Günther Oettinger, comissário europeu responsável pelas pastas da Economia e Sociedade Digitais, admitiu na manhã desta segunda-feira estar preocupado com a possibilidade de Portugal vir a precisar de um segundo resgate.
O alemão esteve no Parlamento e tentou sensibilizar os deputados portugueses — sobretudo os da esquerda — para os riscos de um segundo programa de assistência para o equilíbrio económico e financeiro do país, mas também para o equilíbrio do tabuleiro político europeu, cada vez mais dividido entre os país no norte e sul da Europa.
Quando fez estas declarações, Günther Oettinger achava que estava a falar em sigilo: “Queria-vos dizer, agora não publicamente“, começou o comissário europeu. Mas a audição do comissário europeu estava a ser emitida em direto pela AR TV, canal que transmite diariamente os trabalhos parlamentares. E, assim, tornou-se público que a maior preocupação da Comissão Europeia “seria se Portugal precisasse de um segundo resgaste”. “Não sei qual é a probabilidade, mas é maior do que 0%”, sublinhou o alemão, militante da CDU, partido de Angela Merkel.
Horas depois, no entanto, o comissário europeu acabaria por retirar alguma pressão: publicamente, à margem de uma Conferência sobre o Mercado Único Digital da União Europeia e questionado sobre um eventual segundo resgate financeiro a Portugal, Oettinger afirmou que “Portugal está a fazer muito” e afastou essa possibilidade: “Penso que não é necessário um segundo resgate, isso só [aconteceria] no pior cenário. Temos de fazer o que pudermos para evitar tal desenvolvimento”.
Ainda assim, o alemão deixou claro que o país precisa de continuar os esforços que tem vindo a desenvolver. “Estou confiante de que os Governos fazem o que podem para estabilizar e consolidar as contas públicas e estou confiante nas perspetivas para 2017. Eu como político e tendo sido primeiro-ministro da Alemanha, sei como é difícil cortar salários, cortar no número de professores, no investimento em infraestruturas ou nas pensões”, disse.
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Oettinger quando achava que estava a falar à porta fechada
Portugal “insolvente” sem primeiro resgate
Na comissão parlamentar de Assuntos Europeus, Oettinger lembrou aos deputados portugueses que, sem o programa de assistência subscrito pelo Governo Sócrates em 2011, “Portugal seria insolvente, já não seria capaz de pagar os salários dos seus funcionários, de [garantir] a manutenção das suas estradas e das suas escolas”.
Por isso, e num momento em que existem Estados-membros (principalmente a Norte) que veem a Europa como a instituição que “manda dinheiro para os países pobres” e que pressionam a Comissão Europeia a fechar a torneira, é ainda mais importante que Lisboa cumpra todos os seus compromissos, sobretudo no que diz respeito à diminuição da dívida, argumentou o comissário europeu.
“O que é mais importante é o cumprimento dos compromissos assumidos. Para nós, [Comissão Europeia], cada Governo vale o mesmo. Seja ele conservador, socialista ou comunista. Temos a obrigação de sermos neutros. Mas há acordos, como a diminuição da dívida, que são importantes”, reiterou Günther Oettinger, reconhecendo que “Portugal, de facto, fez muito” nos últimos anos.
Em resposta aos deputados portugueses, o comissário europeu lembrou o surgimento de forças eurocéticas em vários países, como Áustria, Alemanha, Holanda e Estónia, cada vez mais descontentes com a gestão das crises financeiras nos países do sul. Com este cenário em cima da mesa, o comissário europeu reforçou que “Portugal é um dos países que mais vantagens tem” em pertencer à União, referindo-se à diferença entre o que Portugal contribui para o Orçamento europeu e as verbas europeias que são deslocadas para o país” — e pediu compreensão.
“Peço-vos que vejam o outro lado. Somos [Comissão Europeia] criticados em Espanha, na Grécia [por causa da austeridade], mas também na Holanda, na Áustria e na Finlândia. Estamos na via do meio. Peço-vos que façam política em Portugal conscientes da opinião pública” dos restantes países, pediu o alemão.
Ainda no Parlamento, o comissário europeu deixou uma resposta aos que, em Portugal, defendem a saída do país do mercado único. “Vocês precisam de investimento em pesquisa e desenvolvimento. Se não querem o mercado único, acham realmente que os bens produzidos em Portugal, um país de 10 milhões de habitantes, podem sobreviver num mundo [globalizado]?”, questionou Günther Oettinger.
Apesar dos avisos, Oettinger está “otimista” em relação a Portugal
Depois da audiência com os deputados portugueses no Parlamento, à margem da iniciativa coorganizada pela Comissão Europeia e o Governo português, o comissário europeu assumiu estar “confiante e otimista” quanto ao Orçamento do Estado português para 2017.
Ainda assim, o alemão voltou a avisar, tal como fizera na comissão parlamentar, que os Estados-Membros devem manter-se sob o “chapéu” das instituições europeias. “Estou confiante que vamos chegar a uma posição comum e pragmática quanto ao Orçamento do Estado para 2017”.
O comissário sublinhou o “desenvolvimento impressionante” dos resultados portugueses, mas sublinhou que estes “não são o fim da história”, “há que continuar”.
Estou confiante de que os Governos fazem o que podem para estabilizar e consolidar as contas públicas e estou confiante nas perspetivas para 2017. Eu como político e tendo sido primeiro-ministro da Alemanha, sei como é difícil cortar salários, cortar no número de professores, no investimento em infraestruturas ou nas pensões”, disse.
Oettinger lembrou os compromissos existentes entre o Governo português, a União Europeia e os Estados-Membros da Zona Euro quanto à redução da dívida e do défice em 2016 e 2017, sublinhando que as medidas concretas a adotar têm de ser nacionais. “É do nosso interesse ser um parceiro solidário para todos os governos dos países da União Europeia, como para Portugal também, e que os governos estejam sob o nosso chapéu”, frisou.
O comissário avisou que os Estados-Membros que não estão sob “o chapéu” das instituições europeias estão mais sujeitos à pressão de partidos populistas que dizem que há demasiada solidariedade, dando exemplos de França, Áustria, Alemanha e Holanda. “Temos de estabilizar e equilibrar estas pressões”, disse.
Sobre a possível suspensão de fundos comunitários a Portugal à luz dos procedimentos por défice excessivo, o comissário disse esperar “um desenvolvimento bom e construtivo nas próximas semanas”, lembrando que hoje há uma reunião no Parlamento Europeu em Bruxelas: “Vamos esperar e ver”.
O Parlamento Europeu (PE) discute esta segunda-feira com a Comissão Europeia, à margem da sessão plenária e pela primeira vez, a possível suspensão de fundos estruturais a Portugal e Espanha à luz dos procedimentos por défice excessivo, no chamado ‘diálogo estruturado’, com caráter consultivo. O executivo comunitário só depois deste ‘diálogo estruturado’ com o PE elaborará uma proposta, mas a decisão cabe ao Conselho de Ministros das Finanças da UE (Ecofin).