A 4 de julho de 1776, os Estados Unidos assinavam a Declaração da Independência. 240 anos depois, o país (e o mundo inteiro) assistiu a um outro grande feito: a grande travagem da sonda espacial Juno para ficar a orbitar Júpiter (na verdade, em Portugal já só acontecerá no dia 5). Se as comemorações deste dia são célebres pelo fogo de artifício, nada se poderá igualar ao investimento feito nesta missão espacial: 1,13 mil milhões de dólares (cerca de mil milhões de euros).
Esta madrugada, por volta das 4 horas em Portugal, a missão chegou a bom Porto. A NASA (agência espacial norte-americana) anunciou que Juno tinha entrado com sucesso na órbita de Júpiter. O Observador seguiu o momento em direto (aqui ou no site da NASA TV).
“Estamos a aproximar-nos de Júpiter a uma grande velocidade”, afirmou Scott Bolton, responsável pela missão e investigador principal do Instituto de Investigação em San Antonio, no Texas, durante a tarde de segunda-feira. O investigador admitiu sentir-se “nervoso e assustado” em relação ao destino da nave – não fosse esta uma missão de alto risco (e de custos avultados).
Júpiter é o primeiro planeta gasoso depois da cintura de asteroides que o separa de Marte, mas Júpiter é também o maior planeta do sistema do sistema solar – sem contar com o Sol, tem mais do dobro do material dos outros astros do sistema solar juntos (planetas, luas, cometas e asteroides). Tem uma massa 300 vezes maior do que a do nosso planeta, o que faz com que a força da gravidade com que atrai os objetos celestes à sua volta seja enorme. Esta será a primeira provação da sonda Juno: à medida que se aproxima do planeta a força da gravidade será tal que vai fazer a sonda acelerar até 241 mil quilómetros por hora.
266 mil quilómetros por hora, será a velocidade máxima atingida por Juno, tornando a sonda o objeto construído pelo homem que atingiu a maior velocidade até hoje, refere o site ScienceAlert. O suficiente para dar a volta à Terra em nove minutos.
A sonda Juno foi lançada a 5 de agosto de 2011 e agora que chegou perto da atmosfera de Júpiter vai ter travar a fundo para se conseguir manter na órbita do planeta – caso contrário atravessa a atmosfera e deita por Terra uma missão que conta já com 15 anos de trabalho. Durante 35 minutos, os motores vão tentar contrariar a força da gravidade, gastando 447 quilogramas de combustível dos 1.232 quilogramas disponíveis. Ainda assim, Juno será a sonda mais rápida a orbitar um planeta – 57,9 quilómetros por segundo.
Mesmo a esta velocidade, os 18 meses previstos para a permanência em órbita darão a Juno (e aos investigadores em Terra) muito tempo para recolher dados únicos sobre a formação e evolução do planeta com nome de deus romano. A 20 de fevereiro de 2018, e se se aguentar até lá, a NASA dará a missão por concluída: Juno continuará a recolher dados enquanto desce pela atmosfera, até deixar de funcionar.
- A 5 de agosto de 2011, Júpiter encontra-se a 716 milhões de quilómetros da Terra. Nessa altura, a luz demorava 39 minutos e 50 segundos a percorrer a distância entre os dois planetas;
- A 4 de julho de 2016, a distância entre Júpiter e a Terra é de 869 milhões de quilómetros e a luz demora 48 minutos e 19 segundos a atravessar esta distância;
- A 20 de fevereiro de 2018, quando a missão acabar, os dois planetas estarão afastados por 560 milhões de quilómetros (dados da NASA).
Júpiter, filho de Saturno e pai de Marte, era o deus supremo da Roma antiga. Aparece associado a trovões, relâmpagos e tempestades, como as que acontecem frequentemente na atmosfera do planeta com o mesmo nome. Uma das imagens mais características de Júpiter é a sua mancha vermelha – com duas vezes o tamanho da Terra –, um remoinho gigante que já é observado a partir da Terra há, pelo menos, duas umas centenas de anos. Para entrar na densa camada de nuvens que cobrem o planeta, a NASA escolheu a sonda Juno, nome da mulher de Júpiter, que tinha a capacidade de ver através das nuvens, explica a agência espacial.
Além de enfrentar a força da gravidade, a sonda Juno terá de lidar com o campo magnético de Júpiter (e todos os detritos que gravitam à volta do planeta). A temperatura e pressão na camada mais baixa da atmosfera é tal que o hidrogénio se transforma num líquido capaz de conduzir eletricidade como um metal. As correntes elétricas neste meio podem justificar o poderoso campo magnético do planeta – cerca de 20 mil vezes mais poderoso que o da Terra.
Juno estará exposta a níveis de radiação muito altos. Uma vez que os eletrões atinjam a sonda, eles começam imediatamente a fazer ricochete e a libertar energia, dando origem a fotões e partículas. É como um spray de balas de radiação”, refere Heidi Becker, investigadora sobre os efeitos da radiação no Laboratório de Propulsão a Jato da NASA. Estas partículas são capazes de “atravessar uma nave espacial e separar os átomos dentro dos dispositivos eletrónicos ou fritar o cérebro de um humano se não se fizer algo sobre isso”. Por isso é que os cientistas envolvidos na missão arranjaram um solução para o problema: criaram um escudo, um autêntico cofre, em titânio.
À medida que a tecnologia avança, as missões espaciais conseguem alcançar objetivos nunca antes experimentados, como Rosetta que foi a primeira sonda a orbitar um cometa. Alguns dos feitos inéditos de Juno:
- Primeira missão espacial a orbitar um planeta, exterior à cintura de asteroides, de polo a polo;
- Primeira missão espacial que vai funcionar no interior das cinturas de radiação da Júpiter – para isso leva um escudo especial de titânio;
- Um dos resultados será as fotografias de Júpiter que terão a melhor resolução alguma vez conseguida.
Para quem quiser seguir todos os momentos da sonda Juno, desde o percurso feito até Júpiter, até à entrada na atmosfera do planeta pode descarregar uma aplicação da NASA – Eyes on Juno (De olhos em Juno).
Última atualização às 12h10, de dia 5 de junho.
Correção: Juno está em órbita no exterior da atmosfera de Júpiter.
Correção na citação de Heidi Becker.