Aviso à oposição interna: não é por perder as autárquicas que Passos Coelho se vai demitir de líder do PSD. Em entrevista à SIC esta quinta-feira à noite, o líder da oposição foi taxativo neste ponto: “Nunca me demitiria de presidente do PSD por causa de um resultado autárquico“. Desafiado a esclarecer o que seria uma vitória para o partido nas próximas autárquicas, Passos Coelho repetiu que o objetivo do PSD é conseguir “o maior número de mandatos” nas câmaras e nas juntas de freguesia. E repetiu uma mensagem que tem ensaiado: as eleições autárquicas não têm uma leitura nacional. Quanto ao resto, Passos criticou a venda do Novo Banco e a gestão da recapitalização da Caixa, questionou a forma como o Governo atingiu o défice e ainda atirou sobre Marcelo: o Presidente da República devia ter defendido Teodora Cardoso dos ataques do PS.
Apesar de admitir que não se demite na sequência de um mau resultado autárquico, Passos assume que, se este não for o melhor, assume as responsabilidades. “Não lavo as minhas mãos desse processo”, garante. No entanto, não antecipa demissões para não abalar a estabilidade interna: “Não lanço instabilidade dentro do partido. Ninguém espera que, como aconteceu com outras personalidades, invoque o resultado das autárquicas para abandonar o PSD“.
Desafiado a comentar a candidatura de Teresa Leal Coelho à Câmara de Lisboa — tida como uma escolha de recurso do PSD — Passos defendeu a sua vice-presidente. “É uma boa candidata e espero que ganhe”. Não ganhando, “não será uma tragédia para o PSD“, deixou escapar o presidente do PSD. “Não podemos ganhar todas”, acrescentou.
Quanto aos dados macroeconómicos, o líder do PSD está “satisfeito” por o Governo ter conseguido um défice de 2,1% em 2016, mas considera que o primeiro ano de Governação socialista foi um ano “perdido na recuperação económica”. Para Passos, Portugal — em vez de “acelerar”, como acontecia desde 2013 — “travou o crescimento”. Líder da oposição diz esperar que país não tenha novo resgate.
O líder do PSD diz que não se enganou e que “não se trata de dar os parabéns ao Governo” por ter conseguido bons resultados macroeconómicos. Passos tinha dito, no passado, lembraram os jornalistas, que se o Governo tivesse estes resultados, recomendaria ao voto no PS. Ainda recomenda?, perguntaram os entrevistadores. Passos riu-se. E explicou que o País “cresceu menos do que tinha crescido em 2015” e que, “enquanto outros países aproveitaram a baixa do petróleo e aceleraram o crescimento, Portugal desacelerou o crescimento.”
Passos destaca que “o Governo mudou de estratégia”, pois “começou com uma estratégia orçamental e acabou com outra”, alcançando os objetivos com “um plano B, com medidas extraordinárias”. O líder do PSD acrescenta: Se o Governo tivesse chegado ao final do ano com os resultados que teve, com a estratégia que tinha: chapeau.” O líder da oposição lembrou ainda que Portugal ainda está numa situação de stresse, e lembra que “as taxas de juro são quase o dobro das espanholas”, quando antes estavam próximas.
Sobre o perigo de um novo resgate, o líder do PSD diz que não faz “acusações que possam causar pânico”, lembrando que “faz hoje seis anos, que Sócrates pediu à comunidade internacional a ajuda. Conseguimos ultrapassar. Não estamos como a Grécia hoje está. Espero que Portugal não volte a passar por isso”.
Passos critica venda do Novo Banco
Na mesma entrevista, Pedro Passos Coelho criticou o processo de venda do Novo Banco, desresponsabilizando Sérgio Monteiro: a venda “compete ao Governo e ao Banco de Portugal”; se o Executivo não estava satisfeito com o desempenho do ex-secretário de Estado que pedisse ao regulador “para o mudar”, argumentou o presidente do PSD.
O ex-primeiro-ministro criticou o facto de António Costa não ter conseguido vender o banco de transição na sua totalidade e acusou o Governo de fazer um perdão aos bancos, ao reduzir os juros e aumentar os prazos de pagamento do empréstimo concedido pelo Estado ao Fundo de Resolução. Se fosse primeiro-ministro, insistiu, não o permitiria. “Os bancos irão pagar de juro seguramente menos do que o Estado tem pagar para se financiar em igual montante”.
O líder do PSD acusou ainda o Governo de provocar “uma instabilidade muito grande” na Caixa Geral de Depósitos, lembrando que o banco público já teve “três administrações” num ano. Quanto ao processo de recapitalização da CGD, Passos voltou a dizer que a injeção de capital no banco público parece excessiva, sem, no entanto, se comprometer com um valor.
Coligação com o CDS nas legislativas? “Não faço futurologia”
Sobre se estaria disponível para uma coligação com o CDS em 2019, Passos respondeu que não faz “futurologia“. O líder do PSD considera que o antigo parceiro de Governo é “um partido importante para construir uma alternativa de Governo em Portugal“, lembrando ainda o “passado comum”.
O presidente social-democrata recordou que PSD e CDS “concorreram separados” em 2011 e que isso não os “impediu de formar governo a seguir às eleições”. Da mesma forma que em 2015 fizeram uma coligação pré-eleitoral, e até “ganharam as eleições”, mas acabaram por não ser Governo por não conseguirem o apoio do Parlamento.
Passos diz ainda que não tem “nenhum receio” que Rui Rio lhe roube a liderança. “Estou muito tranquilo com a liderança que tenho no PSD”, garantiu.
O líder do PSD não quis dizer se aceita voltar ao Governo sem se submeter de novo a eleições, como tinha admitido o líder parlamentar, Luís Montenegro. “Não vou fazer especulação sobre isso. Não há cenários que queira privilegiar”, explicou o líder do PSD. Passos acusou PCP e BE de fazerem uma “encenação muito grande” no apoio ao Governo, mas não faz previsões se é uma aliança para durar: “Se se vão entender ou não, não é uma questão para o qual eu seja chamado.” E coloca a gestão de uma situação política insustentável nas mãos de Marcelo Rebelo de Sousa: “Se porventura, o país tiver uma crise política, o Presidente da República é que tem responsabilidade de decidir o que fazer“.
“Gostaria de ter visto Marcelo a defender Teodora Cardoso”
Passos Coelho e Marcelo não têm tido as melhores relações, mas o líder da oposição lembrou: “O Presidente da República, que foi eleito com o nosso apoio e o nosso voto, não está em Belém para desenvolver a estratégia do PSD, nem de qualquer partido.” O líder do PSD diz que o Presidente tem realizado uma “cooperação ativa com o Governo, como lhe compete“. Já “saber se numa altura podia carregar mais ou menos nas tintas” ou ir mais ao menos “ao encontro dos que o elegeram”, Passos deixa isso “para os comentadores.” Também não se sente na mira de Marcelo: “Só reajo a ataques que me possam ser dirigidos, se achar que são esses ataques se referem a mim.”
O líder do PSD deixou, no entanto, uma crítica clara a Marcelo Rebelo de Sousa: “Teria gostado de ver o Presidente da República defender a independência do Conselho de Finanças Públicas, e em particular a idoneidade da sua presidente, Teodora Cardoso, quando foi atacada pelos partidos da maioria, pelo Governo e pelo próprio primeiro-ministro“. Para Passos, o papel do Presidente passa precisamente por “defender as instituições independentes.”