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HUGO AMARAL/OBSERVADOR

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

Assunção Cristas. "Se eu ganhar Lisboa, o candidato do CDS a primeiro-ministro será outra pessoa"

Em entrevista, a líder do CDS faz uma promessa surpreendente: se for eleita presidente da câmara, fica fora de um futuro Governo de direita. Culpa Costa pela "trapalhada" da CGD e afasta-se do Diabo.

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Assunção Cristas chegou antes da hora marcada à redação do Observador, no Bairro Alto — as obras em Lisboa não a atrasaram. Acusou Fernando Medina de ser “desrespeitoso para os lisboetas” por causa dos transtornos na cidade em vésperas de eleições, disse que “ficaria satisfeita” se o PSD apoiasse a sua candidatura à câmara e garantiu que se for eleita abdica do Governo e de uma nova candidatura ao Parlamento.

Rejeitou ainda uma nacionalização do Novo Banco e, mais do que o ministro das Finanças, responsabilizou António Costa pelo “processo trapalhão e lamentável” da Caixa. Não acredita que vem aí o Diabo, mas acha que ainda é cedo para baixar impostos e devolver rendimentos e pensões na totalidade. A mensagem pode ser difícil de passar, admite, por isso as bombas de gasolina às vezes dão uma ajuda.

Ter o apoio do PSD em Lisboa? “Ficaria satisfeita”

Porque é que se candidata a Lisboa? Na rentrée do CDS em Oliveira do Bairro deu duas razões. Uma puramente partidária: dar o exemplo na necessidade de mobilização. Outra, puramente sentimental, dizendo: “Tenho o vento de Lisboa colado à minha pele e a água do Tejo no fundo da minha alma”. Não acha pouco?
Há várias razões. A primeira tem a ver com o facto de estarmos em ano de autárquicas e eu sentir que esta tem de ser uma aposta forte do CDS. Desde que tomei posse como líder fui pedindo ao partido que não estivesse à espera das legislativas porque quem chegava assim ao Governo provavelmente ficaria lá muito tempo. E um partido tem de se mobilizar sempre para todos os combates que têm um calendário marcado e agora é o autárquico. A segunda questão relevante tem a ver com o facto de achar que Lisboa pode ter um projeto alternativo. Há questões críticas na cidade que não estão a ser suficientemente resolvidas por esta câmara, e vale a pena relembrar que temos um PS que vai completar 10 anos à frente da autarquia. Acho que basta.

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Que projeto é esse? Costuma dizer que quer uma política mais próxima das pessoas, mas o que quer isso dizer em concreto? Mais turismo, menos turismo? Mais carros, menos carros?
O que estamos a fazer neste momento é trabalho de casa. Eu tenho ideias concretas sobre a cidade, mas esta é a fase em que nos devemos dedicar a ouvir aquilo que a cidade nos quer dizer — o que aliás é uma crítica que é feita a Fernando Medina: a de que ouve pouco, decide sem ouvir, não faz discussões públicas, não debate as matérias. O que estamos a fazer é andar na rua a ouvir as pessoas, fazer umas iniciativas com a comunicação social, outras bastante mais discretas. Estamos a lançar o ciclo de conferências coordenado pelo professor Carmona Rodrigues, onde a primeira conferência foi sobre a pobreza e bairros sociais, e a segunda vai ser sobre Cultura. Vamos ter connosco Pedro Mexia, António Lamas, gente de várias áreas, e a postura do CDS é a de alargar, ouvir independentes, ouvir as pessoas, e com isso construir um programa que faça sentido. É evidente que para mim há coisas que têm de ser resolvidas. Acho que esta câmara olha pouco para as pessoas, pouco para os idosos, tem feito pouco para garantir que há mais gente a viver na cidade em todas as fases da sua vida, e tem um problema grande de mobilidade. Quando pergunta “mais ou menos turismo?”, eu acho que o turismo é ótimo mas não pode deixar de nos levar a refletir sobre a forma como a sociedade se adapta e garante que os lisboetas vivem bem com esse turismo.

Mas acha que há turistas a mais?
Não, não acho nada que haja turistas a mais. Basta olhar para as capitais europeias para perceber que não temos turistas a mais, acho é que há falta de gestão urbana.

"Se o PSD entendesse que há aqui uma oportunidade de retirar em conjunto Fernando Medina e o PS da Câmara Municipal de Lisboa, eu ficaria satisfeita, como é evidente."

Mas, por exemplo, quer proteger as chamadas lojas históricas, independentemente de haver lá pessoas, independentemente das rendas…?
Essa matéria está neste momento em debate no Parlamento. Há um diploma sobre lojas históricas, e evidentemente que nós vamos propor sugestões e melhorias nessa matéria. Eu fui responsável direta pela reforma do arrendamento do anterior Governo, que acho que funcionou bem e que é uma das responsáveis por mais habitação na cidade. Mas nessa matéria sempre achei que as câmaras têm instrumentos para proteger as lojas que entendem que devem ser protegidas. Deve ser ao nível municipal que se garante essa proteção.

O ponto aqui é se tem uma visão mais intervencionista ou menos intervencionista do aparelho camarário sobre a cidade. Por exemplo, quando houve a questão do Teatro da Cornucópia, colocou um post no Facebook em que dizia que o CDS não se conformava com esta perda. Se fosse presidente da câmara não se ia conformar com o fecho de um teatro e ia fazer o quê? Dar dinheiro àquele teatro em especial?
O problema da Cornucópia é mais largo do que isso, e provavelmente tem a ver com outras questões que não o dinheiro, com questões geracionais e das pessoas que constituem a companhia. O que penso é que essas questões têm de ser debatidas a nível não só nacional, mas a nível municipal também. A cidade pode fazer mais do ponto de vista de se afirmar em matéria cultural.

Vamos à maior polémica em Lisboa neste momento: as obras. Já escreveu que “há obras boas e outras nem por isso”. Quais são as boas e quais as nem por isso?
Uma que diria que é muito positiva é a requalificação do Jardim do Campo Grande, termos um novo espaço de lazer na cidade. Já as obras que têm a ver com a mobilidade, tenho as maiores dúvidas de que se tenha começado bem. Acho que se devia ter começado pela resolução das questões dos transportes públicos, e depois sim por incentivos mais agressivos à utilização desses transportes públicos ou de outros meios mais suaves de mobilidade. Eu sou completamente favorável a uma cidade com menos automóveis, com mais transporte público, mais bicicletas, mais andar a pé, com a possibilidade de pegar na bicicleta e pôr num transporte público, que é coisa que hoje não existe. O que acho que é desrespeitoso para os lisboetas é cortar possibilidades do uso de automóvel quando não temos alternativas credíveis e sérias já instaladas. Isso é construir a casa pelo telhado.

Neste momento não abdicaria de usar o seu carro em Lisboa?
Neste momento, eu creio que há muita gente que não consegue abdicar. Infelizmente, há muita gente que não vê alternativa porque tem transportes públicos cheios e que não cumprem horários. Tudo isso tem de ser tratado de forma mais articulada e conjugada. E esta opção do Governo de deixar o Metro na esfera do Governo e passar a Carris para a esfera da câmara, vamos ver se não vai trazer um problema adicional de articulação entre os vários transportes.

Portanto, costuma andar de carro. Aliás, ainda ontem foi meter gasolina…
Costumo andar de carro, ando de bicicleta e a pé, mas mais para lazer, não para me deslocar todos os dias.

Com esta candidatura está claramente a meter a cabeça no cepo. Quando Paulo Portas se candidatou a Lisboa nas autárquicas de 2001 e teve um mau resultado, preparou uma carta de demissão e só não a leu porque António Guterres se antecipou e deixou o Governo. Vai ter o cuidado de escrever uma carta de demissão caso as coisas corram mal?
Não, de todo.

Se for um desastre não se vai embora?
Em primeiro lugar, acho que não vão correr mal, e vou trabalhar intensamente para que não corram mal.

Essa é a resposta standard
Sinceramente, a minha preocupação é trabalhar intensamente para que as coisas corram muito bem para os lisboetas, para que construamos um programa mobilizador. Portanto, não consigo dar a resposta de outra maneira.

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Tirando Paulo Portas, qual foi o melhor líder do CDS?
Ai, não sei. Só entrei para o CDS em 2007 e não olho muito para trás, olho mais para a frente…

Para si CDS é Paulo Portas, é isso?
Não, não é Paulo Portas. Mas olhe, acho que Freitas do Amaral no arranque do CDS teve um trabalho extraordinário na formação de um partido que foi muito relevante na construção da democracia e que foi uma voz que faria muita falta se não tivesse existido naquela altura.

Papa Francisco ou Bento XVI?
Complementam-se. Bento XVI deixou-nos um legado de profundidade grande do ponto de vista doutrinário; o Papa Francisco é o Papa que precisávamos de ter agora, é muito próximo das pessoas e está a proceder a um alargamento forte da Igreja e de abertura da Igreja na qual eu me revejo.

Os seus filhos fazem rugby por ser um desporto queque ou porque enrijece?
Fazem rugby no Belenenses porque é o que está ao pé de casa. Por acaso começaram na natação, depois no futebol, mas tinham mais amigos no rugby. E porque é um desporto de equipa e eles gostavam.

O que faz quando percorre as barraquinhas e todos lhe oferecem álcool?
Bebo só um golo.

O O que seria um bom resultado? 6%, 7%?
O dr. Paulo Portas teve 7%, Maria José Nogueira Pinto 5,9%. Esses foram os resultados de um CDS sozinho à Câmara de Lisboa nesta reta final. Depois também temos Nuno Krus Abecasis, que teve um bom resultado, primeiro sozinho, depois acompanhado, mas foi numa outra fase, noutra altura. Os tempos também vão mudando, também nunca tínhamos tido um governo das esquerdas unidas…

Se a fasquia que põe é a de Krus Abecasis, então já é uma fasquia mais alta.
A fasquia não é nenhuma. A fasquia é trabalhar para termos o melhor resultado possível, e eu fico de consciência tranquila se souber que as pessoas no CDS Lisboa e no CDS em geral trabalharam intensamente para ter esse resultado. Depois disso, em democracia respeitam-se os resultados. Quanto a pôr ou não a cabeça no cepo, eu não vejo as coisas assim. Se há um desafio é para o abraçar, não há que ter medo, não há que ter calculismos nem pensar “e se, e se”. Há eleições, temos de dar o nosso melhor, mostrar o que é uma alternativa do centro-direita no país. Achamos que Lisboa não está a ser bem governada, se estivesse a ser bem governada pensava duas vezes. Se é difícil? É.

A verdade é que a fasquia muda se tiver o apoio do PSD.
Certamente. Se o PSD entender que há aqui uma oportunidade de retirar em conjunto Fernando Medina e o PS da Câmara de Lisboa, obviamente…

Desejava essa opção?
Eu ficaria satisfeita, como é evidente. Agora, compreendo que cada partido tem a sua estratégia. Desde há cinco meses que conversei abundantemente com o presidente do PSD, sabemos quais são as preocupações dos dois partidos e a nossa disponibilidade continua a mesma. Estamos tranquilamente a fazer o nosso caminho. Se o PSD a dada altura entender que é interessante fazer parte deste projeto então desenvolveremos um projeto em conjunto.

Mas convenhamos que avançar autonomamente e em primeiro lugar não é a melhor forma de conseguir um acordo.
Resultou da conversa que tivemos naquela altura. O PSD estava à espera da decisão de Pedro Santana Lopes, que eu acho que foi um ótimo presidente da Câmara de Lisboa. Do nosso ponto de vista fazia sentido avançar um pouco mais cedo mas sem fechar qualquer tipo de portas e qualquer espaço de diálogo.

"O PSD tem um calendário que é conhecido, não nos compete a nós estar a fazer qualquer tipo de pressão a um partido que é aliado."

Já se sentaram à mesa para negociar um acordo para Lisboa?
O PSD e o CDS têm falado muito sobre Lisboa — não só sobre a cidade, mas sobre todos os concelhos do distrito, como aliás sobre todo o país.

Ao nível da direção nacional?
Ao nível distrital. Mas obviamente que a partir do momento em que o PSD tem um calendário que é conhecido, que é o primeiro trimestre deste ano, não nos compete a nós estar a fazer qualquer tipo de pressão a um partido que é aliado, com quem temos muito boas relações, com quem estamos em conjunto em 22 câmaras. Nós respeitamos os tempos do PSD.

Mas confirma que há uma negociação a ser feita para Lisboa?
O que eu lhe posso dizer é que há conversas dentro deste quadro que passam por respeitar reciprocamente os tempos e as estratégias de cada partido. Obviamente que se o PSD achar que faz sentido termos um processo conjunto para inverter a governação socialista, eu acho que é muito positivo e fico satisfeita; se não for essa a opção do PSD também continuamos amigos e aliados em tantos outros municípios.

Já conversou com Pedro Passos Coelho sobre isso?
Como é sabido, falei com Pedro Passos Coelho há muito tempo sobre isso.

Há muito tempo. Mas mais recentemente, desde que Pedro Santana Lopes saiu da corrida?
Cruzamo-nos muitas vezes no Parlamento.

Mas qual é o grande plano? PSD e CDS estiveram juntos no Governo, agora estão separados pelo menos nas duas maiores cidades.
Mas estamos juntos em várias outras… Cascais, Aveiro, Braga, Famalicão.

Mas o que vai acontecer a seguir? Os dois partidos não devem ir juntos nas legislativas?
Eu disse-o de forma muito clara no congresso: faria todo o sentido o CDS trabalhar o mais que pudesse para ajudar a construir uma alternativa de governação no centro-direita em Portugal. Mas para isso o meu entendimento é que o CDS daria um contributo maior se fizesse esse caminho sozinho. Como historicamente sempre aconteceu.

E se ganhar em Lisboa? “Nessa altura, o candidato do CDS a primeiro-ministro seria outra pessoa, sem drama nenhum”

Um leitor do Observador, Maycon Santos, pergunta: “Se vencesse as eleições em Lisboa, como é que fazia nas legislativas? Ficava só em Lisboa? Acumulava?”
Se eu vencer as eleições em Lisboa não tenho dúvidas de que exercerei o mandato e, obviamente, numas futuras eleições legislativas, não serei candidata a deputada. Mas, felizmente, o CDS tem muita gente boa para garantir que continuaremos a ter um excelente grupo parlamentar e, portanto, isso não me preocupa. Se me for perguntar a seguir: então e um hipotético governo? Também não acho que seja drama nenhum o CDS participar num governo sem que a sua líder lá esteja. Eu acho que esta inovação à esquerda pode ser muito inspiradora para uma inovação à direita. Não vejo drama nenhum nessa matéria, pelo contrário: vejo um multiplicar de oportunidades.

E o candidato a primeiro-ministro pelo CDS seria outra pessoa…
O candidato a primeiro-ministro nessa altura seria outra pessoa, com certeza, sem drama nenhum. Mas eu acho que o CDS precisa de crescer tanto até poder dizer com propriedade e realismo que tem um efetivo candidato a primeiro-ministro que confesso que nessa matéria as coisas não me preocupam. Aquilo que nós elegemos nas legislativas são deputados. Aliás, por essa ordem de ideias António Costa não seria primeiro-ministro hoje. Porque ele não ganhou, ele foi candidato a deputado e depois conseguiu encontrar uma maioria que lhe permitiu ser primeiro-ministro. Quando falamos em legislativas estamos a falar em candidatos a deputados. Na nossa cabeça, todos somos candidatos a primeiro-ministro, mas também há que dizer com realismo que um partido que no seu resultado máximo, nos últimos tempos, não chegou a 12%, dizer que tem um candidato a primeiro-ministro é um bocadinho, eu diria, excessivo — tem alguém que fará parte certamente de um governo e, quanto mais força tiver, melhor.

"Se os lisboetas me quiserem para presidente da Câmara podem ter a certeza de que serei altamente empenhada. E, se me quiserem para vereadora da oposição, exercerei esses mandatos com muito gosto enquanto for compatível estar no parlamento e estar na câmara."

E se perder? Já disse que ficava como vereadora.
Certamente, como vereadora da oposição, e não há nenhuma incompatibilidade entre ser vereadora da oposição na câmara e ser oposição no Parlamento sendo líder do CDS. Mas eu quando me candidato à câmara tenho que estar disponível para tudo e, obviamente, para fazer aquilo que os lisboetas acharem que eu deva fazer. Se não fosse assim não me candidatava, com franqueza.

Normalmente, o que acontece é: os candidatos dizem isso e, depois, surgem circunstâncias extraordinárias que, infelizmente, os forçam a ter que deixar o cargo…
Para mim é muito claro: se os lisboetas me quiserem para presidente da Câmara podem ter a certeza de que terão uma presidente da Câmara altamente empenhada e mobilizada — e eu adoraria fazer esse trabalho. E, se os lisboetas me quiserem para vereadora da oposição, o que eu posso dizer é que enquanto for compatível estar no parlamento e estar na câmara eu exercerei esses mandatos com muito gosto. No momento em que isso não for compatível…

Deixa a câmara…
Entre integrar um Governo como ministra ou dizer que não porque tenho que continuar a ser vereadora da oposição na câmara, creio que aí todos os lisboetas compreenderão que o meu trabalho é mais útil se for para o Governo construir uma agenda para o país.

Vem aí o Diabo? “Do lado do CDS não contribuímos para nenhum fatalismo”

Também acha que vem aí o Diabo?
Acho que há muitos sinais preocupantes em relação ao nosso país e à economia portuguesa. Acho que não estamos livres de dificuldades, mas não retiro daí a consequência imediata de que isso vá acabar com o governo das esquerdas unidas. O governo tem incentivos suficientes para, mesmo em situações difíceis criadas por eles próprios, conseguir resistir. Tem muitos incentivos para garantir a sua união mesmo que à conta de deixar cair algumas bandeiras de um lado e do outro.

Que tipo de incentivos?
Desde logo os partidos da esquerda não quererem arriscar perder a possibilidade de influenciar a governação, como estão a fazer neste momento com um governo que de reformista não tem nada, que não tem sabido lidar com assuntos críticos no país, e aqui o setor financeiro é um dos exemplos mais críticos, um governo que não trata da questão da dívida, que não consegue induzir um crescimento sólido… Em 2015 tivemos 1,6% de crescimento e agora teremos 1,2%, metade daquilo que foi prometido…

E o défice vai ficar abaixo dos 2,5% pela primeira vez…
Nessa matéria não tenho nenhuma crença absoluta. Porque eu também me recordo do ano 2008, com o Governo de José Sócrates, em que o ministro Teixeira dos Santos se auto-elogiou com um défice de 2,8% e também sei o que aconteceu em abril de 2011. Portanto, um défice de 2,8% em 2008 que teve um resgate dois anos e meio depois não é um precedente do PS que nos possa deixar tranquilos.

"O que vai resultar daqui, não sei. Sei é quem são os responsáveis: o PS, PEV, PCP, BE e um bocadinho o PAN."

Acha que podemos estar perante outro resgate?
O que posso dizer é que não vejo sinais de crescimento sólido da economia, de dívida controlada, de pagamentos feitos de forma séria e controlada. O que vejo são pagamentos atrasados aos fornecedores do Estado, prazos de pagamento a alargar, dívida financeira e não financeira a aumentar ou a não diminuir, juros a subir — estamos a bater nos 4%. São sinais muito negativos. O que vai acontecer? Não sei. Do lado do CDS não contribuímos para nenhum fatalismo e temos sempre uma postura positiva, dizemos sempre onde achamos que está mal e contribuímos sempre com alternativas.

Distingue-se aí de Pedro Passos Coelho?
Não é uma questão de distinguir ou não, esta é a nossa postura e a nossa visão, e é claríssima. Em tudo apresentamos alternativas, somos firmes e rigorosos quando sublinhamos o que está mal mas apresentamos alternativas. E temo-lo feito em todas as áreas. No Orçamento do Estado apresentamos 53 propostas. O que vai resultar daqui, não sei. Sei é quem são os responsáveis: o PS, PEV, PCP, BE e um bocadinho o PAN.

Ajudar o Governo a aprovar o salário mínimo? “O PS escolheu os seus parceiros”

Até onde vai o contributo que o CDS está disposto a dar? A redução da TSU como contrapartida pelo aumento do salário mínimo foi muito contestado pelos partidos da esquerda. O BE e o PCP vão reagir no Parlamento…
Vão aprovar tudo, nem que seja com abstenção.

Mas se isso não acontecer e for preciso o voto do CDS?
O voto do CDS não é relevante, o PS e o CDS não fazem uma maioria.

Mas se sair apenas um da geringonça e for preciso o CDS para ajudar, está ou não disponível?
Não, por uma razão muito simples. O PS escolheu os seus parceiros e a sua via. Podia ter escolhido apoiar, nem que fosse com a abstenção, um governo de centro-direita e influenciar a governação de um governo PSD/CDS, impondo as suas condições, mas não quis. Foi por outra via, agora tem de colher aquilo que esteve a semear.

Isso é o que tem dito o PSD também. Quer dizer que o CDS não vai nunca em momento algum ajudar o PS?
Não gosto de coisas definitivas.

Mas as pessoas têm de saber com o que contam do CDS.
E sabem, têm visto uma oposição muito firme e construtiva, com alternativas que não têm sido aprovadas. O PS escolheu o seu caminho e não vejo que tenha vontade de o alterar.

"Eu confesso que a Caixa já dá tanto trabalho e, como se vê, tantas preocupações, que não vejo que Portugal e os portugueses ganhem em ter [o Novo Banco] na esfera do Estado, com franqueza."

Mas nesta questão concreta do salário mínimo, não concorda com uma atualização para os 557 euros já este ano nos moldes em que foi feita? Se fosse preciso o voto do CDS para isso acontecer não dava?
O que posso dizer é que essas questões têm de ser tratadas seriamente e com profundidade na concertação social.

Houve um acordo na concertação social.
Acharia relevante que nessa matéria do salário mínimo pudessem ser tratadas outras questões, nomeadamente a estabilidade da reforma laboral feita pelo anterior Governo, que curiosamente é o que está a permitir criar emprego e emprego estável. Isso deveria ser algo protegido num acordo mais global. Quando se fala de aumentar o salário mínimo acho muito bem, acho que é baixo e é bom que possamos progredir nessa matéria, mas também é bom que se dê condições para que continue a haver criação de postos de trabalho.

Nacionalizar o Novo Banco? “Não vejo que os portugueses ganhem em ter mais um banco do Estado”

Tem havido várias vozes nos últimos dias a defender a nacionalização do Novo Banco perante as propostas que apareceram. Acha que pode ser uma boa ideia?
Isso é uma questão para ser muito discutida, desde logo em sede parlamentar. Mas nós temos um banco público, que é a Caixa Geral de Depósitos. Aliás, o CDS nessa matéria sempre entendeu que deveria ser um banco 100% público e isso foi sempre um aspeto relevante, nomeadamente na nossa relação com o PSD. Achamos que estamos bem em termos de setor público na banca.

Acha que não faz falta mais, é isso?
Acho que não faz falta mais. Tratemos de cuidar da Caixa Geral de Depósitos, tratemos de perguntar questões em relação à Caixa, nomeadamente o porquê da dimensão desta recapitalização, que obviamente vai ao bolso dos portugueses. É preciso acompanhar muito de perto tudo o que se passa na Caixa e, em relação ao resto, acho que seria bom que pudesse haver um esforço no sentido de encontrar outras alternativas.

E se não houver outras alternativas? Se não houver ninguém para fazer uma proposta que seja aceitável?
Eu acho que há tempo para procurar essa proposta. Não vejo que não se possa dar tempo para que outras alternativas sejam encontradas. Eu confesso que a Caixa já dá tanto trabalho e, como se vê, tantas preocupações, que não vejo que Portugal e os portugueses ganhem em ter mais um banco na esfera do Estado, com franqueza.

Não há pressa para vender o Novo Banco?
Eu prefiro, se for necessário, esperar mais tempo para encontrar uma boa solução.

Problemas na Caixa? “A trapalhada é da responsabilidade do primeiro-ministro”

Acha que António Domingues teria sido um bom presidente da Caixa? Teve pena que ele saísse?
Acho que este processo foi absolutamente lamentável da parte do Governo. E acho que a grande responsabilidade da trapalhada é do primeiro-ministro. Lamento que nunca ninguém tenha colocado a questão aí: a responsabilidade é do primeiro-ministro. Ele é o grande responsável por este processo trapalhão, lamentável, da Caixa Geral de Depósitos. Nós vimos o que foi alguém que ainda estava vinculado a um banco da concorrência — era vice-presidente do BPI — a ir a reuniões a Bruxelas com a Comissão Europeia e a reuniões com o BCE sobre questões que tinham a ver com a CGD. Sem nenhum vínculo ainda: sem se ter desligado de um lado e sem ter chegado ao outro. Portanto, logo do início a coisa nasceu torta. Depois correu mal, mas correu mal porque o primeiro-ministro prometeu coisas que depois não teve capacidade para cumprir.

António Domingues disse ontem no Parlamento que não falou com António Costa antes do dia 16 de abril, que foi quando aceitou o convite, e que não se reuniu com ele antes do dia 2 de junho: foi tudo tratado com o ministro das Finanças.
Pois, mas certamente com a cobertura do primeiro-ministro, porque não se trata de uma coisa destas sem a cobertura do primeiro-ministro.

"Conheço Paulo Macedo, fomos colegas de Governo, tenho muito boa impressão dele do ponto de vista profissional e pessoal, e portanto nesse aspeto é uma pessoa que me dá confiança."

Uma das ideias base da contratação de António Domingues e do resto da administração era ter uma administração 100% de profissionais da banca que não tivessem nenhuma relação com a vida partidária. Acha mal?
Acho muito bem que a Caixa tenha uma administração profissional, acho muito mal que se entenda que alguém por pertencer a um partido ou ter uma proximidade a um partido fica imediatamente excluído de ser um profissional, se tiver trabalho e currículo para isso. Não acho que a coisa deva ser “ou/ou”. Porque é que aqui o ‘ter filiação partidária’ ou ‘ser próximo de um partido’ fica automaticamente associado a um atestado de incompetência? Não concordo com isso. Acho importante que seja uma administração profissional , tenham ou não as pessoas orientações políticas, isso é com elas. O que não me parece positivo é que as pessoas se possam eximir de deveres que têm a ver com o estatuto de gestor público. Não me parece compatível defender uma Caixa 100% pública e depois a seguir dizer “Ah, mas os administradores que lá estão não têm que ter uma política de transparência”.

Mas está tranquila com a nova escolha? Concorda com o Presidente da República, que sobre esta substituição de António Domingues por Paulo Macedo disse que “o segundo vinho é o melhor”?
Eu não conheço suficientemente António Domingues para estar a fazer uma análise desse tipo, e seria injusta se o fizesse. Conheço Paulo Macedo, fomos colegas de Governo, tenho muito boa impressão dele do ponto de vista profissional e pessoal, e portanto nesse aspeto é uma pessoa que me dá confiança.

É cedo para baixar impostos e devolver pensões? “Na sua totalidade, sim”

Acha que as pessoas acreditam em si quando insiste na crítica ao aumento dos impostos — e o CDS sempre se apresentou como o partido dos contribuintes — sendo que quando esteve no Governo foi o partido que, juntamente com o PSD, fez um enorme aumento de impostos?
Em primeiro lugar, o dito enorme aumento de impostos aconteceu na sequência de um conjunto de medidas de corte da despesa que foram chumbadas pelo Tribunal Constitucional. Portanto, não foi uma primeira via. Em segundo lugar, esse aumento de impostos aconteceu num período de excecionalidade. Acho que não podemos falar desse tempo sem lembrar que em 2011 tivemos um resgate, com uma troika e com um memorando de entendimento, negociado pelo PS com metas tão difíceis que não foram cumpridas apesar de todos esses mecanismos. É importante não esquecermos porque é que as coisas se passaram desta maneira. Se nós estamos a caminhar para um período de normalidade, que eu gostaria de acreditar que estamos, em todo o caso estamos melhor do que estávamos há três anos, isso certamente que sim…

Acha que o governo está a levar o país para um caminho de normalidade, é isso?
O nosso governo deixou o país numa rota de normalidade…

E agora, passado um ano, continua essa normalidade?
Em 2015, eu recordo, nós estávamos a crescer 1,6%. Em 2015 começámos a recuperar rendimentos das pessoas. Em 2015, por exemplo, entrou pela primeira vez em vigor o quociente familiar, que foi responsável por um reembolso às famílias de 500 milhões de euros…

Pode-se argumentar então que o que este Governo está a fazer, no fundo, é a seguir o vosso caminho, que é continuar a devolver rendimentos, ou não?
Era muito bom que eu pudesse dizer isso com a consciência tranquila. Mas não estamos numa rota que possamos dizer que está no mesmo caminho, de todo. Quando vemos uma dívida pública que nos papéis deste governo dizia que chegava ao final do ano a 124% do PIB e que está já nos 130% do PIB… Do meu ponto de vista não há continuidade.

Do seu ponto de vista é demasiado cedo para baixar impostos e para devolver pensões e para devolver rendimentos, é isso?
Na sua totalidade, porventura, sim. Eu não abandono a ideia que sempre tivemos de que é preciso ter gradualismo e é preciso garantir que a economia cresça.

"O Presidente da República está a fazer aquilo que disse que ia fazer, que era ser um garante de estabilidade. E, nesse aspeto, está a contribuir para a estabilidade social e política. Quando alguém faz aquilo que disse que ia fazer nós não podemos criticar."

Foi à bomba de gasolina para chamar a atenção? “É preciso espírito criativo para conseguir passar a mensagem”

O Presidente da República vai cumprir agora um ano de mandato. De zero a 20, que nota que lhe dá?
Eu sou professora universitária mas não tenho o hábito de dar notas a quem não seja meu aluno. Agora, é evidente que o Presidente da República tem uma facilidade de comunicação e de ligação às pessoas que é notável — e isso é reconhecido por todos e neste momento é uma pessoa muito querida de norte a sul do país.

Por Pedro Passos Coelho não é tão reconhecido assim…
Eu acho que a capacidade de comunicar e de se ligar às pessoas é reconhecida por todos, não sei…

Talvez seja a única capacidade que Pedro Passos Coelho lhe reconhece. Há aí mais uma diferença de avaliação política entre os dois partidos. O CDS parece muito confortável com o Presidente da República, e mesmo com o facto de Marcelo Rebelo de Sousa ajudar politicamente o governo a ultrapassar algumas dificuldades, mas o PSD não.
O Presidente da República está a fazer aquilo que disse que ia fazer, que era ser um garante de estabilidade. E, portanto, nesse aspeto está a contribuir para a estabilidade social e política em Portugal. Quando alguém faz aquilo que disse que ia fazer nós não podemos criticar. O estilo é um estilo muito próprio, mas eu acho que isso é positivo — cada um só pode ser aquilo que é. Não vale a pena inventar ser uma coisa diferente.

Falando em estilo: Paulo Portas era muito conhecido pelos soundbites e pela postura muito agressiva que tinha em plenário. Assunção Cristas tem-nos brindado com os presentes que ofereceu a António Costa no último debate quinzenal, ontem também foi abastecer o carro a uma bomba de gasolina…
Em relação à gasolina, nós ao longo destes meses propusemos várias coisas, desde uma avaliação semanal da variação do imposto para garantir a neutralidade fiscal, até à eliminação deste adicional de imposto no orçamento. E, portanto, temos sistematicamente chamado a atenção para este assunto. Ontem quisemos mostrar, um ano depois, no real da vida das pessoas, o que é que isto significa. Porque às vezes só olhando para o exemplo concreto se percebe aquilo de que estamos a falar, que é de um governo que alivia por um lado, mas por outro lado, nos impostos indirectos, vai buscar o dinheiro que aparentemente está a dar com uma mão.

E acha que essa é a melhor forma de conseguir chamar a atenção?
Tem que se conjugar as várias dimensões. Nem sempre conseguimos fazer passar as mensagens. A nós pede-se que tenhamos consistência, seriedade, mas também espírito criativo e alguma imaginação para conseguir que as mensagens vão passando.

Um leitor do Observador, Hugo Laureano, pergunta: “Sente que ainda existe alguma desconsideração dos homens na política pelas mulheres?”
Acho que ainda há uma ligeira falta de hábito de ter as mulheres a participar na discussão política. Eu estou em muitas reuniões onde olho à volta e nós ainda somos poucas. Há aqui uma dinâmica um bocadinho diferente quando as mulheres entram nas reuniões que obriga os homens a mudar de estilo, desde logo na própria linguagem que utilizam. Às vezes dizem: “Ó Assunção, desculpa, estás aqui”. E eu percebo que, se eu não estivesse presente, a linguagem era outra e a forma como a conversa se desenrolava era outra. Tirando isso, não sinto problemas, não sinto diferenças, não sinto dificuldades. Mas acho que precisamos de ser mais mulheres para que as coisas se equilibrem mais e para que as pessoas percebam que de facto há visões que se complementam. Apesar de tudo, no parlamento as coisas vão sendo equilibradas. São sete partidos com representação parlamentar: estou eu no CDS, está a Catarina Martins no BE, está a Heloísa Apolónia no PEV, embora o PEV tenha uma direção coletiva. Na nossa bancada, acho que estamos quase paritários.

[Veja aqui a entrevista de Assunção Cristas ao Observador]

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