É exequível, mas não como se esperava. A meta de redução do défice orçamental para 2,5% no ano passado estará ao alcance do Governo, considera a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO). No entanto, este resultado deve-se a uma travagem a fundo no investimento do Estado, das regiões e das autarquias, e não de despesas como o consumo intermédio e com pessoal, que continuaram a aumentar mais que o esperado em outubro pelo próprio Governo.
Numa altura em que ainda não conhecidos os dados dos últimos três meses do ano, os técnicos independentes que trabalham junto da comissão de orçamento enviaram uma análise aos deputados que indica que a meta do défice estará ao alcance do Governo.
Dito isto, a forma como se chega a esta meta não é a prometida pelo Executivo. Nas contas até setembro, os técnicos sublinham que as despesas de capital – onde são, por exemplo, registadas as despesas com investimento e transferências de capital para empresas públicas – estavam a cair 30,8%, bastante acima dos 12,6% que o Governo previa em outubro, quando entregou a proposta de Orçamento do Estado para 2017 na Assembleia da República.
Boa parte desta descida deve-se a uma redução das despesas de investimento, que estão a cair 25,7%, uma redução concentrada maioritariamente na Administração Central, mas não apenas. As regiões e as autarquias também cortaram investimento.
Há ainda um efeito de base associado que agrava a descida, especialmente no que diz respeito à rubrica outras despesas de capital, que se deve aos aumentos de capital realizados em 2015 em empresas públicas que não contam para o défice. Este efeito faz com que a redução face a 2015 seja mais pronunciada.
A queda nas despesas de capital permite uma descida dos gastos até setembro da ordem dos 600 milhões de euros, quando a previsão no orçamento entregue em outubro ao Parlamento apontava para uma subida.
Despesas com pessoal crescem mais que o esperado há três meses
O mesmo não se verifica nas despesas com pessoal. Até setembro as despesas com salários estavam a subir mais que o esperado, e devem subir ainda mais devido ao efeito da reposição gradual das remunerações que se tornou completa em outubro, diz a UTAO.
Ao fim dos cortes salariais na Função Pública, juntam-se os custos associados à passagem ao horário semanal de 35 horas, das 40 que estavam em vigor, e a não concretização da redução do número de trabalhadores prometida por Mário Centeno. O ritmo de entrada de apenas um trabalhador por cada dois que saíssem para a reforma não aconteceu. Segundo a UTAO, por cada trabalhador que saiu do Estado, um trabalhador entrou para o Estado, um efeito da diminuição do número de novas reformas na função pública.
O resultado foi um crescimento das despesas com pessoal de 2,7% quando ainda em outubro o Governo previa que crescessem no máximo 2,1% em 2016.
Também os consumos intermédios estão a subir mais que o esperado. Mesmo com o congelamento nominal que o Governo impôs na lei do orçamento para 2016, o Executivo esperava que as despesas com consumo intermédio crescessem 2,5%. Até setembro, estes gastos estavam a subir 4,5%, ou seja, o Estado gastou mais 326 milhões de euros mais que em 2015. Quase metade destes gastos refletem custos com as Parcerias Público-Privadas (PPP), mais 148 milhões de euros.
Dívida pública está a custar menos ao Estado
A boa notícia vem da dívida pública, que apesar de continuar a crescer está a custar menos aos cofres públicos. Isto acontece por três razões principais: a amortização antecipada do empréstimo ao FMI; a substituição de empréstimos obtidos junto de entidade privadas por empréstimos públicos a entidades do Estado; a emissão de dívida de médio e longo prazo mais barata, em especial a linha de obrigações emitidas em fevereiro de 2015.
O pagamento antecipado do empréstimo do resgate ao FMI, que tem um custo elevado, substituindo-o por empréstimos feitos em mercado com juros mais baratos, tem permitido ao Estado baixar o custo médio da dívida pública. Este processo começou ainda durante o Governo anterior, tal como a substituição de empréstimos com juros mais altos que as empresas públicas pediram a bancos privados por financiamentos mais baratos dados pelo Estado, e tem sido mantido pelo atual.
A estes dois fatores podemos juntar ainda o custo mais baixo da dívida no mercado. Isso permitiu a Portugal emitir dívida mais barata, seja no médio e longo prazo (exemplo dado pela UTAO é o da linha de obrigações do Tesouro de fevereiro de 2015), seja no refinanciamento de dívida de curto prazo com a emissão de novos bilhetes do tesouro.