Sondagem (rigorosíssima) no caminho para o recinto; a uma dúzia de perguntas “o que é que vem aqui ver hoje”, as respostas foram:
Arcade Fire – 6
Capitão Fausto – 2
Lorde – 2
Vim por vir – 2
Além dos cabeça de cartaz Arcade Fire, pelo palco principal passou a neozelandeza Lorde, que com apenas 18 anos é um fenómeno mundial. Uma hora antes atuou o ruivo Ed Sheeran para derreter corações e, a abrir, houve homenagem a um dos nossos maiores nomes da pop: António Variações. No palco Vodafone, assistimos ao regresso dos britânicos Wild Beasts que apresentaram o último “Present Tense”, e observámos também os aguardados Capitão Fausto.
Na “aranha” de dança, destaque para a dupla franco-americana Benoit et Sergio, uma das referências “eletro-pop” da atualidade. O Observador concentrou-se em três bandas, uma de cada palco (Principal, Vodafone e Eletrónica).
Wild Beasts (20h00)
O palco Vodafone estava cheio à espera da última atuação da noite. Muitos ter-se-ao deixado ficar depois dos Capitão Fausto, mas alguns comentários que ouvimos revelavam um clima de expectativa: o público estava ali sabendo ao que ia. O quarteto inglês apresentava-se em Portugal pela terceira vez, eles passam na rádio, já são “conhecidos”. No entanto, a curiosidade com que eram esperados arrefeceu logo ao início. Eles são recebidos com muitos aplausos, e nós com temas do novo álbum “Present Tense”. Sentimo-nos um motor que custa a arrancar, e queremos que o momento passe depressa.
Apesar da apatia (aparente) da assistência, Hayden Thorpe (baixo e voz) revela imediatamente a sua voz extraordinária (média/falsete). É incrível como soa tal e qual a ouvimos em disco, uma voz sem filtro, é encantador perceber que de facto “existe” uma voz assim, e esse espanto lê-se nos rostos que olham o palco. A combinação com o registo grave de Tom Fleming (guitarra e voz) resulta numa combinação característica dos Wild Beasts.
O mais recente disco foi o foco da apresentação, mas houve direito a músicas mais antigas, dos álbuns “Two Dancers” (2009) e “Smother” (2011), de onde escolheram por exemplo “Reach a Bit Further” (um dos momentos altos), e de onde falharam o tão esperado “Albatross”. Aliás, eram esses temas mais antigos aquilo que todos esperavam, mas não foi feita a nossa vontade. Optaram por promover o novo “Present Tense”, ou seja, queimaram meia hora com música que ninguém conhece, e ficou frio. Parece-nos uma opção pouco “festivaleira”, que nada ajuda a cativar os curiosos que ali estavam – deu para perceber – em maioria.
O primeiro single do novo álbum, “Wanderlust”, ficou para o fim. Vamos guardar esse momento de um espetáculo frouxo, de onde esperávamos mais.
Uma nota relativa ao som do palco Vodafone: à semelhança do que temos sentido nos outros dias, o vento – lateral – forte (e com ele o pó, diga-se de passagem) diminui muito a qualidade sonora, pois o volume tem de ser aumentado para que o som chegue ao fundo do recinto Vodafone (aliás, esse é o melhor sítio para se estar – acusticamente falando). Daqui resulta um volume sonoro quase insuportável junto ao palco, com especial incidência nas frequências mais graves. As vibrações sentem-se com demasiada intensidade em todo o corpo, chega a ser desconfortável. Mau para as bandas, para a experiência auditiva do público, e para o festival. Todos tivemos azar este ano.
Arcade Fire (23h55)
O coletivo canadiano atuou na passada quinta-feira no Primavera Sound em Barcelona, e hoje esperava-se a mudança de casa para Lisboa, para a quarta atuação no nosso país. E “mudar a casa” não foi uma expressão usada ao acaso: o aparato cénico que se esperava extraordinário acabou por se revelar espartano, mas não menos vistoso. Um palco complexo, com vários níveis, organizado para apresentar 12 (e às vezes 13) músicos, todo em branco para permitir a projeção de qualquer tom de cor. Os ornamentos visuais foram a luz e a imagem, com muitos videoclips projetados no fundo do palco.
Coletivo formado em torno do casal Win Butler e Régine Chassagne, ao vivo a banda de Montreal tem como mais valia musical a quantidade e diversidade de instrumentos em palco. É “música a sério”, dirão os mais puristas. Não concordamos em absoluto, mas a verdade é que o som de uma quase orquestra de instrumentos “de verdade” (quando bem tocados), provoca uma sensação especial. Mal comparado, é como a diferença entre ouvir música de um CD original e de um ficheiro MP3 mal gravado, a percepção é muito diferente. A força dinâmica dos instrumentos sente-se no som, nem precisamos de os ver tocar.
Estiveram pela primeira vez em Portugal em 2005, no festival Paredes de Coura, andavam na altura a promover o álbum de estreia, “Funeral” (2004). Foi um espetáculo musicalmente épico, ainda hoje muitos o recordam.
Esta noite em Lisboa arancaram com “Reflektor”, tema título do ainda último álbum (o 4º, de 2013) e a partir daí foi sempre a abrir. Passaram por todos os seus álbuns e sucessos, temas orelhudos que mantiveram toda a gente a dançar. Lá à frente, as letras estavam na ponta da língua. Nesta edição do Rock in Rio não assistimos a outro espetáculo onde se visse tanta gente aos saltos, e não era para menos. Como quando tocaram “Afterlife”, por exemplo. Ou quando anunciaram “No Cars Go“, como se fosse preciso.
“Mas eles não se cansam?”, ouvimos perguntar ao nosso lado. Não, nem estão com conversas para entreter o público. Pouco comunicativos, mas muito competentes tecnicamente, é pela música que aqui estão, para nos (bem) cansar. A dada altura, apenas um ligeiro abrandamento: “Esta música é sobre a saudade”, dizia Win Butler; e segue-se o tema “The Suburbs”. “Sometimes I can’t believe it / I’m movin’ past the feeling”. É esta a imagem que têm de nós?
Assistimos a um show de luz e som com uma energia que poucas bandas têm a capacidade de produzir a esta escala. Esperava-se um palco mais elaborado, mas não foi preciso. Foram poderosos, e quem aqui esteve esta noite (cerca de 40 mil pessoas), recebeu o que esperava. Não se pode pedir muito mais.
Benoit & Sergio (02h00)
Um dos aspetos mais interessantes da música de dança é o desprendimento com que geralmente nos deixamos levar por ela. Quando vamos a uma discoteca ou a um bar, quantas vezes estamos interessados em saber “que música é esta?”. A maioria de nós, muito poucas. E para os “casos raros”, temos o Shazam, que acerta o bastante.
Quando nos aproximámos do palco da eletrónica, tivemos curiosidade em saber algo muito simples: quantos dos que ali dançavam sabiam efetivamente quem eram aqueles dois que estavam a tocar (ou a “passar música”, aceitamos essa formulação). Perguntámos a 27 pessoas (vinte e sete), e apenas uma respondeu corretamente e sem hesitação.
Benoit & Sergio são uma dupla de Djs e produtores que se conheceram em Berlin. Já editaram alguns singles e EPs, dois deles pela norte-americana DFA, uma das editoras de dance music mais importantes do mundo. São também muito requisitados para remisturas (Friendly Fires e Matthew Dear, só para citar dois exemplos). As remix by B&S são, tantas vezes, mais interessantes que os originais.
Aqui no Rock in Rio, “meteram música” (é a nossa formulação preferida) em algumas centenas de cabeças, e a avaliar pela amostra, praticamente ninguém fazia ideia que tinham ali no palco duas das personalidades mais importantes da “eletro-pop” da atualidade, mas pouco importa. A música de dança, quando é partilhada desta maneira, não tem quem nem porquê, é para ser sentida com o corpo todo. E foi isso o que aconteceu esta noite na Bela Vista.
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A “tenda” eletrónica é, em todo o recinto, a que tem a melhor qualidade de som. É o mais equilibrado, em volume e definição. Beneficia da arquitetura e tamanho (mais reduzido) do espaço, e daquele chão que treme, sentimos nós.
04h00. À saída, já do lado de fora do recinto, cruzámo-nos com alguns miúdos “acampados” no meio da estrada. Bancos insufláveis, mantas e cobertores, pernoitam ali para garantir lugar na a primeira fila do espetáculo da Jessie J., amanhã (hoje).
“Temos aqui uma arma, matamos quem se quiser meter à nossa frente”, disse um deles. Achámos melhor continuar a andar.