fez o filho de uma das afectadas por esta doença que naturalmente reivindica o acesso imediato ao tratamento? O melhor será mesmo ver o vídeo da entrevista (minuto 5) mas, correndo o risco inerente aos resumos e às transcrições, podemos dizer que Pedro Pita Barros considera que “Não vai ser credível dizer que só se vão tratar 150. Porque quando aparecer o 151 nas mesmas condições dos outros ele não vai deixar de ser tratado.”
Mas diz mais. Defende que “Do ponto de vista do sistema de saúde português, para mostrar a importância da hepatite C, a própria classe médica falou num número muito elevado de doentes. Resta confirmar se esses números muito elevados são mesmo assim, se têm de ser todos tratados já… Pode ser às vezes um valor diluído no tempo, pode ser quem nem sejam todos aqueles casos…”
Para o fim dois assuntos: num futuro próximo as pessoas que, como os fumadores e os alcoólicos, têm comportamentos que agravam a sua saúde vão ou não ser penalizadas no acesso aos cuidados de saúde? A resposta a esta pergunta que, nomeadamente no mundo anglo-saxónico é feita cada vez com maior frequência (minuto 22), leva-nos às questões da liberdade individual:
“É muito fácil entrarmos numa ditadura sanitária.” – alerta Pita Barros. “Custa-me pensar que vamos abdicar dessa liberdade individual a propósito de uma pretensa saúde que depois se pode ter. Não temos ainda conhecimento total dos mecanismos que fazem a ligação de um comportamento para uma situação de risco. Eu não posso dizer que todas pessoas que têm cancro de pulmão têm de pagar 50 por cento dos seus custos. Seria um absurdo porque eu podia ter pessoas com cancro de pulmão que nunca tivessem fumado. Então vou dizer: todas as que fumaram têm que pagar se tiverem cancro de pulmão. Mas eu não tenho a certeza que eles tiveram cancro de pulmão só por terem fumado.”
Para o fim ficou aquele que é um dos seus temas de estimação. Chama-lhe com alguma ironia nesta entrevista “um dos mitos mais propagados por vários sítios” (nomeadamente no Orçamente de Estado) e que se prende com a tese generalizada de que o envelhecimento tem sido a principal causa do aumento de custos com a saúde. A esta afirmação responde taxativamente “Não tem.”