Os acionistas do BPI chumbaram a alteração dos estatutos do banco que permitiria ao atual presidente executivo manter-se no cargo, para além do atual mandato. Fernando Ulrich já ultrapassou a idade limite fixada nos estatutos, mas a alteração que foi a votos na assembleia geral exigia dois terços do capital representado, o que não foi conseguido.

O presidente executivo do banco desvalorizou este resultado, lembrando que o seu mandato está em curso (falta um terço) e que há tempo para resolver a situação da liderança que só terá de ser substituída daqui a um ano.

Por seu turno, o presidente não executivo, Artur Santos Silva, revelou entretanto que tenciona propor o fim dos limites aos direitos de voto no BPI, logo a seguir a 1 de julho, data de entrada em vigor do decreto-lei que permite desblindar os estatutos de instituição bancária. Situação que abre a porta a uma nova votação sobre a alteração de estatutos.

Fernando Ulrich recusa a tese de que a alteração dos estatutos tenha sido proposta para a sua manutenção na liderança da comissão executiva, lembrando que há muitas pessoas válidas no mercado com uma idade parecida que podem ter interesse para o banco. Ulrich tem 64 anos e os estatutos do banco limitam a 62 anos a eleição de membros para a comissão executiva.

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O fundador do BPI, Artur Santos Silva, revelou em conferência de imprensa que foi ele a propor o fim deste limite de idade que foi aprovado por todo o conselho de administração do banco, ou seja, incluindo o representante da Santoro de Isabel dos Santos, que é a segunda maior acionista do BPI.

Só que esta proposta foi apresentada no dia 4 de abril, antes do acordo que virou desacordo entre Isabel dos Santos e o CaixaBank sobre a redução da exposição do banco a Angola. O BPI atribuiu o fracasso deste acordo à Santoro que acusa de ter exigido condições que não estavam compromisso original. Isabel dos Santos respondeu, responsabilizando o CaixaBank. O BPI contestou esta “versão dos factos”.

Conflito aberto no BPI

Foi neste clima de conflito entre os dois maiores acionistas do banco e entre a Santoro e o próprio BPI, que foi a votos esta quinta-feira a alteração que retirava o limite de idade à eleição de membros da comissão executiva do banco. Como se tratava de uma alteração de estatutos tinha de ser aprovada por dois terços do capital representado na assembleia. Por outro lado, a blindagem dos direitos de voto no BPI dá a Isabel dos Santos, que tem cerca de 19% do capital, quase o mesmo poder de voto que o CaixaBank, que controla 44% do BPI.

O limite a 20% dos direitos de voto no BPI tem sido fator de impasse acionista no banco, sobretudo no que toca a encontrar uma solução para reduzir a exposição do banco português ao mercado angolano, em conformidade com as regras do Banco Central Europeu.

.O governo já aprovou um decreto-lei que permite alterar os estatutos no setor bancário, uma lei que a empresária angolana classifica de “diploma BPI — que favorece uma das partes no momento em que as partes se encontravam em pleno processo negocial”. O diploma entra em vigor a 1 de julho deverá produzir efeitos até ao final do ano, o que, em tese ainda pode permitir mudanças nos estatutos do banco para desbloquear o direito de votos. O fim deste limite de 20% é outra vez uma das condições de sucesso da recente OPA lançada pelo CaixaBank.

Entretanto, o presidente executivo do CaixaBank, Gonzalo Cortazar, já afirmou esta quinta-feira que não há negociações acionistas depois de lançada a oferta pública de aquisição (OPA) sobre o BPI. A única exceção é a procura de soluções para a exposição do banco a Angola, que está em incumprimento das regras do Banco Central Europeu.

Fundador diz que limite de 62 anos está deslocado

Artur Santos Silva lembra ainda que foi ele que propôs em 1998 a criação desta regra de limite de idade, mas agora considera que se encontra “completamente deslocado”, porque é importante estabilizar a equipa.

O primeiro presidente do BPI lembra que o banco tem a equipa de gestão mais estável do setor o que tem sido uma vantagem. Essa estabilidade já tinha sido colocada em cheque com a anunciada ida de António Domingues, o vice-presidente do BPI, para a liderança da Caixa Geral de Depósitos.

A proposta para eliminar esta regra foi aprovada por 63,68% dos votos presentes, uma maioria que falhou por pouco a percentagem exigida de 66,7%. O CaixaBank apoiou a proposta de eliminação do limite de idade, tal como a holding da família Violas. Mas a limitação dos direitos de voto dá a Isabel dos Santos poder de veto sobre todas as decisões que exigem uma maioria qualificada. Entre as alterações chumbadas está ainda a possibilidade do conselho de administração decidir aumentos de capital por entradas em dinheiro até 500 milhões de euros.

Os restantes pontos constantes da ordem de trabalhos da AG foram aprovados, nomeadamente as contas de 2015, ano em o banco teve lucros consolidados de 236,4 milhões de euros, e a proposta do conselho de administração que esse valor seja totalmente aplicado em reservas do banco.

Também aprovada foi a alteração da forma de cálculo das remunerações variáveis dos administradores e até um voto de louvor e confiança ao conselho de administração. Estiveram presentes 229 acionistas que representavam 81,70% do capital, o que é uma percentagem elevada para empresas com capital disperso em bolsa.

Foi com Ulrich que Isabel dos Santos entrou no BPI

Fernando Ulrich chegou à presidência executiva do BPI em 2004, substituindo o fundador Artur Santos Silva que se manteve como presidente não executivo. Antes já estava na comissão executiva.

A resistência à oferta pública de aquisição (OPA) lançada em 2006 pelo BCP, então liderado por Paulo Teixeira Pinto, foi uma vitória que lhe visibilidade ao gestor que é conhecido por fazer declarações pouco improváveis para um banqueiro. Uma das frases mais conhecidas que ficou: Foi o aguentam, aguentam, quando questionado durante o pico da crise económica sobre se os portugueses aguentavam mais cortes.

Foi já com Fernando Ulrich na liderança que Isabel dos Santos entrou no capital do BPI, um investimento realizado no final de 2008 numa espécie de contrapartida pela aliança feita em Angola quando o banco português teve de abrir o capital do Banco do Fomento Angola, um dos principais bancos de retalho do país, a investidores locais, no âmbito do processo de angolanização do setor bancário. A Unitel foi a parceira.

A relação dos outros acionistas e do banco Isabel dos Santos começou por ser tranquila e a empresária até deu uma ajuda quando o Itaú, acionista fundador histórico do banco decidiu sair de Portugal em 2012, vendendo a sua posição de 17,6% no capital ao CaixaBank. A empresária angolana comprou uma parte desta posição, o que lhe permitiu alcançar quase 20% do BPI.

Mas o lançamento de uma OPA pelo CaixaBank no ano passado apanhou Isabel dos Santos de surpresa, acabando por azedar a relação entre os dois maiores acionistas do BPI. A Santoro tem chumbado todas as tentativas de desblindagem de estatutos e propostas para reduzir a exposição ao BFA. O CaixaBank, e a própria gestão do banco, não aceitaram a sugestão de analisar uma fusão com o BCP nem a oferta de 140 milhões de euros feita pela empresária angolana por 10% do capital do BFA.