Os portugueses constituem o principal grupo de imigrantes no Brasil, com quase 30% do total de imigrantes em 2012 (277.727 portugueses num total de 938.933 imigrantes no Brasil). Da mesma forma, os brasileiros formam a primeira nacionalidade de imigrantes em Portugal, com mais de 20% do total, com 82.590 brasileiros contabilizados pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras num total de 388.731 imigrantes em Portugal, em 2015. Existem, no entanto, fontes não oficiais que sugerem que este número é cerca de metade do número real de brasileiros em Portugal.

Naturalmente, não é muito surpreendente que os portugueses tenham tanta importância na imigração do país que colonizaram. De fato, de acordo com Carlos Lessa (2002), no ano de 1890, os portugueses compunham 20,36% da população da cidade do Rio de Janeiro (106.461 pessoas). Se somássemos a este número, os brasileiros natos com ambos pais portugueses, teríamos, naquele ano, 51,2% dos habitantes do Rio, um total de 267.664 pessoas.

Menos óbvia é a importância da imigração brasileira em Portugal. Apesar de o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras só disponibilizar dados a partir de 1999 (veja tabela abaixo), constata-se que só a partir de 2007, os brasileiros passaram a ser os imigrantes em maior número em Portugal, posto que era ocupado pelos cabo-verdianos.

Imigrantes em Portugal

Fonte: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF)

A imigração recente brasileira em Portugal tem dois períodos bem distintos. O primeiro, de 1999 até 2010, consolidou os brasileiros como os principais imigrantes em Portugal, com um incrível crescimento de quase 700% nestes 11 anos, passando de cerca de 20 mil para quase 120 mil, e de 10,9% para 26,8% do total de imigrantes em Portugal. O segundo de 2011 até ao presente, assistimos a um fluxo negativo de imigração brasileira em Portugal, com mais brasileiros a sair do que a entrar.

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Há muitos fatores que influenciam fluxos migratórios e certamente não tenho a pretensão de explicar todos. Mas ao investigar outros dados podemos aprender um pouco do que pode ter levado primeiro à explosão do fluxo e posteriormente à sua inversão. Será que podemos aprender um pouco ao compararmos os dados de fluxos migratórios com os dados de PIB e desemprego brasileiros e portugueses?

Nesta análise do PIB e do desemprego brasileiro e português, levo em conta que há um desfasamento no efeito destas variáveis no fluxo de brasileiros para Portugal. Utilizo um desfasamento de três anos, assim, o período 1 termina três anos antes de 2010, ano que o fluxo imigratório passou de positivo para negativo. Já o período 2 vai de 2008 até 2013, três anos antes do último ano que temos dados, 2016. Finalmente, o período 3, que dá sugestões de como o fluxo migratório se comportará a partir de 2016 (os dados do SEF vão até 2015), começa em 2014 e vai até 2016.

Nos gráficos abaixo, justaponho o crescimento do fluxo de brasileiros para Portugal – definido como a variação percentual anual do número de brasileiros contabilizados pelo SEF – com o Produto Interno Bruto de Portugal e do Brasil, e a taxa de desemprego dos dois países, definida como percentual da população que busca emprego e não está a trabalhar.

Como se pode depreender das figuras acima, o período 1 é favorável ao fluxo positivo de imigrantes brasileiros em Portugal: O PIB português é relativamente alto, o PIB brasileiro é relativamente baixo, o desemprego português cresce, mas ainda se encontra num nível baixo, o desemprego brasileiro diminui, mas ainda se encontra a um nível alto.

A partir de 2008, a grande crise financeira mundial e a crise da dívida europeia levaram Portugal a uma forte recessão, enquanto o Brasil parecia dar sinais de decoupling, a explicação encontrada por economistas na época, de que os países emergentes finalmente se encontravam numa trajetória de crescimento claramente superior à dos países desenvolvidos. Ao mesmo tempo, o desemprego português continuava a crescer, mas agora já estava a níveis altos. Enquanto isso, o desemprego brasileiro continuava a decrescer e estava agora a um nível baixo. Assim, o período 2 dá algumas explicações sobre a alteração do fluxo brasileiro de positivo para negativo.

O que esperar então do fluxo migratório a partir de 2016, explicado em parte sobre o desempenho das economias portuguesa e brasileira a partir de 2014? Talvez o período 3 seja o que ofereça sinais mais claros: a economia portuguesa em franca expansão, com o desemprego em nítida trajetória de queda; a economia brasileira, ao contrário, sofre o maior período de contração desde que a série de PIB brasileira começou a ser calculada, em 1947, e o desemprego mais que duplicou em menos de dois anos. Se depender apenas destes fatores, assistiremos nos próximos 3 anos a uma nova alteração do fluxo de imigrantes brasileiros para Portugal de negativo para positivo.

As análises acima estão resumidas na tabela abaixo.

É claro que a análise não é completa. Há muitos outros fatores que não dizem respeito à economia que afetam o fluxo migratório. Como luso-brasileiro nascido e criado no Brasil e com quatro bisavós portugueses, sinto-me à vontade para dizer que os brasileiros estão recentemente a redescobrir Portugal, que, incrivelmente, ficou esquecido ou com pouco destaque na mente brasileira durante boa parte do século XX. Há um encanto dos brasileiros com Portugal, e há atrativos não explicados em séries económicas, tais como a baixa criminalidade, a redescoberta da rica cultura portuguesa e a sua íntima relação com as tradições brasileiras. Claro, há também a língua comum, mesmo que alguns brasileiros às vezes fiquem atónitos nos primeiros dias em Portugal.

Ainda é possível que uma parte importante da vaga de brasileiros que imigraram para Portugal até 2010 desejavam sobretudo adquirir um passaporte europeu e em seguida partir para outras praças europeias. Somando-se a isso evidência anedótica http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/01/1727310-nova-onda-de-brasileiros-que-vai-a-portugal-e-qualificada-e-foge-da-crise.shtml que os brasileiros que imigraram a Portugal nos últimos quatro anos são mais qualificados e vêm para ficar, talvez esta novíssima vaga seja menos importante que a anterior e o fluxo positivo da novíssima vaga não seja suficiente para estancar o fluxo negativo, ainda em curso, da vaga anterior.

Portanto, a análise conjuntural que ofereço neste artigo não pode explicar efeitos de tendência que são melhor compreendidos por estudiosos de costumes das duas sociedades.

Em todo caso, efeito de tendência ou conjuntural, os laços culturais entre os dois países tornaram-se mais fortes nas últimas décadas. Não é possível ignorar os principais imigrantes no Brasil e os imigrantes que compõem, de acordo com dados que também incluem imigrantes brasileiros não contabilizados pelo SEF, cerca de 1,5% da população em Portugal e 4% da região da grande Lisboa.

Assistant Professor da Católica Lisbon School of Business & Economics