Tire uns segundos e imagine isto. Está dentro de uma casa, sentado no sofá, o sono prega-lhe uma partida e adormece. Quando acorda da sesta, as janelas da habitação dão-lhe uma vista diferente porque, durante as horas que o sono lhe roubou, a casa mexeu-se. Agora saiba que não precisa de mergulhar num sonho para que tal aconteça: um arquiteto português criou um modelo de casa que roda em função da exposição solar que recebe. O projeto chama-se “Casas em Movimento”, a obra é de Manuel Vieira Lopes e uma casa-modelo está a ser exibida, no Porto, até setembro.
Na cabeça do arquiteto sempre esteve a intenção de construir uma casa inovadora, autossustentável e ecológica. Para o conseguir, Vieira Lopes criou uma habitação que, além de girar sobre o próprio eixo, está equipada com uma pala, também ela movível, revestida por painéis fotovoltaicos, capazes de produzir cerca de 25 mil kilowatts por hora (kWh) de energia por ano. Tudo é feito em função da exposição solar. “É uma casa fixa dentro de uma casa roda”, começou por explicar o arquiteto, ao Observador. “Como tem o elemento fixo, permite que, rodando em torno desse elemento, possamos criar espaços em função do sol”, acrescenta. Em 2014, a casa recebeu uma menção honrosa e um prémio de 100 mil euros no Solar Decathlon Europe, uma competição para projetos que concebam casas alimentadas, exclusivamente, por energia solar.
Confuso? Talvez. Mas o facto de a casa girar, garante o arquiteto, é quase impercetível para quem lá esteja dentro. “A dimensão dos espaços vai-se alterando à velocidade da terra, não é desconfortável”, assegurou. Manuel Vieira Lopes, aliás, ficou “bastante agradado” por, no Porto, aquando da apresentação do projeto, “as pessoas não terem reparado” que a casa se estava a movimentar. “Nem mesmo quando acelerámos o processo para demonstrar o movimento que a casa faria em 12 horas de um dia”, explicou.
Também a pala que cobre a casa se movimenta de acordo com a luz solar. “Os painéis são utilizados para climatizar a casa, criar espaços e até criar um terraço sombreado”, disse o arquiteto, ao retratar como a pala pode, ao longo do dia, inventar “espaços exteriores cobertos” em torno da casa. Depois há o lado ecológico da habitação: além de produzirem energia para alimentar a casa, os painéis fotovoltaicos fazem com que, num ano, a emissão de dióxido de carbono fique entre as 17 e as 33 toneladas.
Este modelo de casa até está idealizada para produzir mais energia do que necessita. Algo que, segundo Manuel Vieira Lopes, terá levado Siza Vieira, um dos mais reputados arquitetos portugueses, a dizer-lhe que “este módulo pode ser construído num edifício histórico e alimentar a edificação existente”.
As divisões mutáveis ao gosto do utilizador
No interior, a casa está idealizada para conter materiais e mobília de origem nacional, como a madeira e a cortiça. E lá dentro tudo também muda, já que o tamanho das divisões da casa são personalizáveis, consoante a vontade de quem lá habita. “A cozinha, de manhã, terá 15 m2, por exemplo, e à hora do jantar poderá ter o dobro. O dono comunica com a casa e diz-lhe para, à hora x, o espaço y ser maior de acordo com a utilidade que terá”, explicou Vieira Lopes.
Ou seja, as paredes, no interior, também se vão mexer e mover-se segundo a vontade do utilizador. Lá dentro, a casa não conta com qualquer “elemento mecânico” para a climatizar, já que “a casa adapta-se ao utilizador enquanto poupa energia e a produz”. Por outras palavras, todos os movimentos, rotações e mexidas que a casa executa em função da exposição solar estão pensadas, igualmente, para controlar a temperatura interior.
E para ter tudo isto, quanto terá de pagar? Qualquer coisa coisa como 500 mil euros, se a casa contar “com todos os elementos”. A casa-modelo deste projeto estará exposta até 31 de agosto no Porto, junto ao Edifício Transparente. Depois, a partir de 1 de setembro, estará na Avenida dos Aliados, no âmbito da parceria Porto Inovation Hub-Casas em Movimento. Em comunicado, a Casas em Movimento não adiantou até quando a casa-modelo ficará na cidade.