O secretário de Estado da Administração Pública garantiu esta quarta-feira no Parlamento que a nova Tabela Remuneratória Única (TRU) para a função pública “não envolve uma diminuição” dos salários. No entanto, Leite Martins admite uma revisão de alguns grupos salariais uma vez que há algumas posições que estão abaixo dos salários praticados no privado. Quanto aos que são mais altos? “Não quer dizer que se baixe, pode ser ficar na mesma”.
A audição do secretário de Estado acontece dois dias antes do início das negociações com os sindicatos da função pública. Em resposta aos deputados, o governante deixou para mais tarde a discussão sobre o reposicionamento dos salários, ou seja, sobre a progressão nas carreiras. Dirigindo-se a Catarina Marcelino, do PS, Leite Martins, afirmou que “o Governo está a refletir sobre a possibilidade de retomar, de alguma forma, o mecanismo dos reposicionamentos – que tem estado suspenso. Será uma tema posterior”. Tal como a ministra das Finanças garantiu a semana passada quando apresentou a TRU, Leite Martins insistiu que a tabela “não envolve qualquer diminuição de remuneração: os funcionários são posicionados na posição exata em que se encontravam”.
Depois admitiu a “intenção de fazer alguma revisão da amplitude de posições remuneratórias consistentes com as praticadas no mercado”, ou seja, rever determinados patamares uma vez que “há zonas na tabela que têm posições muito inferiores às do mercado – outras nem tanto”, referiu.
Em causa estão sobretudo os quadros superiores. O governante insistiu na ideia de que é necessário ter uma “administração de qualidade”. “Não podemos ter quadros que exercem quadros de responsabilidade, senão temos uma administração desqualificada. Não há capacidade de atrair quadros”, explicou. E para esses quadros, há a intenção de rever a tabela, mas Leite Martins não se compromete: “O Governo não diz que vamos aumentar certas pessoas, mas vamos proceder a uma revisão”. Nos outros casos, “não quer dizer que se baixe, pode ser ficar na mesma”.
Governo não divulga parecer sobre 35 horas de trabalho praticadas nas câmaras
O secretário de Estado recusou divulgar o parecer da Procuradoria-Geral da República sobre os acordos celebrados entre as autarquias locais e os sindicatos representantes dos funcionários da administração local que reduzem o horário de trabalho para as 35 horas semanais. Leite Martins admite já ter recebido o parecer há quinze dias, mas recusou mostrá-lo aos deputados dizendo que o parecer “comporta a necessidade de uma interpretação”, uma vez que se trata de um “assunto de grande delicadeza”.
Em causa estão os acordos coletivos assinados entre algumas câmaras municipais e sindicatos representativos de funcionários da administração local, mas não assinados pelo representante do Ministério das Finanças. Para o Governo, estes acordos levantam dúvidas e por isso foi pedido o parecer. “A questão que está em causa é saber se o Ministério das Finanças é ou não parte desse acordo. Se o Ministério das Finanças fizer parte do acordo, falta uma parte assinar. É um dos pontos relativamente aos quais há dúvidas: não é uma entidade terceira não respeitar o que foi acordado pelas partes”.
A situação de haver acordos coletivos assinados entre câmaras e os representantes dos trabalhadores que alteram uma lei é um procedimento novo, diz o secretário de Estado. Na audição, Leite Martins recordou que “há vários ACEEP’s [acordos colectivos de entidade empregadora pública] assinados por outros secretários de Estado e até de governos anteriores”, o que não aconteceu desta vez relativamente à redução para 35 horas semanais. Por isso “há uma mudança em relação a procedimentos anteriores. Quem mudou os procedimentos, correu riscos”, acrescentou.
Na prática, em dezenas de autarquias, estão a ser praticadas as 35 horas de trabalho semanais – e não as 40 horas como na restante administração pública – por via destes acordos câmara a câmara. Para o governante, é necessário perceber se há “a possibilidade” da regra estabelecida pelo Governo “ser revogada”.
A questão está ainda a ser debatida na audição do secretário de Estado, com o líder da bancada parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, a dizer que o Governo quer “impedir na secretaria” a manutenção das 35 horas semanais.
Em resposta ao deputado bloquista, o secretário de Estado admitiu que “não é um problema de interpretação, é de decisão” uma vez que a PGR enuncia as regras “não de uma fórmula matemática” e o Governo vai “ler essa interpretação à luz da sua própria interpretação da Constituição e do quadro que está traçado”.
Em causa está o princípio da autonomia do poder local, ou seja, se as câmaras têm ou não autonomia para decidir o horário de trabalho. Leite Martins lembrou que a questão no que toca a este princípio é que “a autonomia do poder local é a escolha dentro da lei”, ou seja, o Governo não se pode imiscuir no trabalho das câmaras, mas “em relação à legalidade, sim”.