O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, considerou nesta quinta-feira que os bancos devem desempenhar um papel mais ativo sobre as empresas a quem concedem crédito, de forma a evitar que estas entrem em situações de incumprimento e falência.

“Sempre que uma empresa abre falência, é mais do que uma perda financeira, é uma parte da poupança de uma economia que desaparece ali naquele momento, e é um conjunto de empregos que desapareceram naquele momento”, realçou o responsável, na sua intervenção numa conferência internacional dedicada à regulação e supervisão do setor financeiro, que decorreu em Lisboa.

“Se nós [atores do sistema financeiro] nos pudessemos ter antecipado e imposto a correção que era necessária, não só estávamos a salvaguardar a parte financeira como, sobretudo, estávamos a salvaguardar os empregos correspondentes”, sublinhou.

Antes, Carlos Costa já tinha criticado a postura habitualmente adotada pelos bancos, que concedem financiamento às empresas com base nos seus modelos de gestão do risco, sem apostar numa intervenção mais ativa ao nível da sua gestão. O governador apontou mesmo para o exemplo dos fundos de ‘private equity’ [fundos de capital de risco], que financiam as empresas mas assumem uma palavra importante no que toca à sua gestão. “Ao contrário do que acontece com os ‘private equity’, os bancos ficam normalmente na retaguarda”, afirmou.

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Para alterar esta postura da banca tradicional, o governador disse que “o modelo de gestão do risco tem que ser profundamente alterado nos bancos”, abandonando a sua “atitude passiva”. E reforçou: “Não vale a pena pensar que a medida do capital em termos dos ativos ponderados pelo risco é segura. Esta é variável” e está dependente de fatores externos às instituições financeiras.

Daí, na sua opinião, é necessário que a supervisão assente num “tripé” constituído pelo rácio de capital, pelo rácio de capital ponderado pelo risco e pela realização frequente de testes de resistência, montados sobre cenários hipotéticos que podem ocorrer no futuro. “Estas são as minhas preocupações hoje. Como é que se consegue fazer com que o sistema financeiro faça o seu papel, assumindo simultaneamente um papel de ‘pipeline’ entre a poupança e o investimento, de ‘pipeline’ eficiente de transmissão [de recursos à economia], e de ‘pipeline’ que desperdiça o menos possível de capital”, destacou.

“No centro de tudo isto, há uma coisa que é fundamental: as pessoas que estão nos bancos, que gerem os bancos e os modelos de governo que têm, e as pessoas que estão na supervisão e os modelos de supervisão que têm”, frisou o governador. E concluiu: “Se alguma coisa falhou no passado foram as duas coisas. Foram os bancos e os modelos de governo e de assunção do risco, e foram os nossos modelos de supervisão que foram demasiado ‘backward looking’ [orientados pelo passado], em certa medida, estáticos e, em certa medida, complacentes”.

A conferência internacional “Tendências atuais e perspetivas de revolução da regulação e supervisão do setor financeiro – na UE [União Europeia] e em termos internacionais” foi organizada pela Cátedra Jean Monnet em Regulação Económica na UE, da Universidade de Lisboa, com o apoio do Banco de Portugal, do Instituto de Seguros de Portugal e da Associação CIRSF (Centro de Investigação em Regulação e Supervisão do Sector Financeiro).