Dia 13 de novembro de 2015. Brahim Abdeslam acionou o cinto de explosivos que trazia num café em Paris. Este foi apenas um dos vários ataques que mataram 130 pessoas naquela fatídica noite na capital francesa. Dos ataques organizados por uma célula jihadista o único sobrevivente foi Salah Abdeslam, que andou em fuga até ter sido capturado pelas autoridades belgas poucos dias antes dos atentados em Bruxelas.

Na sequência dos atentados, várias informações foram divulgadas acerca dos irmãos, o que ainda não se conhecia era o seu perfil antes da radicalização. Dois amigos próximos falaram à CNN, na condição de que as suas identidades não fossem reveladas (escolheram ser identificados como Karim e Rachid) e de que a entrevista fosse conduzida longe do bairro onde moram – Molenbeek. Os relatos são surpreendentes.

Um vídeo de fevereiro de 2015 – oito meses antes dos atentados de Paris – mostram os irmãos a dançar numa discoteca. Os amigos contam que Brahim era o irmão mais sério e Salah o mais divertido. Salah é descrito como um homem “que gostava de mulheres” que chegou mesmo a ter uma namorada. Os irmãos fumavam, bebiam, dançavam e gostavam de mulheres. Karim e Rachid costumavam frequentar o café dos Abdeslam e contam que lá fumavam cannabis, jogavam poker a dinheiro e viam jogos do Real Madrid na televisão. Brahim torcia pelo seu jogador preferido – Cristiano Ronaldo. Um dos amigos diz que “era um sítio divertido. Parecia familiar”. A noite de fevereiro em que foi filmado o vídeo que mostra os irmãos Abdeslam a dançar numa discoteca foi a última vez em que foram vistos a beber.

“Brahim tornou-se mais religioso. Ia rezar à mesquita às sextas-feiras mas, quando não ia, rezava em casa”, contam. Na altura ninguém previa que se radicalizassem. Quanto tentam perceber como tudo aconteceu, dizem que os irmãos Abdeslam “devem ter mudado aos poucos”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Karim e Rachid não se revêm nos ideais adotados pelos irmãos Abdeslam, mas admitem que a rede jihadista já aliciou várias pessoas que lhes são próximas. Um membro da família de Karim foi detido pelas autoridades quando tentava juntar-se ao autoproclamado Estado Islâmico na Síria. O jovem tinha apenas 15 anos. Karim diz que “aconteceu tão depressa que a nossa família quase nem notou” e acrescenta que grande parte do processo de recruta “acontece atrás de portas fechadas, online, nos seus quartos”.

Outros três homens próximos do grupo foram detidos por terem, alegadamente, ajudado Salah enquanto estava em fuga às autoridades, na sequência dos atentados em Paris. Do mesmo bairro, veio também Moahammed Abrini que terá conduzido duas vezes até Paris com Abdeslam na semana que precedeu os ataques de 13 de novembro. Abrini, que também era um cliente habitual do café dos irmãos Abdeslam, continua a ser procurado pelas autoridades. Rachid e Karim descrevem-no como um homem reservado que costumava frequentar o estabelecimento à noite para beber.

O alegado condutor que ajudou Salah a fugir na noite dos atentados, Hamza Atou, e Mohammed Amri, que também é apontado como cúmplice da fuga, estiveram com Rachid e Karim na noite dos atentados. Ainda assim, os dois amigos não foram questionados pelas autoridades. Os dois homens acreditam que Atou e Amri não tinham noção do que estava a acontecer. Já em relação a Salah, Karim não acredita que ele estivesse “apenas no sítio errado à hora errada”.

Também Chakib Akrouh, que foi colega de Karim em criança, esteve nos tiroteios ao lado de Brahim antes de se fazer explodir. Karim diz que não consegue perceber o que levou a que os seus amigos cometessem estas atrocidades e diz que só percebe estas ações se elas forem induzidas por drogas ou álcool, nunca em consciência plena dos atos.

Rachid acredita que “ninguém nasce mau desta forma”. Os amigos lamentam o acontecido, dizendo que os recentes ataques tiveram um grande impacto na comunidade onde vivem uma vez que “como jovens muçulmanos com poucas oportunidades, as coisas só vão piorar a partir da agora. Para além de que, nos dias de hoje, até nós temos medo de ser feitos em pedaços no metro”.

Molenbeek é um bairro habitado por emigrantes onde o desemprego é muito elevado e o crime prospera. Cerca de metade da população do bairro é muçulmana. É por estas razões que o bairro se tornou num “ninho de terroristas”.