Aparentemente, Angela Merkel terá confessado que está mais preocupada com as eleições francesas do que com o Brexit. Em Portugal andamos todos distraídos com o Trump. Nos dias que correm, os portugueses sempre que olham para lá de Badajoz, só conseguem ver o Trump. Talvez valha a pena terminar com esta Trumpomania e reparar no que se passa na Europa. A curto prazo, será muito mais relevante para o futuro de Portugal.
Até há uma semana atrás, estava relativamente tranquilo com as eleições francesas. Achava muito improvável que Marine Le Pen derrotasse François Fillon numa segunda volta a dois. O candidato republicano parecia ser o próximo Presidente francês. Tudo mudou durante a última semana com o problema do financiamento da mulher e dos filhos de Fillon. Está a assistir-se a um terramoto na política francesa. Fillon foi escolhido, entre os candidatos republicanos, porque parecia ser o mais sério e o menos comprometido com a oligarquia política francesa. Ninguém queria Sarkozy e Alain Juppé é um homem do passado.
O que aconteceu nos últimos dias com Fillon mostra que afinal ele é igual aos outros. A atração de Fillon residia em ser diferente sem ser radical. Era uma espécie de reserva num partido onde as grandes figuras são rejeitadas pela maioria do eleitorado francês. Ora a reserva política caiu com uma rapidez vertiginosa. Neste momento, entre os republicanos, ninguém acredita numa vitória de Fillon. Duvida-se mesmo que consiga manter-se como candidato, o que cria um enorme sarilho ao partido. Da quase certeza de um regresso ao Eliseu, os republicanos poderão ficar sem candidato a pouco mais de dois meses das eleições.
Mas a situação no partido socialista francês não é melhor. O Presidente Hollande nem sequer concorreu às primárias do seu partido. Desde Pompidou, é a primeira vez que um Presidente não se apresenta à reeleição. O antigo primeiro-ministro, Manuel Valls, foi derrotado nas primárias por um jovem antigo ministro que não tem qualquer hipótese de vencer, nem sequer de ir à segunda volta.
Nos últimos meses, assistiu-se em França à queda dos principias políticos dos últimos anos, Sarkozy, Hollande, Juppé, Valls e agora Fillon. Parece que sobram Marine Le Pen e Emmanuel Macron. Desde o início da V República, poderá ser a primeira vez que a segunda volta de umas eleições presidenciais não terá candidatos dos principais partidos políticos. Uma segunda volta entre Le Pen e Macron será entre uma candidata de um partido extremista e um candidato de um movimento político, Em Marcha. Se um deles for eleito Presidente será também a primeira vez, na história da V República, que um inquilino do Eliseu não terá uma bancada parlamentar. Como se governará a França depois de Maio deste ano, ninguém sabe, nem os franceses.
Mas uma coisa parece segura. Se Marine Le Pen for eleita, a França sairá do Euro, o que significará muito provavelmente o fim da moeda única e da União Europeia. Entre ela e o fim da Europa, está um jovem que nunca concorreu a umas eleições, que chegou à política há cinco anos, como assessor de Hollande e que foi banqueiro no Banco Rothschild. O desempenho de Macron numa campanha eleitoral contra uma adversária temível, como Le Pen, é uma incógnita. Mas não deixa de ser profundamente irónico que, depois da grande crise financeira, a esperança na sobrevivência da Europa esteja com um antigo banqueiro, que se confessa liberal. Vinte anos depois de Blair, se Macron vencer, seria o triunfo da terceira via em França. Por mais que concorde com as ideias de Macron, não estou nada tranquilo com a perspectiva de uma segunda volta presidencial entre ele e Marine Le Pen. A última vez que assisti a um confronto entre a economia e a imigração, no referendo britânico, ganhou a segunda. A líder da Frente Nacional nunca esteve tão perto de chegar ao Eliseu e se ganhar será o fim da Europa. Esqueçam, por uns meses, o Trump. Depois da queda de Fillon, a França é que nos interessa.