A dificuldade em recrutar os efetivos necessários para alimentar o sistema de forças irá colocar, no final de 2016, um enorme desafio às Forças Armadas. Esta realidade foi admitida pelo ministro da defesa nacional recentemente na comissão parlamentar de defesa. Vários especialistas têm procurado explicar o porquê dessa “falta de vocação”.

As respostas são muitas e variadas: redução da natalidade e correspondente diminuição da base de recrutamento; baixa forma física dos jovens associada a problemas de visão e audição, responsável pela eliminação de boa parte dos candidatos; ausência de carreiras; ausência de discriminação positiva nos concursos às Forças de Segurança; baixa remuneração; corte significativo e deliberado nas incorporações (passando de 4365 Praças incorporadas em 2010 para 981, em 2014, por exemplo); deficiente credenciação da formação profissional ministrada pelas FA, ausência de um plano de reinserção social ajudando os jovens a integrar o mercado de trabalho. Tudo isto justifica, segundo os especialistas, a pouca atratividade do serviço militar para os jovens. Muitas outras explicações poderiam ser acrescentadas. As apresentadas apenas explicam marginalmente o fenómeno.

Perante este problema alguns chegaram mesmo a sugerir a possibilidade de se reintroduzir a conscrição militar, discussão, aliás, iniciada recentemente em vários países europeus, fruto das alterações no panorama geopolítico e geoestratégico europeu.

O problema da presente falta de voluntários reside na destruição de uma estrutura de recrutamento descentralizada que funcionava adequadamente, levada a cabo durante a vigência do ministro Aguiar-Branco. Havia uma estrutura assente em centros de recrutamento e gabinetes de atendimento que cobriam todo o território nacional, através da qual era possível aceder a uma grande parte do universo recrutável e, simultaneamente, estabelecer uma política de comunicação agressiva junto dos jovens nas escolas, nos centros de emprego, nas juntas de freguesia, em feiras e festas de âmbito local, por todo o país; sábados, domingos e feriados; 365 dias no ano. Com estas ações, complementadas por uma política de incorporações regular, era possível recrutar os efetivos necessários. O quadro legislativo e os incentivos eram os mesmos de agora.

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Mas alguém pensou, partindo do pressuposto errado de que o aumento do desemprego iria “despertar vocações”, que seria possível suprir as necessidades de recrutamento através da centralização recorrendo apenas às ações de divulgação no Dia da Defesa Nacional e de inscrições no sítio da internet do ministério da defesa nacional. A realidade veio comprovar quão errónea foi esta opção.

A situação vai agravar-se porque a causa do problema não está ainda diagnosticada; os responsáveis por esta política desastrosa continuam em funções e não vão admitir que erraram. Muitas das instalações que albergavam os centros de recrutamento foram alienadas sendo agora difícil reconstituir a antiga estrutura. A opção de incorporar gabinetes de atendimento dotados de recursos exíguos em unidades militares deram no que está à vista de todos. Está provado que um sistema de recrutamento centralizado não satisfaz.

Os responsáveis foram alertados para as consequências que a destruição do sistema de recrutamento descentralizado iria ter. O que está a acontecer era mais do que expetável. Pois é aqui que reside o âmago da questão. Não vale a pena consumir tempo com mais lucubrações sobre a matéria. Quando um dia os responsáveis do ministério da defesa nacional perceberem que os problemas do recrutamento só se resolvem com políticas de proximidade terão então dado o primeiro passo para os resolver. Na audição na Comissão Parlamentar, o ministro da defesa nacional insistiu “em processos de comunicação e de divulgação do recrutamento minimamente centralizados”. Não percebeu ainda que não é esse o caminho.